São Paulo

Trabalhadores dependem de boa vontade das empresas para obter Bilhete Único Mensal

Secretário de Transportes da capital paulista diz que vai procurar empresários para estimular adesão, mas não tem incentivos na manga. Custo alto pode explicar baixa adesão, de 165 mil até agora

Fábio Arantes/SECOM

No lançamento do bilhete mensal integrado, governos estadual e municipal destacaram o ‘acesso à cidade’

São Paulo – Trabalhadores que recebem vale-transporte vão depender da boa vontade de seus empregadores para acessar os benefícios do Bilhete Único Mensal. O novo cartão custa mais caro para a empresa do que a fórmula convencional, o que ajuda a explicar a baixa adesão ao serviço – 165 mil cadastrados, contra 4,2 milhões no Bilhete Único Comum, e apenas 15 mil cartões retirados.

No caso do cartão simples, a empresa gasta R$ 132 para 22 dias. E passaria a R$ 140. No integrado, com metrô, ônibus e trem, iria de R$ R$ 204,60 para R$ 230,00, um aumento de R$ 25,40. E como a prefeitura não tem nenhum plano de incentivo para adesão corporativa, é pouco provável que a consciência cidadã venha à frente do aumento de custos na lista de prioridades.

“Estamos avaliando a possibilidade de conversas com sindicatos de trabalhadores e patronais, mas não há nada definido”, disse ontem o secretário Municipal de Transportes, Jilmar Tatto, na saída do Debate de Olho no Futuro, organizado pelo Instituto de Engenharia, na Vila Mariana, zona sul da capital. Para ele, a decisão da adesão ao modelo depende dos usuários. “As pessoas precisam fazer contas, avaliar quanto gastam por mês com passagens e decidir se vale a pena.”

Por iniciativa individual, é possível que quem recebe vale-transporte não se empolgue em aderir ao novo cartão. Do trabalhador já é descontado, por lei, até 6% do salário. Para receber o benefício seria preciso desembolsar mais R$ 140, pelo bilhete simples, ou R$ 230, pelo integrado, somente para alguns usos a mais, no fim de semana, principalmente.

Considerando que 65% dos cadastrados recebe até R$ 1.147, o empenhado no uso do Bilhete Mensal corresponde a 12% da renda para utilizar o cartão sem integração e 20% com integração.

O estudantes foram os mais beneficiados pela nova política. A vantagem é que o bilhete mensal para eles custa R$ 70. Ou R$ 140, se for integrado. Uma cota completa para um mês de crédito convencional para estudantes sai por R$ 72. A integrada, por R$ 144. E contempla somente 44 passagens. Não é à toa que eles são os que mais procuram o novo cartão. Do total de cadastrados, 96 mil são estudantes – quase 60%.

Hoje a cidade conta com 4,2 milhões de usuários cadastrados no Bilhete Único Comum, dois milhões no vale-transporte e um milhão no escolar, segundo a São Paulo Transportes (SPTrans) – pode haver usuários cadastrados em mais de um tipo de serviço.

Dos que adotaram o sistema mensal até ontem (3), 38,3% dos usuários estudam e trabalham, 29,4% só estudam, 29,5% só trabalham e 2,8% utilizarão o cartão para outros fins.

Os dois milhões de usuários de vale-transporte vão continuar dependendo, por hora, da boa vontade de seus patrões para acessar o novo cartão e ter “um passaporte para a cidade”, como afirmou o prefeito Fernando Haddad (PT), no lançamento do bilhete integrado, no último dia 21. Isso porque não há perspectiva de diálogo entre a prefeitura e o empresariado no sentido de algum incentivo para adesão ao cartão mensal.

O Movimento Passe Livre (MPL) já havia questionado a eficiência da política em um artigo publico em abril deste ano, em sua página na internet. “O Bilhete Único Mensal torna-se mais um bônus para aqueles que já utilizam muito o transporte público do que uma política de inclusão daqueles já excluídos diariamente do transporte. (…) A ampliação do deslocamento para além da jornada de trabalho (que o programa pretende realizar) se mostra, assim, restrita somente aos trabalhadores formais, a uma certa faixa de renda. Isso se os empregadores adotarem o cartão mensal, uma vez que seu valor será, em muitos casos, superior ao gasto com transporte nos dias trabalhados.”

Além disso, comparado a outros modelos de integração mensal, o bilhete paulistano oferece um desconto bem inferior em relação ao bilhete diário. No Metrô de Roma, na Itália, a realização de duas viagens diárias por 31 dias, com bilhete comum, custaria 93 euros. Com o bilhete mensal, custa 35 Euros, 37% do valor unitário.

No Metrô de Nova York o desconto é um pouco menor que o Metrô romano. A viagem com bilhetes unitários por um mês custaria US$ 155. No cartão mensal integrado, US$ 112. Uma redução de US$ 43, ou 23%.

O uso de um cartão integrado em São Paulo, por 31 dias, custaria R$ 279. Com o mensal, R$ 230. Uma redução de R$ 49, ou quase 15%.

Sem a integração, em um mês inteiro de viagens o usuário gastaria R$ 186. Com o bilhete mensal, R$ 140. Uma redução de R$ 46, ou aproximadamente 25%.

Roma e Nova York ainda possuem outros tipos de integração, como semanal e de 24 horas. São Paulo anunciou a criação do bilhete semanal, mas ainda não tem previsão de quando o sistema entrará em funcionamento.

No lançamento da parceria entre os governos municipal e estadual, Tatto afirmou que o bilhete mensal tinha um universo de 860 mil usuários potenciais, que gastam mais do que a cota para o mês de vale transporte ou crédito de estudante. No entanto, se esse gasto a mais for somente uma saída de sábado, nos quatro fins de semana do mês, o gasto seria de R$ 37,20, considerando a integração ônibus-Metrô. Muito inferior aos R$ 230 necessários para o bilhete mensal.

O bilhete mensal começou a funcionar em 30 de novembro, em todo sistema de ônibus, trens e Metrô da capital paulista. O cadastramento continua disponível no site da SPTrans e não tem prazo para acabar.