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PM libera portões da escola Fernão Dias e alunos realizam saraus em ocupação

Entrada de pessoas no prédio está sendo controlada pelos próprios estudantes. A prioridade é para quem já estava na ocupação e para os alunos do Fernão Dias, que são maioria no local

Paulo Pinto/ Agência PT

Já são 30 escolas ocupadas por estudantes no estado, segundo Apeoesp

São Paulo – Após a Justiça paulista suspender a reintegração de posse nos colégios ocupados por estudantes na capital paulista, na noite de sexta-feira (13), a Polícia Militar reduziu o efetivo em frente à Escola Estadual Fernão Dias Paes, em Pinheiros, na zona oeste da capital, desfez o cordão de isolamento que sitiava o prédio desde terça-feira (10) e liberou os portões. Desde então, os alunos estão promovendo saraus, rodas de poesias, debates e assembleias com secundaristas, militantes de movimentos sociais e apoiadores da causa.

A entrada de pessoas no prédio está sendo controlada pelos próprios estudantes. A prioridade é para quem já estava na ocupação e para os estudantes do Fernão Dias, que são maioria no local, segundo um dos alunos que ocupa o prédio e que não quis se identificar. Ele informou que os alunos estão no pátio interno da escola realizando atividades culturais e reuniões para definir os próximos passos do movimento.

Ele reafirmou que a ideia é permanecer no local até que o governador Geraldo Alckmin (PSDB), reveja a fechamento de pelo menos 93 escolas, como parte do seu plano de “reorganização” do ensino estadual paulista. “Queremos sim um projeto de reorganização, mas não um que nos seja imposto como este. Queremos que ele seja elaborado junto com os estudantes, professores e pais e que de fato melhore a qualidade da educação”, defendeu.

Na última sexta, por volta das 15h, três estudantes saíram da ocupação para participar de uma audiência de conciliação com o governo estadual. Sem acordo, ficou determinado que os alunos teriam até as 17h18 do sábado (14) para deixar o prédio. Na noite do mesmo dia, porém, o juiz Luis Felipe Ferrari Bedendi, da 5ª Vara da Fazenda Pública, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, acatou um recurso impetrado pelos advogados do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado (Apeoesp), da Defensoria Pública e do Ministério Público, e derrubou decisão.

Já são 30 escolas ocupadas por estudantes no estado, segundo o último levantamento da Apeoesp, divulgado na tarde hoje (16). Elas se concentram nos municípios de São Paulo, Osasco, Campinas, Santo André, Embu das Artes, Franca e Diadema. Em Piracicaba, o governo Alckmin recuou diante da mobilização de alunos, pais e professores e não vai mais fechar a Escola Estadual Augusto Mélega, situada no bairro Campestre, área rural do município.

Desde o início da ocupação, moradores de diversos bairros da capital paulista foram à escola Fernão Dias Paes para apoiar o movimento. “É muito descabido fechar escolas em um momento que se clama por mais educação. Os alunos das escolas nos estão dando uma lição”, disse a professora Cleusa Garcia, que mora no Butantã, na zona oeste da capital. “Estar presente neste movimento é o mínimo que posso fazer como cidadão. Os jovens estão tentando pressionar o governo por uma causa legítima”, concordou o músico André Bordinhan, do Jaguaré, também na zona oeste.

“Ver uma escola cercada pela polícia é de fazer inveja ao Estado fascista e nazista. Nós temos um ensino bancário que perpetua as desigualdades, mas esses jovens estão lutando pelo direito de poder conviver e de ir contra este modelo. Esta foi a aula mais importante que eles tiveram no ano, a aula de desobedecer, de enfrentar o poder, de questionar e de descobrir a força que têm”, disse o padre Júlio Lancellotti, conhecido pela atuação em defesa dos pobres e moradores de rua, que esteve na ocupação na sexta-feira, em solidariedade aos estudantes.

O governo Alckmin justificou o fechamento das escolas dizendo que vai reunir apenas alunos do mesmo ciclo – fundamental I e II e médio – nas escolas e com isso melhorar a qualidade do ensino. Professores e estudantes temem que as mudanças levem à superlotação de salas, demissão de docentes e à redução de salário decorrente da redução de jornada. Além disso, a Apeoesp acredita que o número de escolas a serem fechadas será muito maior.

Apesar dessa crise de superlotação no início do ano, o secretário da Educação, Herman Voorwald, afirmou ao telejornal Bom Dia São Paulo, em 22 de setembro, que São Paulo tem 2 milhões de vagas ociosas. “O momento é absolutamente apropriado para isso porque houve redução de dois milhões de alunos na rede, a estrutura física que foi preparada há mais de 20 anos para receber 6 milhões de alunos em um processo de universalização, hoje, por conta da queda na taxa de natalidade, viabiliza que eu tenha escolas ociosas. A rede foi desenvolvida para absorver até 6 milhões de alunos, hoje tem 4 milhões.”

Ângela Meyer, presidenta da Upes, defendeu em entrevista à RBA que essa “janela demográfica” seja usada para reduzir o número de estudantes por sala de aula, uma reivindicação histórica do movimento estudantil. “Nos últimos dez anos, a rede pública diminui quase 2 milhões de estudantes. Uma parte evadiu, mas pelo menos 600 mil ingressaram em escolas particulares. A rede privada de ensino aumentou 36%, um dado muito preocupante, que evidencia um projeto de privatizar a educação.”

Professores ligados à Apeoesp concordam e reivindicam que a estrutura das escolas seja otimizada para que as salas de aula tenham no máximo 20 alunos, em qualquer dos ciclos. Os docentes reclamam ainda que a chamada reorganização da educação foi anunciada sem nenhuma discussão prévia com a comunidade escolar e com entidades ligadas à educação. O governo Alckmin já havia adotado a mesma postura com o Plano Estadual da Educação, elaborado pelo governo e apresentado pelo à Assembleia Legislativa por Alckmin sem participação popular.

São Paulo tem hoje 5.108 escolas, das quais 1.443 são de ciclo único. Outras 3.186 mantêm dois ciclos e 479 escolas têm três ciclos. Essas últimas devem ser transformadas em escolas de ciclo único, assim como grande parte das de dois ciclos. Só neste ano, pelo menos 3.390 salas de aula foram fechadas no estado. Muitas escolas iniciaram o ano letivo com até 60 estudantes por classe, em turmas do ensino regular, e até cem estudantes por classe em turmas da Educação de Jovens e Adultos (EJA), segundo a Apeoesp.

No último dia 15, depois de uma série de mobilizações estudantis, o Ministério Público Estadual e a Defensoria Pública de São Paulo cobraram explicações do governo sobre o projeto da suposta “reorganização” do ensino. Os processos estão em andamento.