Falta de investimentos no setor causou crises de 1999 a 2002

Esperando por privatizações, FHC abandonou expansão de redes de geração e distribuição. Nos últimos 7 anos, governo destinou 30% do que o setor recebeu em 123 anos, diz Lula

Quinta-feira, 11 de março de 1999, por volta das 22h15, uma queda de energia elétrica inédita no país afeta 70% do território brasileiro e parte do Paraguai.

Começou em uma subestação da Cesp (Bauru, SP). Durou de 10 minutos (SC) a 45 minutos (RJ) na maioria dos estados. Em São Paulo, a normalização aconteceu por voltas das 3h40 da manhã.

Na ocasião, a explicação oficial das autoridades foi de que o blecaute teria sido provocado por um raio que atingiu a subestação de Bauru. Alguns anos mais tarde, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), divulgou estudos realizados com software capaz de detectar desligamentos na rede provocados por descargas atmosféricas, e demonstrou ser zero a possibilidade de um raio ter atingido qualquer linha de transmissão da região Sudeste naquele dia e horário.

 

O programa nacional de privatizações do governo Fernando Henrique Cardoso abandonou estrategicamente todas as áreas que pretendia transferir para o controle privado. A expectativa era de que os futuros controladores fizessem os investimentos necessários para o atendimento das demandas do país. Assim, depois do blecaute de 1999 do setor elétrico, o Ministério de Minas e Energia acabou admitindo ter havido redução dos níveis de segurança e manutenção da subestação de Bauru. Na realidade, como em todo o sistema, pois os investimentos em geração e distribuição de energia não acompanharam as necessidades do país.

No telejornal Bom Dia Brasil da Rede Globo, desta quarta-feira (11), o presidente da Associação dos Operadores do Estado de São Paulo, Washington Santos, afirmou que o sistema em sua boa parte é antigo. “Não foram feitos investimentos à altura para ter equipamentos adequados e atualizados. É a precarização do próprio sistema”, apontou Santos, para quem, depois da privatização, diminuiu o número de trabalhadores; e o elevado nível de automatização das subestações pode tornar o sistema mais vulnerável.

Abandono

Dois anos depois do blecaute – e depois de uma década inteira sem por dinheiro na ampliação de redes de geração e distribuição – , o governo brasileiro foi obrigado a reconhecer na prática o déficit de energia no país. Os dois últimos anos da gestão FHC, 2001 e 2002, foram marcados por políticas de racionamento para evitar uma nova sucessão de blecautes – então apelidados de apagões. A situação foi agravada por um longo período de escassez de chuvas que derrubou o nível dos reservatórios dos quais depende a matriz hidrelétrica do país.

Outra reação imediatista do governo FHC, a pretexto de dispor de um plano B em caso de futuros apagões por baixo nível dos reservatórios, foi começar um programa de investimentos em usinas termoelétricas, movidas não a água, mas a gás, carvão e óleo combustível – ou seja, na contramão das alternativas de energia mais limpa, barata e sustentável buscadas pelo planeta.

Para especialistas do setor, a política energética desse período, e suas consequências, podem ser consideradas um escândalo, por conta dos prejuízos causados à economia do país e às condições de vida das pessoas.

Segundo um relatório concluído recentemente pelo Tribunal de Contas da União, os prejuízos provocados pelo escândalo do apagão em 2001 correspondem à soma de R$ 45,2 bilhões. O estudo, conduzido pelo ministro Walter Alencar Rodrigues, foi aprovado por unanimidade no TCU, inclusive como voto de integrante de primeiro escalão do governo FHC que atuava no setor no auge da crise. O dinheiro daria para bancar a construção de seis hidrelétricas de conceito mais moderno, com ocupação de áreas menores de alagamento.

Itaipu

A energia produzida na hidrelétrica de Itaipu é distribuída por Furnas para 19% do Brasil. A paralisação total da noite desta terça (10) foi a primeira da história da usina. Em nota oficial, o Ministério da Minas e Energia informou ter ocorrido uma “perturbação de grande porte no Sistema Interligado Nacional (SIN)”, que provocou uma interrupção parcial equivalente e 28.800 megawatts, o corte das três linhas e do elo de corrente contínua associados à Usina de Itaipu, tendo como consequência o desligamento de todas as suas unidades geradoras, “por ação dos sistemas de proteção”.

O governo confirmou que o blecaute atingiu 18 estados. O ministro Édison Lobão, rechaçou qualquer semelhança com o apagão de 2001, quando havia problemas de incapacidade de atendimento das demandas.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ratificou: “Não tivemos falta de geração de energia. Tivemos um problema na linha de transmissão”, afirmou. Questionado por jornalistas, Lula lembrou que em 2001 o país não produzia energia suficiente e não havia interligação do sistema. E assegurou que nos últimos sete anos o governo federal investiu em linhas de transmissão “o equivalente a 30% de tudo que foi feito em 123 anos”.