São Paulo

Secundaristas desocupam Assembleia: ‘Semana que vem estaremos aqui’

Abraçados e segurando rosas brancas, estudantes saem pela porta da frente. 'Apenas começamos.' Tucano Capez diz ter interesse em apuração da máfia da merenda, mas bancada do PSDB não assina CPI

ubes divulgação

Estudantes desmontam ocupação da Assembleia Legislativa paulista: luta por condições dignas de ensino e de alimentação

São Paulo – Estudantes secundaristas, que desde a terça-feira (3) ocupavam o plenário da Assembleia Legislativa de São Paulo como forma de pressionar os deputados estaduais a instaurar uma CPI que investigue os desvios de recursos públicos destinados à merenda escolar, desfizeram a mobilização às 16h de hoje (6), cumprindo pacificamente a determinação judicial expedida ontem, que dava aos ocupantes 24h para deixar o local, sob pena de multa de R$ 30 mil por dia, por ocupante. “Nós apenas começamos”, afirmaram antes de deixarem o local.

A pressão para que o legislativo estadual faça seu papel de apurar as denúncias de desvios na verba da merenda continua, conforme anunciado pelos secundaristas durante a desocupação. “Na próxima semana estaremos aqui novamente cobrando para que cada deputado ouça a nossa voz de estudantes que há meses estamos sem merenda. Seguiremos em luta intensa pela abertura da CPI, pela punição dos ladrões da merenda e pela escola dos nossos sonhos”, anunciaram.

O grupo de cerca de 50 jovens deixou a Assembleia pela porta da frente, depois de alguns deles terem dado à imprensa declarações em forma de jogral, em clima de muita emoção. Os jovens saíram do plenário abraçados, chorando e segurando rosas brancas. Na rampa principal da Assembleia, foram recebidos em festa por outros secundaristas, que desde ontem faziam vigília no local. “Não recuamos, não desistimos e nada nos fará calar”, prometeram.

Os secundaristas avaliam que “tomaram um golpe da Justiça”. “Nós que não conseguimos nem comprar o lanche, não aceitaremos que nossos pais paguem pela corrupção. Há meses travamos uma luta democrática contra o ladrão da merenda. Sabemos o valor que tem a nossa democracia e a importância de se respeitá-la.”

“A Assembleia Legislativa de Alagoas foi ocupada ontem por estudantes. A Secretaria de Educação do Rio de Janeiro também. Isso só demonstra o quanto os secundaristas estão dispostos a lutar por uma escola melhor”, disse a presidenta da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), Camila Lanes. “Queria deixar claro o quanto essa mobilização foi uma lição de moral e cidadania para todos os parlamentares, porque o que estamos reivindicando não é muito: são assinaturas para conseguir da CPI da Merenda.”

Para que a Comissão seja aprovada são necessárias 32 assinaturas. Até o momento, os estudantes já tem 25, contanto com as bancadas do PT, Psol, PCdoB e PDT, além de membros do PPS e do PV. Como a CPI será a sexta tramitando na Casa e como o regulamento autoriza a existência de apenas cinco simultâneas, a aprovação dependera do presidente da Assembleia, Fernando Capez (PSDB), citado como um dos principais envolvidos no escândalo.

Logo após a desocupação, Capez afirmou, em coletiva de imprensa, que pautará a CPI caso ela consiga os votos necessários e disse estar interessado na investigação. Questionado sobre porque os deputados tucanos não assinam a CPI apesar dele e do governador Geraldo Alckmin (PSDB) já terem se declaro a favor, ele se limitou a dizer que “vai continuar conversando”, seguindo uma promessa feita também aos secundaristas. O presidente da Casa se comprometeu também a realizar uma audiência pública para debater a questão da merenda e a situação da educação pública em São Paulo e a manter um canal de diálogo aberto com os estudantes.

Também em coletiva, a oposição parabenizou a ação dos estudantes. “Eles fortaleceram nossa luta em apoio a instalação da CPI. Não vamos abrir mão, porque é papel da Assembleia investigar também”, informou líder da bancada petista, deputado José Zico Prado. “Eles saíram daqui vitorioso e deram uma lição de democracia.”

“Nós do PSol decidimos que, em respeito aos estudantes, vamos obstruir todas as votações da Casa até que seja aberta a CPI. Existem crianças nas escolas com fome, porque não há merenda”, anunciou o deputado Carlos Giannazi.

Escândalo da merenda 

De acordo com o MP, a Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (Coaf) – que mantinha contratos com diversas prefeituras e com o governo estadual – liderava um esquema de pagamento de propina. A empresa também é investigada por fraudar a
chamada pública que pressupõe a aquisição de produtos de pequenos produtores agrícolas. A cooperativa, por sua vez, adquiria mercadorias também de grandes produtores e na central de abastecimento do estado, segundo o Ministério Público.

O esquema de fraude nas licitações da merenda no governo Geraldo Alckmin (PSDB) pode ter desviado pelo menos R$ 7 milhões em contratos com o poder público e R$ 2 milhões em comissões em propinas, que eram entregues a lobistas e servidores públicos quase sempre em dinheiro, de acordo com levantamento prévio do Ministério Público, divulgado em 31 de março.