Vitória da esquerda

Paz, justiça social e defesa ambiental: o tripé de ações do novo presidente da Colômbia

Em primeiro discurso após eleição, Gustavo Petro destacou vitória como “a somatória da resistência” do povo colombiano

Leonardo Wexell Severo/ComunicaSul
Leonardo Wexell Severo/ComunicaSul
álidos, Petro derrotou, com uma diferença de mais de 700 mil votos, o candidato da direita Rodolfo Hernández, que obteve 47,31%

São Paulo – Em seu primeiro discurso logo após a confirmação da vitória no segundo turno das eleições para o novo governo da Colômbia, nesse domingo (19), o presidente eleito Gustavo Petro, da coalizão Pacto Histórico, atribuiu o resultado que consagrou, pela primeira vez, a esquerda no poder no país como “parte de um acúmulo de resistência que já tem cinco séculos”. O presidente participou ontem, ao lado de sua vice, a advogada Francia Márquez, de uma comemoração popular na Arena Movistar, em Bogotá. No evento, Petro saudou os mais de 11 milhões eleitores como o “passado de luta, de rebeldia contra a injustiça, a discriminação, a desigualdade”. 

O ato foi acompanhado por uma multidão na capital do país que entoava “Si, se pudo!” – Sim, pudemos! Durante o evento, Petro e Francia agradeceram “a todos os colombianos e colombianas que deram a vida para que este momento acontecesse”. E lembraram, com pesar, dos assassinatos e desaparecimentos forçados de oposicionistas que lutavam por um projeto progressista para o país. 

“Quanta gente não nos acompanha hoje porque desapareceu nos caminhos do país? Dezenas de milhares que morreram. Quanta gente está presa atualmente? Jovens algemados, trancafiados, tratados como bandidos quando simplesmente traziam consigo a esperança de um país melhor”, destacou o presidente eleito que pediu à Procuradoria Geral da Colômbia que “libere” a juventude do país. Em paralelo, eleitores vociferavam palavras de ordem por “liberdade, liberdade, liberdade”.

Tripé do governo

Com 50,44% dos votos válidos, Petro derrotou, com uma diferença de mais de 700 mil votos, o candidato da direita Rodolfo Hernández, que obteve 47,31%. Ex-integrante do grupo guerrilheiro M-19, o novo presidente da Colômbia é economista, especialista em Meio Ambiente, e já foi prefeito de Bogotá e senador. Essa foi a terceira eleição presidencial de Petro que, em 2018, chegou ao segundo turno na disputa contra Iván Duque, eleito à época. 

O novo governo da Colômbia assume no próximo dia 7 de agosto com o compromisso de fazer um “governo pela vida”. À multidão de eleitores nesse domingo, Petro declarou que “quer construir uma Colômbia como uma potência mundial da vida”. Para isso, segundo ele, seu governo terá como tripé a paz, a justiça social e a justiça ambiental. O objetivo é assegurar os Acordos de Paz firmados com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farcs). Assim como garantir um novo modelo econômico para o país, menos extrativista e baseado na reforma agrária. 

Em seu discurso, o presidente eleito enfatizou que os temas ambientais serão também pautados nas relações internacionais com os demais países latino-americanos e com os Estados Unidos. O discurso de vitória foi bem avaliado pelo professor doutor do Departamento de Ciência Política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), André Káysel. Em entrevista a Marilu Cabañas, do Jornal Brasil Atual, o especialista destacou que Petro “coloca o dedo na ferida” ao dar ênfase à reforma agrária

Negociação com o Congresso

“A questão da terra na Colômbia é, como toda a América Latina, secular, desde o período colonial. Ela foi um dos motores do longo conflito armado (no país) desde os anos 1950. Até hoje há expulsão de camponeses de suas terras pelo latifúndio e mais recentemente pela mineração, com uso do paramilitarismo para isso. É o país que mais mata camponeses e líderes sociais e sindicais, e é um dos pontos pendentes dos Acordos de Paz firmados com as Farcs”, observa Káysel. 

Durante sua fala nesse domingo, Petro também reforçou a promessa de que alterará a estrutura tributária, implementando a taxação de grandes fortunas. A justiça tributária passou à margem mesmo durante o chamado ciclo progressista da América Latina, no início do século, mas vem sendo adotada recentemente por países como Argentina e Bolívia. 

O cientista político diz que as mudanças pretendidas por Petro irão demandar negociações do novo governo da Colômbia com o Congresso. Embora nas eleições legislativas, realizadas em março, o Pacto Histórico tenha conseguido eleger a maior bancada, em ambas as câmaras predominam grupos de direita. Ainda assim, há espaço para garantir acordos, conclui Káysel. “Ele (Petro) terá de negociar com um congresso em que ele não tem maioria, isso é um problema para todas essas pautas, na verdade. Mas ele tem bastante legitimidade e apoio popular no momento para, no começo do governo, tentar negociar essa pauta que é muito importante para implementar os programas sociais e ambientais e corrigir iniquidades históricas”. 

Redação: Clara Assunção

Com informações da Opera Mundi e da ComunicaSul