CRISE EUROPEIA

Conflito entre Rússia e Ucrânia envolve questões econômicas, além de interferência da Otan, observa especialista

Professor Williams Gonçalves diz que ações planejadas pelos Estados Unidos envolvem construção de gasoduto que liga Rússia com a Alemanha

The Presidential Press
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Parlamento da Rússia concedeu, ontem, ao presidente Vladimir Putin a permissão para enviar forças militares para cumprir "missões de paz” em Donetsk e Lugansk, as duas "repúblicas” separatistas no leste da Ucrânia

São Paulo – O conflito entre Rússia e Ucrânia possui diferentes motivações, que envolvem razões econômicas, interferência externa da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e preservação da soberania nacional. De acordo com o professor de Relações Internacionais da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) Williams Gonçalves, a resistência russa para não deixar o país vizinho entrar no grupo militar é apenas um dos pontos do problema.

Questionado sobre a resistência dos Estados Unidos em concordar com a não inclusão da Ucrânia na Otan, o especialista em Relações Internacionais explica que a pressão norte-americana possui interesses econômicos. Um dos pontos de interesse é o gasoduto Nord Stream 2 no Mar Báltico, planejado para transportar gás russo para Europa, contornando países como Polônia e Ucrânia e que já está pronto.

“A integração da Ucrânia na Otan é a questão mais visível, mas há outras por trás. Pegamos a Alemanha como exemplo que, nesse imbróglio, suspendeu a compra de gás russo. Seria construído um gasoduto que ligaria diretamente Alemanha e Rússia, que passaria pela Ucrânia, e os Estados Unidos também não querem isso. Essa é uma questão central, porque 50% da energia usada pela Europa vem da Rússia. Então, há uma pressão econômica para não atuar contra a Rússia, mas também dos Estados Unidos, que tem bases militares no país alemão”, afirmou Gonçalves, em entrevista ao jornalista Rodrigo Gomes, da Rádio Brasil Atual.

O chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, anunciou, ontem (22), que suspendeu o processo de licenciamento do gasoduto. O anúncio foi uma resposta ao reconhecimento formal pela Rússia, na segunda-feira (21), da independência de duas regiões no leste da Ucrânia, controladas por separatistas pró-Moscou e à ordem de envio de tropas russas para a região. A interrupção do projeto como sanção à Rússia era um pedido de países como Estados Unidos.

Conflito armado?

O parlamento da Rússia concedeu, ontem, ao presidente Vladimir Putin a permissão para enviar forças militares para cumprir “missões de paz” em Donetsk e Lugansk, as duas “repúblicas” separatistas no leste da Ucrânia. Por outro lado, as Forças Armadas da Ucrânia divulgaram, nesta quarta-feira (23), uma ordem para mobilizar os reservistas, num movimento de preparo para combater uma invasão por Moscou. Kiev também pediu que seus cidadãos deixem a Rússia imediatamente.

Para o professor, o conflito entre os dois países não é inevitável e chama as ações russas de “jogo de xadrez”. “O presidente Putin age estrategicamente. A pressão que há é da Otan, que esteve por trás da queda do governo da Ucrânia, em 2014, colocando uma liderança pró-Ocidente. Agora, eles querem que o país integre sua estrutura. O Putin faz o que qualquer chefe de Estado faria para zelar a segurança do país. Nesse jogo de xadrez, ele fez um movimento importante e, se houver um conflito, terá de ser iniciado pela Otan”, explicou.

Ainda ontem, os Estados-membros da União Europeia (UE) aprovaram por unanimidade a imposição de sanções contra a Rússia. A proposta, elaborada inicialmente pela Comissão Europeia, não se limita a proibições de trânsito e congelamento de bens, mas prevê também à proibição da negociação de títulos do governo da Rússia, o que dificulta o refinanciamento do Estado russo.

Apesar das sanções econômicas, Williams Gonçalves diz que a Rússia não terá problemas, apesar de alguma repercussão em sua economia. “Nesse complexo jogo geopolítico, os Estados Unidos querem manter unida a aliança militar da Otan. Já a Rússia joga com a quebra da unidade europeia e afastando países dos norteamericanos. Já economicamente falando, a China, que é a maior economia do mundo hoje, está ao lado da Rússia. Então, não haverá consequências graves a partir dessas sanções”, acrescentou.

Confira a entrevista