Combate à desigualdade

Periferia de São Paulo precisa de políticas específicas de educação, defende estudo

Programas universais, comuns na área, não são suficientes para dar conta da desigualdade entre a periferia e o centro da cidade, mostra estudo da ONG Ação Educativa

Carol Guedes/Folhapress

Publicação ressalta importância de maior articulação entre município, estado e União para combater as desigualdades

São Paulo – Estudo da ONG Ação Educativa entregue ao secretário municipal de Educação, Cesar Callegari, propõe estímulos para professores se deslocarem para regiões mais pobres da cidade de São Paulo e sugere turmas menores nas escolas onde há falta de infraestrutura e evasão de alunos. Intitulado “Em questão: educação e desigualdades na cidade de São Paulo”, o documento mostra a necessidade de ações específicas para as periferias como recurso de combate às desigualdades de acesso, permanência e qualidade no sistema educacional.

“Apesar de a Constituição garantir o direito universal à educação básica, persiste uma forte correlação entre a origem social dos alunos e o meio em que estão inseridos e o desempenho destes durante o processo de escolarização, seja em termos de aprendizado (conhecimentos), seja em termos de realização escolar (anos de escolaridade completados com sucesso)”, destaca o estudo.

O número de anos de estudo diminui progressivamente conforme a análise se afasta do centro expandido do município. É nas periferias das cidades que está a maioria dos analfabetos, por exemplo. Enquanto em distritos mais ricos, como Alto de Pinheiros, Consolação, Jardim Paulista, Moema, a taxa de analfabetismo é inferior a 1%, nos mais pobres, como Iguatemi, Jardim Ângela, Marsilac e Parelheiros, chega a ultrapassar os 5%.

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O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) é menor nas regiões mais pobres, com menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), como Jardim Ângela, Jardim Helena, Brasilândia, Capão Redondo, Parelheiros e Pedreira. Já os distritos com maior IDH também concentram os maiores Idebs, entre eles Itaim Bibi, Lapa, Pinheiros, Saúde e Moema. O Ideb é um indicador que varia de 0 a 10. Em 2009, a média da rede municipal ficou em 4,7 na 4ª série e 4,2 na 8ª série, passando para 4,8 e 4,3 em 2011, respectivamente. Na rede estadual, as notas de 2009 foram 5,2 e 4,0 para a 4ª e 8ª série, e em 2011, 5,3 e 4,1.

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A situação se repete na taxa de atendimento do ensino médio. Se ela já é baixa de maneira geral no município (quase 30% dos jovens entre 15 e 17 anos não estão matriculados nessa etapa do ensino), o atendimento é menor em regiões mais pobres. As regiões mais ricas, como Santo Amaro, Tatuapé, Lapa, Vila Mariana, Tucuruvi, Pinheiros e Consolação concentram o atendimento, com taxas próximas ou acima de 100%. Por outro lado, distritos mais pobres possuem menos matrículas, como Tremembé (32%), Vila Andrade (42,3%), Lajeado (48,6%), Cidade Ademar (51%) e Madaqui (56,4%).

“É preciso reconhecer que há uma profunda desigualdade no território e que é necessária uma política de compensação para as regiões historicamente excluídas”, avalia uma das autoras da pesquisa Denise Carreira. “Trata-se de uma nova forma de conceber as políticas educacionais, que, em geral, visam a ações para todos. Precisamos de ações específicas para combater as desigualdades.”

Soluções

O estudo considera que a construção de políticas de educação na cidade de São Paulo deve levar em conta a distribuição desigual de equipamentos públicos de educação e cultura, concentrados principalmente no centro expandido. Soma-se a isso a dificuldade de circulação, que aumenta o tempo de transporte do centro à periferia e reduz as possibilidades de os moradores dessas regiões usufruírem de espaços públicos de lazer e cultura.

Tendo em vista os desafios, a ONG propõe que o financiamento da educação no município se dê por meio do Custo Aluno Qualidade (Caqi), que fixa um mínimo necessário a ser investido por alunos para garantir qualidade na educação. O mecanismo permitiria, por exemplo, que o poder público investisse um valor maior nos alunos que moram e estudam nas regiões mais pobres. Além disso, o estudo propõe políticas de incentivo na carreira docente para atrair os melhores professores para as periferias e a reduzir o número de alunos por turma nessas regiões.

A publicação ressalta ainda que é importante uma maior articulação entre as políticas educacionais do município, do estado e do governo federal, a elaboração de planos de educação regionais com metas específicas para os distritos da cidade e a real efetivação da rede de proteção dos direitos da criança e do adolescente. Outra medida positiva destacada na publicação seria a criação de um centro municipal de pesquisas e monitoramento da educação, aos moldes do Instituto Nacional de Pesquisas Anísio Teixeira (Inep).

O estudo ressalta que a desigualdade regional vem de um “histórico no país de violação do direito à educação” e que é urgente assumir na educação a “perspectiva do direito à cidade” e como “um direito humano em interdependência com outros direitos humanos”, como saúde, moradia, alimentação e meio ambiente.