Em São Paulo

Pesquisa indica que manifestantes do dia 12 ganham bem e creem em mentiras

Estudo de professor da USP com público que esteve na Avenida Paulista mostra que maioria confia em colunistas e políticos conservadores e acredita em boatos espalhados pelas redes

Marcia Minillo / RBA

Desinformação política, econômica e social alimentam preconceitos e crença em boatos e resultam de distorções difundidas pela mídia tradicional

São Paulo – A manifestação pelo impeachment da presidenta da República, Dilma Rousseff, no último domingo (12), na avenida Paulista, reuniu em sua maioria pessoas brancas, com ensino superior completo, que ganham acima de cinco salários mínimos. E que acreditam em boatos espalhados pelas redes sociais, como o de que Fabio Luis Lula da Silva, o Lulinha, filho do ex-presidente Lula, é sócio da empresa frigorífica Friboi. Nada menos que 71,3% dos manifestantes entrevistados acreditam nessa estória.

Os dados são de uma pesquisa coordenada pelo professor do curso de Gestão de Políticas Públicas da USP, Pablo Ortellado, e pela professora de relações internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Esther Solano, que ouviu 541 pessoas.

A pesquisa identificou que 47,3% dos entrevistados “confiam muito” em informações obtidas pelo Facebook. Outros 26,6% têm a mesma percepção de informações repassadas pelo aplicativo de celular Whatsapp. Dos participantes do ato, 77,4% eram brancos, 68,5%, tinham ensino superior completo e 72,8% tinham renda superior a R$ 3.940 mensais, sendo que 48% ganham acima de R$ 7.780 por mês.

O professor se disse surpreso com a crença nas informações do aplicativo de celular, que é relativamente recente. “Nas redes entra tudo. Uma boa parte do conteúdo compartilhado no Facebook é de matérias da imprensa convencional. Mas existe uma grande quantidade de informações sem verificação. E isso permite a difusão de boatos”, avaliou.

Os pesquisadores misturaram informações opinativas com boatos que têm destaque nas redes. Assim a estória de Lulinha teve aceitação equivalente à afirmação de que “os desvios da Petrobras são o maior caso de corrupção da história do Brasil”, com 85% de concordância entre os manifestantes. Além desta, as afirmações “o PCC é um braço armado do PT” e “o PT trouxe 50 mil haitianos para votar na Dilma nas últimas eleições” foram aceitas como verdadeiras por 53,2% e 42,6%, respectivamente.

Coerentes com posições conservadoras, 70,9% dos manifestantes avaliam que “cotas raciais geram mais racismo” e 60,4% acreditam que o programa Bolsa Família “financia preguiçosos”. E demonstrando crença de que a guerra fria não acabou, 64,1% concordam que o PT quer implementar uma ditadura comunista no Brasil.

Para o professor, essa aceitação dos boatos e a rejeição a essas políticas está ligada também a “ascensão de comentaristas políticos que são conservadores e polemistas”. E que fazem parte da formação de opinião da maior parte dos manifestantes de domingo.

Pouco mais da metade dos manifestantes (51,8%) declarou “confiar muito” na revista Veja. E 39,6% têm um de seus colunistas como principal formador de opinião. Outros 49,4% têm a mesma perspectiva da apresentadora Raquel Sherazade, conhecida por considerar compreensível que justiceiros amarrassem, em um poste, um jovem negro acusado sem provas de ter cometido um roubo. No entanto, 37,1% disseram “não confiar” no principal jornalístico da TV Globo, o Jornal Nacional e outros 22,6% na Globo News, canal exclusivo de notícias da emissora.

Para Ortellado, também é relevante a descrença no sistema político percebida entre os manifestantes. “Os resultados são muito eloquentes. “Mesmo o PSDB só tem 11% de confiança. Então, a descrença não está somente no PT, mas em todo o sistema político, compreendido de forma ampla: partidos, imprensa, movimentos, ONGs”, avaliou.

Além da já esperada rejeição ao PT (96%) e à presidenta Dilma (96,7%), houve ampla rejeição aos partidos em geral. O PSDB foi considerado “pouco confiável” por 41,4% dos entrevistados e “não confiável” por 47,6%. Outros 61,1% têm a mesma percepção da Rede Sustentabilidade, partido da ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, e 81,8% não confiam no PMDB, partido dos presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros, além do vice-presidente da República, Michel Temer. Cunha, especificamente, foi considerado confiável por 3,2%.

Dentre os políticos, foi mais clara a simpatia com tucanos e conservadores. Quase um terço dos manifestantes (29,1%) declararam “confiar muito” no governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB). Outros 22,6% têm a mesma percepção do candidato tucano derrotado na última eleição presidencial, Aécio Neves. O deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) foi considerado confiável 19,4% dos manifestantes.

De outro lado, a candidata a presidência da República em 2014 pelo Psol, Luciana Genro, é considerada confiável por somente 4% dos entrevistados. O deputado federal Jean Willys, do mesmo partido, têm 3,9% de confiança. O prefeito da capital paulista, Fernando Haddad (PT), tem a mesma consideração de apenas 2,1% dos manifestantes. E o ex-presidente Lula, 1,4%.