Direitos Humanos

Comitês se mobilizam em 15 cidades contra violações promovidas pelas obras da Copa

Ideia é pegar carona na abertura da Copa das Confederações, que começa sábado, em Brasília, para chamar a atenção para remoções forçadas e outras arbitrariedades

São Paulo – Movimentos sociais de todo o país realizam nesta semana uma jornada de mobilização com o objetivo de denunciar os “efeitos colaterais” provocados pelos preparativos para a Copa do Mundo sobre os direitos humanos e sociais dos brasileiros – sobretudo da população de baixa renda. Cerca de 15 cidades deverão assistir a marchas, manifestações e seminários até sábado (15), quando tem início em Brasília a Copa das Confederações. Os protestos foram convocados pelos grupos reunidos na Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa (Ancop) e na Frente de Resistência Urbana.

A agenda ainda não está completamente definida, mas já estão confirmadas mobilizações de rua em São Paulo e Porto Alegre, no dia 14, e no Rio de Janeiro e Brasília, no dia 15. Belo Horizonte terá seminário de três dias para discutir as consequências da Copa do Mundo. Discussões também ocorrerão em Natal. De acordo com a Ancop, algumas cidades que não sediarão jogos do torneio também devem se unir às manifestações, como Belém, João Pessoa, Boa Vista e Teresina.

As principais críticas dos movimentos sociais à organização da Copa se relacionam às remoções forçadas de famílias que residem – ou residiam – no entorno dos estádios. Apesar da falta de dados oficiais, a Ancop acredita que aproximadamente 250 mil pessoas em todo o país já foram despejadas ou estão ameaçadas de despejo devido às obras preparatórias para o torneio – que também incluem melhorias viárias. No último 28 de maio, ativistas brasileiros foram à sede das Nações Unidas, em Genebra, para denunciar as violações (veja o vídeo exibido na ocasião).

Leia também:
Após chutar traseiro do Brasil, ‘homem mau’ da Fifa recebe título de cidadão paulistano

Descaso

“Muitos direitos humanos e sociais já são normalmente violados no Brasil”, afirma Patrícia Abdalla, membro da Ancop, “mas os megaeventos intensificam essas violações: as remoções são feitas com maior agilidade e muitas vezes de forma violenta. Os moradores em geral não são chamados a participar das decisões e sofrem com a falta informação. No fim das contas, o problema habitacional não é resolvido.”

De acordo com Guilherme Boulos, membro da Frente de Resistência Urbana, esta será a terceira grande mobilização nacional contra as arbitrariedades da Copa do Mundo no Brasil. “Em agosto de 2011 estivemos no Ministério dos Esportes com duas mil pessoas, no ano passado ocupamos o canteiro de obras de vários estádios do país e agora, na abertura da Copa das Confederações, queremos reafirmar que as autoridades não deram acompanhamento nem solução aos problemas enfrentados pela população.”

Além das remoções, os movimentos sociais criticam o elevado montante de recursos públicos canalizados para a realização do megaevento – que podem chegar a R$ 100 bilhões. “É dinheiro que poderia ser usado para educação e saúde de qualidade, transporte público mais eficiente e saneamento básico, por exemplo”, aponta Patrícia Abdalla. “Destinar bilhões de reais em linhas de crédito do BNDES ou isenções fiscais enquanto nossa população padece de necessidades básicas também é uma violação aos direitos humanos”, complementa Guilherme Boulos.

Modelo

A Ancop e a Frente de Resistência Urbana defendem que as remoções, quando realmente necessárias, sejam feitas “chave por chave” – isto é, as famílias apenas devem deixar suas casas quando já tiverem outro lugar para morar. Os movimentos exigem ainda um plano governamental para o combate à exploração sexual de mulheres, crianças e adolescentes, que já ocorre no Brasil, mas que, acreditam, deve se intensificar com a massiva chegada de turistas para a Copa.

Outra demanda da jornada de mobilização é garantir trabalho para todos os vendedores ambulantes e pequenos comerciantes que sempre atuaram no entorno dos estádios – mas que durante o torneio podem ser proibidos de vender seus produtos. “Em Salvador queriam impedir até mesmo as baianas de vender acarajé”, lembra Patrícia Abdalla. Os movimentos sociais também pedem condições dignas para trabalhadores da construção civil que estão empregados nas obras da Copa.

“Não somos contra a Copa do Mundo, mas contra esse modelo de Copa do Mundo que é feito às custas do povo e dos trabalhadores do país, com obras realizadas sem diálogo com a população e com a imposição de legislações que favorecem o interesse econômico de patrocinadores da competição”, argumenta Boulos. “Mas seria preciso haver transformação completa na Fifa e em todo o futebol mundial para termos outro modelo, mais sintonizado com os interesses populares.”