Direitos Humanos

Secretário de Haddad admite desconforto com Operação Delegada

Rogério Sottili afirmou que não se sente 'confortável' com convênio que paga PMs de folga para agirem na fiscalização de leis municipais

Marcelo Camargo/ABr

O secretário também criticou a internação compulsória de usuários de crack no estado de São Paulo

São Paulo – O secretário municipal de Direitos Humanos de São Paulo, Rogério Sottili, disse hoje (20) na abertura do 35ª Semana de Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), que não se sente confortável com a Operação Delegada, convênio firmado em 2009 por meio do qual a prefeitura paga pelos serviços de policiais militares em períodos de folga para agirem no cumprimento das leis municipais. Em março, o prefeito Fernando Haddad (PT) e o governador Geraldo Alckmin (PSDB) assinaram documento que ampliou as atividades que poderão ser desenvolvidas por PMs.

Ao ser questionado sobre uma possível desmilitarização da polícia para reduzir casos de violações de direitos por parte de policiais e sobre a Operação Delegada, Sottili afirmou que quando estava a caminho do evento “rezou para que ninguém fizesse esta pergunta”. “Sou secretário de Direitos Humanos de São Paulo, portanto, sigo uma diretriz política, mas nem sempre nos sentimos confortáveis com algumas decisões que extrapolam nossa competência. Confesso que essa é uma destas questões. Não acho a Operação Delegada uma boa solução, da forma pela qual foi firmada.”

A ampliação do convênio possibilita que, além de fiscalizar o comércio irregular, os 3.986 policiais militares e bombeiros da operação ajudem na fiscalização e prevenção de incêndios em casas noturnas, no Programa de Silêncio Urbano (Psiu) e na proteção do patrimônio e equipamentos municipais. A operação foi também ampliada para o período noturno.

Ainda segundo o secretário, no entendimento de Haddad e do secretário de Segurança Urbana, Roberto Porto, “a pactuação foi necessária para atender a locais extremamente vulneráveis dentro de São Paulo”, e não houve aumento nos registros de abusos cometidos pelos policiais militares.

“Eu mesmo conversei com o prefeito sobre isso e ele disse que é uma tarefa da prefeitura fiscalizar para que não ocorram violações. Mas confesso que acho que poderíamos tentar outras alternativas”, comentou.

Sobre a ação policial na cidade de São Paulo, Sottili afirmou que as violações de direitos humanos cometidas pela Polícia Militar, principalmente nas periferias da cidade, “são problemas a serem enfrentados”, ainda que o governo municipal não tenha competência para lidar com a PM. Ele chamou a atenção para as truculências policiais cometidas pela Guarda Civil Metropolitana (GCM).

“Temos governabilidade sobre a GCM, que também não é fácil. A GCM é truculenta, porque ela vem formada sobre a ideia da repressão, de dispersar, higienizar, de tirar as pessoas diferentes das ruas. Se é LGBT tem de sair, o padrão é ser macho ou mulher, se é morador de rua tem de sair também, e este é um processo cultural a ser trabalhado.”

Sottili também afirmou que foi criado em parceria com a Secretaria Municipal de Educação um grupo de trabalho para criar uma política de educação em direitos humanos, e com a Secretaria de Segurança Urbana, um programa, junto à GCM, que inclui a criação de novos editais de concursos e contratação. “O edital contava com itens inacreditáveis para o século 21, como requisitos de números de dentes na boca, altura mínima, tinha caráter extremamente preconceituoso.”

Nova virada

A Virada Cultual que terá “a cara” da administração municipal atual, segundo Sotilli, será o evento de 2014. “Herdamos um projeto muito interessante, mas que já veio com alguns encaminhamentos. A virada que vai ter a nossa cara será a virada do ano que vem.” Ele ressaltou que este ano algumas mudanças já foram implementadas, como atrações de rap realizadas no centro da cidade.

Sobre a possível omissão da Polícia Militar diante de furtos, assaltos e arrastões que aconteceram na virada deste ano, realizada entre sábado e domingo (18 e 19), relatadas por frequentadores do evento, o secretário de Direitos Humanos afirmou que existia uma orientação da prefeitura ao governo estadual para não deixar a PM praticar violências e abusos, “mas não existe isso de orientação de não intervir”. “O prefeito acha que se é necessário, a polícia tem de intervir mesmo, o que tem de mudar é a abordagem.”

Divergências

Os direitos humanos na segurança pública precisam avançar através de um “pacto federativo”, segundo Sotilli. “Isso não é fácil. O estado é governado por um partido com visões diferentes, mas precisamos abrir caminhos junto à Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP).”

O secretário ainda criticou posicionamentos políticos tomados pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) nos últimos meses. “O governo do estado é a favor da internação compulsória, é a favor da redução da maioridade penal, somos contra tudo isso. O que está sendo proposto não é novo, já ficou comprovado que é ineficaz e que agrava o problema de violações dos direitos humanos no país. Precisamos desconstruir a política de violações dos direitos humanos e construir outra, de promoção destes.”