Frente política e social busca alternativa ao fundamentalismo religioso

Comissão extraordinária de Direitos Humanos reuniu cerca de 350 pessoas na noite de ontem no centro de São Paulo. Laerte Coutinho, Jean Wyllys e outros militantes de movimentos sociais estiveram presentes

O cartunista Laerte e o deputado Jean Wyllys se beijam ao final da reunião (Foto: Mídia Ninja/Facebook)

São Paulo – “Laerte me representa”. Era essa a hashtag que deveria ser usada por todos aqueles que quisessem comentar e acompanhar nas redes sociais o primeiro encontro da Comissão Extraordinária de Direitos Humanos, realizada na noite de ontem (25), na praça Franklin Roosevelt, no centro de São Paulo. A frase diz respeito à cartunista Laerte Coutinho, que assumiu ser transgênero recentemente e passou a militar pela causa da diversidade. 

O objetivo do ato é criar espaços alternativos à onda de fundamentalismo religioso que tem conseguido tomar espaços antes ocupados por militantes sociais. A última dessas ações foi a eleição, em março, do deputado Marcos Feliciano (PSC-SP) para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. Feliciano é pastor e assumiu publicamente posições tidas como racistas e homofóbicas. 

Cerca de 350 pessoas compareceram ao evento. Compunham a mesa, além de Laerte, o deputado federal Jean Wyllys (Psol-RJ), Marcelo Gil, da organização não-governamental ABCD’S, Ysani Kalapalo, do Movimento Indígena em Ação, Milton Barbosa, do Movimento Negro Unificado, Jean Paulo Charleaux, diretor do Conectas, e Bruno Torturra, do Existe Amor em SP, organizadores do evento.

A ideia da comissão – com viés mais propositivo que os atos anteriores, que pediam a saída do deputado Feliciano da presidência da comissão – surgiu para evitar que as críticas a ele servissem como trampolim de seu discurso, considerado conservador e reacionário.

“Já que os protestos pura e simplesmente não surtiram o efeito e de alguma forma solidificaram a presença dele, a gente decidiu partir para o próximo passo, que é impedir a pauta que ele nos bloqueou, que é muito mais importante e urgente do que uma falsa guerra entre evangélicos e laicos, enfim, essa narrativa que o Feliciano foi muito hábil em criar”, explicou Torturra. “A gente espera que não seja apenas um ato simbólico e pontual, mas que o começo de uma frente civil e parlamentar para criar de fato uma bancada com suporte popular, humanista”, defende.

“A democracia no Brasil está seriamente correndo risco com esse crescimento do fundamentalismo que se articulou politicamente, se fortaleceu economicamente e tomou parte das câmaras de vereadores, que chegou às assembleias legislativas e agora está no Congresso Nacional”, afirmou Jean Wyllys. “E isso tudo ameaça a democracia, a laicidade, a República. E nós não podemos ficar de braços cruzados.”

O deputado afirmou que, além do embate político, diversas medidas para garantir a ação do legislativo vêm sendo tomadas. Uma Frente Parlamentar pelos Direitos Humanos foi montada e já conta com 178 deputados e uma agenda de trabalho. Nos próximos dias, deputados irão a Goiânia, capital de Goiás, debater com os poderes locais o extermínio de pessoas em situação de rua. Em Salvador, capital baiana, a pauta é tratar sobre a ameaças ao Quilombo dos Macacos.

“Nós precisamos ter claro que essa não é uma briga contra a religião. Nós precisamos ter o direito de expressar a nossa religiosidade, como a nossa orientação sexual, como nossos rituais próprios de cidadãos e cidadãs”, enfatizou Laerte.