Memória e justiça

Volks e ditadura: associação espera concluir entendimento sobre perseguições

Novo presidente da entidade, funcionário da empresa de 1969 a 1978, vai retomar contato com Ministério Público e com representantes da montadora

Adonis Guerra/SMABC
Adonis Guerra/SMABC
Posse de novo presidente de associação de ex-metalúrgicos da Volks perseguidos pela ditadura: caso da montadora é o mais destacado entre empresas que colaboraram com o regime repressivo

São Paulo – O novo presidente da Associação Heinrich Plagge, Tarcísio Tadeu Garcia Pereira, espera concluir em breve um acordo com a Volkswagen e com o Ministério Público sobre a perseguição a trabalhadores da Volkswagen durante a ditadura. “Nesta semana vamos procurar o MP Federal e o Estadual para saber quais os caminhos que podemos ter para finalizar esse entendimento”, diz Tarcísio, que tomou posse na segunda-feira (1º), substituindo Lúcio Bellentani, que morreu em 19 de junho. A cerimônia foi no Centro de Formação Celso Daniel, do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

Tarcísio lembra que entrou na Volks de São Bernardo em 1969, com 15 para 16 anos, no setor de Ferramentaria, egresso do Senai. E foi aprendiz justamente de Lúcio Bellentani, que foi preso em plena linha de montagem, em 1972. Ele era vice da associação, cujo nome homenageia outro ex-metalúrgico, morto em 2018, também preso e torturado.

Outros trabalhadores já morreram, lembra Tarcísio, que mostra preocupação no sentido de garantir um acordo de reparação que possa atingir o maior número de ex-metalúrgicos ou seus herdeiros. “O tempo joga contra nós.”

Segundo ele, atualmente há 52 ex-funcionários da montadora se habilitando para as reparações individuais. As conversas com a empresa e com o Ministério Público visam a garantir também uma reparação coletiva, com assinatura de um termo de ajustamento de conduta (TAC).

O caso da Volks é o exemplo mais destacado de empresas que colaboraram com o regime repressivo e que foram objeto de investigação por diversas comissões da verdade, inclusive a nacional. Tarcísio cita o caso de reuniões do Centro Comunitário de Segurança do Vale do Paraíba (Cecose), no interior paulista, em que empresários e militares da região trocavam informações sobre sindicalistas e militantes, já nos anos 1980. Em vários lugares, empresas elaboravam “listas sujas” de trabalhadores considerados “subversivos”, que não conseguiam arrumar emprego.

Muitos militavam em partidos proscritos ou grupos políticos. “A base do PCB dentro da Volkswagen era de quase 150 companheiros”, afirma Tarcísio, que saiu da montadora em 1978, ano da última fase da “limpeza” feita pela empresa contra operários com atividades sindicais ou políticas – ou simplesmente suspeitos. Outros foram dispensados ou denunciados em 1972, caso de Lúcio Bellentani, e em 1975. Ele cita relatórios reservados de órgãos de segurança da ditadura que apontam a Volks como fonte de informação.

E recorda de pelo menos um episódio curioso ocorrido na fábrica, onde um militante do PCdoB trabalhava como vigilante. Esse integrante da segurança interna soube que um metalúrgico seria preso e avisou-o a tempo: o operário pulou o muro da fábrica e fugiu.

O atual presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, Wagner Santana, o Wagnão, disse esperar que o acordo esteja em uma fase final. “Para que isso sirva de exemplo e que, a partir dele, a gente consiga construir outras negociações com outras empresas com mais agilidade para resolver o problema de outros companheiros que se encontram na mesma situação”, afirmou.