Homofobia

Declarações de Levy contra homossexuais motivam beijaço e ações na Justiça

Deputados anunciam apresentação de representações no Ministério Público contra incitação à violência. Jean Wyllys afirma que Levy passa a ser responsável por atos de ódio surgidos de sua declaração

Frame/Folhapress

Protesto contra deputado Marco Feliciano (PSC), na Avenida Paulista, em 2013: histórias repetidas

São Paulo – Inicialmente motivo de revolta entre usuários de redes sociais, declarações do candidato à Presidência da República pelo PRTB, Levy Fidelix, ganharam novas frentes de oposição ao longo do dia de hoje (29), com a convocação de atos contra a homofobia e a apresentação de ações contra o político.

As respostas ultrapassaram os limites da internet. O deputado federal Jean Wyllys (Psol-RJ) anunciou que iria avaliar a possibilidade de entrar com uma representação contra Fidelix. O parlamentar explicou que não acredita que prisão seria a melhor punição em um caso como este: pedirá uma pena alternativa por dano moral, uma pena socioeducativa e uma retratação pública. “Ele será responsável pelo que de concreto acontecer com os homossexuais, com as lésbicas, com as transexuais, se ele não se retratar, se ele não voltar atrás e pedir desculpa pelo que ele fez”, explica.

Ontem, ao ser questionado por Luciana Genro (Psol), do partido de Wyllys, sobre sua posição em relação ao casamento homoafetivo, Fidelix se saiu com a visão de que a relação entre pessoas do mesmo sexo é um problema que deve ser tratado. Indo além, exortou a “maioria” a se unir contra os homossexuais. “Olha, minha filha, tenho 62 anos, e pelo que vi na minha vida dois iguais não fazem filhos. E digo mais: aparelho excretor não reproduz.”

Antonio Rodrigo Machado, advogado que representa Jean Wyllys, explica que serão abertas duas representações: uma no Ministério Público Federal, que pede uma investigação para apurar as consequências das afirmações de Levy Fidelix; e outra no Ministério Público Eleitoral, junto com a candidata Luciana Genro, por entender que o debate pode ser considerado uma espécie de propaganda política. Resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a legislação que regulamenta o período eleitoral vedam qualquer tipo de propaganda que incite o ódio ou a raiva contra determinados setores da sociedade.

Para ele, Fidelix foi irresponsável. “Quais são as consequências de um discurso de ódio naquele patamar, naquele direcionamento? A consequência é a homofobia, são os crimes de homofobia.” Antonio afirma que o candidato cometeu um atentado aos direitos humanos e contribuiu com a violência contra LGBTs no Brasil.

Wyllys também chama a atenção para a gravidade do silêncio dos demais candidatos e dos risos da plateia. “Podem ter se indignado individualmente, mas em silêncio. Todos silenciaram. Tudo isso também nos feriu profundamente, porque isso dá a entender que há um aceite desse tipo de violência.”

Outras pessoas se manifestaram por perfis das redes sociais. O deputado Renato Simões (PT) também informou ter ingressado com uma representação na Procuradoria-Geral da República contra Levy Fidelix, motivada pelo “espetáculo homofóbico e lamentável”.

Já o candidato e deputado Tiririca (PR) não demorou em se posicionar contra a fala de Levy. “Dizem que sou burro, mas pelo menos não falo bobagem que nem certos candidatos… sou a favor do amor e cada um deve viver feliz!!!”, publicou no seu perfil do Twitter. O deputado postou outras mensagens em defesa dos homossexuais e citou famosa música dos Mamonas Assassinas (“Abra a sua mente, gay também é gente”” Tiririca também pediu “uma vaia para o preconceito” e disse que prefere “escrever errado a coisa certa do que escrever certo a coisa errada”.

Militantes de causas LGBT estão organizando para o próximo sábado um Beijaço e Trepaço LGBT na casa de Levy Fidelix, no Brooklyn, zona sul de São Paulo, em repúdio às declarações.

Uma ação coletiva também está sendo promovida pela rede social e parece ter grande adesão: 3,5 mil pessoas confirmaram presença no “evento”. Diversos usuários compartilham informações sobre como denunciar o candidato do PRTB pelo site do Ministério Público Federal.

Nós entendemos que houve um dano”, diz o advogado Antonio Rodrigo. “A forma como esse dano vai ser reparado, nós esperamos que o Ministério Público tenha o melhor entendimento. Acreditamos que o MPF vai tomar as medidas necessárias à repreensão.”

A situação serviu também para explicitar a importância de tipificar em lei o crime da homofobia. O Projeto de Lei 122, de 2006, foi tratado como tema central pelos parlamentares ligados aos direitos humanos, mas não avançou na atual legislatura. Com isso, vítimas de preconceito por sexualidade não têm amparo legal para processar seus agressores com base nessa questão específica. Sem isso, uma atitude como a de Fidelix depender de interpretação do Ministério Público, primeiro, para se transformar em ação, e do Judiciário, depois, para resultar em punição.

Jean Wyllys reforça que esse momento de indignação é importante para a reivindicação de políticas públicas eficazes no combate à homofobia, principalmente no campo social, do discurso, “que é absolutamente danosa porque desumaniza a gente. É um discurso que nos associa a tudo que não é humano, a tudo que é ruim e que acaba justificando a violência concreta conta nós, o homicídio, a lesão corporal”, afirma. “Se em vez dos homossexuais o Levy tivesse falado isso de pessoas com deficiência, ou em relação aos judeus, como as pessoas estariam se comportando? Será que a plateia riria?”

Após o debate, Levy Fidelix concedeu uma entrevista para o Terra Magazine na qual afirmou não ser homofóbico e que apenas não “estimula” pessoas que defendem homossexuais. O candidato se irritou com as questões sobre o assunto e perguntou ao repórter se ele era gay.

Para Wyllys, com esta reação, Levy volta a expor problemas. “Todo estúpido como ele pensa que homofobia é só pegar uma arma e disparar contra um gay ou enfiar uma faca. Todo estúpido não faz a conexão entre o discurso ofensivo e desumanizador e o ato concreto de matar uma pessoa”, explica. Afinal, para o deputado, só é possível matar uma pessoa com tamanha violência se não a enxerga como sujeito de direitos. O cara que sustenta um discurso público de que nós somos uma ameaça está em última instância sancionando toda a ação contra nós, a ação concreta, violenta. Então um estúpido desse só pode dizer ao fim de uma fala dessa que não é homofóbico, porque não compreende”, completa.

No final da tarde de hoje, o deputado publicou um texto no seu Facebook contando que voltou a sofrer ameaças.