Prisões de fiscais acusados de desviar R$ 200 milhões em SP são prorrogadas

Apenas um, Luis Magalhães, deve ser liberado neste domingo por colaborar com as investigações. Pelo menos cinco empresas estão envolvidas no caso

Bruno Miranda/Folhapress

Kassab, vice de Serra a partir de 2005, virou titular em 2007, quando o tucano deixou a prefeitura

São Paulo – As prisões temporárias do ex-subsecretário da Receita Municipal, Ronilson Bezerra Rodrigues, do ex-Diretor do Departamento de Arrecadação e Cobrança, Eduardo Barcelos, e do ex-Diretor da Divisão do Cadastro de Imóveis, Carlos Augusto Di Lallo, todos com cargos na cidade de São Paulo, foram renovadas até o próximo dia 10. Eles são acusados pelo desvio de pelo menos R$ 200 milhões em Imposto sobre Serviços (ISS) que deveriam ter sido recolhidos de empreendimentos imobiliários na capital paulista para contas privadas.

Luis Alexandre Cardoso de Magalhães, também envolvido no desvio, deve ser beneficiado por colaborar com as investigações e ser liberado. Os quatro estão detidos desde a última quarta-feira e a prisão temporária venceria já neste domingo (3).

Pelo menos cinco construtoras estão envolvidas no desvio do ISS na cidade de São Paulo, segundo reportagem do jornal O Estado de S. Paulo. A Trisul, BKO, Tarjab, Alimonti e Brookfield seriam responsáveis por pagar parte da propina aos fiscais que tinham cargos de confiança na gestão financeira do ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD). A quantia pode chegar a R$ 500 milhões se for considerado o período em que eles ocuparam cargos de chefia, entre 2007 e o final do ano passado. Pelo menos 500 empreendimentos teriam deixado de pagar a integralidade do imposto à prefeitura. Mas o Ministério Público ainda investiga se as empresas são vítimas ou cúmplices do rombo.

O esquema montado pela quadrilha oferecia descontos que chegavam a 50% do valor devido ao município. Na maioria das operações, os fiscais recolhiam 10% do “deságio” aos cofres municipais e embolsavam 90%. Sem o pagamento da propina, as construtoras não conseguiam o Habite-se, autorização para que o imóvel seja ocupado.

Para o coordenador geral da União Nacional por Moradia Popular (UNM), Donizete Oliveira, o escândalo, um dos maiores da história de São Paulo, não traz surpresa. “Não nos surpreende isso aí. Porque essas empreiteiras sempre conseguiram aprovar seus projetos muito rápido”, afirma.

Nos últimos anos, movimentos de moradia, especialistas e militantes pelo direito à cidade vêm apontando um processo intenso de especulação imobiliária na capital paulista, o que tem causado a expulsão de pessoas de baixa renda de áreas que interessam direta e indiretamente à iniciativa privada.

Para a urbanista e ex-conselheira do Habitat, programa das Nações Unidas para assentamentos humanos, Ermínia Maricato, o episódio ilustra o estado de assalto a que a cidade está submetida. “Essa cidade está sendo assaltada. O que você tem hoje é uma dominação do capital imobiliário e da construção de infraestrutura que subordina o Estado”, avalia.

Maricato e Oliveira lembram que outro desvio de grande vulto de corrupção da gestão de Gilberto Kassab – que chegou à chefia do Executivo como vice de José Serra, tomando posse em 2007 –, também envolvia processos de autorização de empreendimentos imobiliários, o chamado caso Aref. Hussain Aref Saab era diretor do Aprov, departamento responsável por liberar construções na cidade, e é acusado de ter dado autorizações a empreendimentos fora dos padrões requisitados pela legislação e obtido em troca 106 imóveis, o que garantiu a ele patrimônio estimado de R$ 50 milhões.

“O pior do Aref, que até hoje não foi solucionado, é que muita coisa foi aprovada e construída irregularmente. Temos vários shoppings na cidade construídos irregularmente. E a gente tem de dormir com esse barulho: entope a cidade de carro, faz obra que não acaba mais e não se faz nada para conter a especulação imobiliária, que prejudica os pobres e a classe média, que têm ido cada vez mais para a periferia”, afirma a urbanista.

Entre as empresas que teriam pago propina a Aref para iniciar a construção de shoppings está a Brookfield, citada na nova investigação que trata do processo final de liberação do empreendimento já concluído. A empresa não se pronunciou sobre o caso.