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Ricardo Nunes utilizou apenas 4% da verba para combate a enchentes em São Paulo em 2023

Mais de R$ 1,5 bilhão foram previstos pela prefeitura de São Paulo para investimentos no combate às enchentes. Mas, no período de chuvas mais intenso deste ano, apenas R$ 23 milhões foram empenhados pelo prefeito, apesar dos alagamentos terem causado até mortes

Marcelo Camargo/EBC
Marcelo Camargo/EBC
Sofrimento e drama de milhões de pessoas na maior metrópole da América Latina não sensibiliza o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes

São Paulo – No terceiro ano mais chuvoso da histórica de São Paulo, a prefeitura da capital paulista, sob a administração de Ricardo Nunes (MDB), investiu apenas 4% das verbas destinadas para ações de prevenção e combate a enchentes e alagamentos. De acordo com dados do Portal da Transparência do município, divulgados pelo g1 nesta terça-feira (21), entre 1º de janeiro a 14 de março – período de chuvas mais intenso deste ano – o total previsto para investimentos era de R$ 1,54 bilhão. 

No entanto, somente R$ 572,9 milhões foram empenhados. Ou seja, liberados para serem aplicados na área. O governo Nunes, no entanto, utilizou apenas R$ 23 milhões desse montante. O equivalente a 4% do valor empenhado. 

Ao longo desse primeiro trimestre, porém, a cidade de São Paulo registrou milhares de pontos de alagamento e enchentes, com carros submersos e pessoas ilhadas que precisaram ser resgatados em botes. As constantes inundações causaram ao menos duas mortes, uma delas de uma idosa em Moema, na zona sul da capital paulista. O volume de chuva registrado até o dia 14 de março, metade do mês, foi o equivalente ao que tipicamente chove até o fim de abril. Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), já foram 855 milímetros de chuvas. E a expectativa era de 865 milímetros para até abril. 

André Bueno/ Câmara Municipal de São Paulo
O prefeito Ricardo Nunes é alvo de uma representação no MP e TCM que questiona a falta de plano de investimento no combate as enchentes

‘Problema de gestão’

Em entrevista ao portal, o economista do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) André Luiz Marques afirmou que cabe à prefeitura explicar por que ela tomou uma decisão de não gastar esse recurso. “Se for inconsciente, pior ainda, porque aí é um problema de gestão”, apontou. De acordo com Marques ao g1, esse é um “modus operandi antigo”. 

“Espera acontecer o problema para depois sair correndo atrás. E pior: temos mudanças climáticas, períodos mais intensos de chuva, mais difíceis de prever. Só vai piorando. Eles vão jogando para frente, vão empurrando. As consequências só vão ser piores para a população. Historicamente falando, dada essa execução muito abaixo. Eles colocam no orçamento, aprovam a lei orçamentária e não executa? É um recado que (a prefeitura) está dando de que isso não é importante”, analisou o economista. 

Na semana passada, em protesto em frente à prefeitura, no centro de São Paulo, movimentos sociais denunciaram, com base em um estudo da promotoria de Habitação do Ministério Público que, nos últimos sete anos, foi previsto investimento de R$ 7,4 bilhões para a área. Mas a prefeitura deixou de investir R$ 3,4 bilhões. Além disso, durante todo o ano de 2022, o governo Nunes deixou de gastar 25% do orçado para o combate a enchentes, de R$ 2,3 bilhões. 

Ricardo Nunes ‘faz caixa’

O prefeito ainda alegou, no último dia 14, que os transtornos causados seriam culpa da “chuva atípica”. O que foi ironizado pelo deputado federal Guilherme Boulos (Psol-SP) em suas redes sociais. “A Prefeitura de São Paulo ignorou a exigência da Lei e simplesmente não fez o plano de gerenciamento de risco para as chuvas de verão. A população da maior cidade da América Latina está abandonada”, contestou o parlamentar.

Enquanto deixa de investir, a gestão de Ricardo Nunes faz um caixa recorde, com mais de R$ 31,4 bilhões. Os dados foram consolidados em 27 de janeiro deste ano, do balanço patrimonial do próprio governo municipal.

O prefeito, contudo, é alvo de uma representação do vereador Celso Giannazi (Psol) que questiona um plano de investimento de combate as enchentes. De acordo com levantamento do mandato, em 2022 a Secretaria Municipal de Infraestrutura e Obras realizou 101 contratações de obras de drenagem. Entre elas, 92% das intervenções foram contratadas sem licitação em regime emergencial, o equivalente a R$ 1.174.688.209,21.

Denúncia no MP e TCM

O documento lista que a meta era construir 14 piscinões entre 2021 e 2024, mas apenas três foram entregues no período. A atual gestão também prometeu limpar 8,2 milhões de metros de extensão de córregos, mas menos de um terço – 2,6 milhões – foi efetivamente limpo. 

Acionamos o Ministério Público e o TCM para ver se esse dinheiro está sendo bem gasto, porque não dá para aceitar que o dinheiro vai embora e a gente está vendo as enchentes, pessoas morrendo cada dia mais”, afirmou Giannazi ao g1.

A prefeitura alega, no entanto, que “não há razão em comparar a execução orçamentária de janeiro, fevereiro e março, com a efetividade das ações” da Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras. E que o município trabalha mitigar, principalmente nessa época do ano, os danos causados pelas chuvas extremas à população e à cidade de maneira geral”.