Porte de maconha

Após voto de conservadores contra a descriminalização, Toffoli suspende julgamento

Placar até o momento é de 5 a 3 pela regulamentação da descriminalização do porte de maconha

STF
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Questão ainda está indefinida. Barroso enfatizou que julgamento não trata de liberação, mas fixação de parâmetros para diferenciar tráfico de consumo pessoal

São Paulo – O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a suspender o julgamento sobre o detalhamento da descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. O tema está em pauta na Corte há quase uma década. Na sessão desta quarta-feira (6), a discussão foi suspensa após votos de André Mendonça e Nunes Marques, contrários à descriminalização. Depois disso, o ministro Dias Toffoli pediu vista.

Até o momento, oito ministros já proferiram seus votos, com cinco a favor e três contra a descriminalização. A favor, Gilmar Mendes, relator do caso, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e a agora ministra aposentada Rosa Weber. Já Cristiano Zanin, Nunes Marques e Mendonça foram contrários à descriminalização da maconha, mas se mostraram relativamente favoráveis ao estabelecimento de uma quantia que diferenciasse usuário de traficante.

O presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, ressaltou que o julgamento não trata de liberação das drogas, mas discute parâmetros para estabelecer o que pode ser considerado tráfico ou porte para consumo pessoal. E lembrou que o debate se restringe à maconha. “As drogas não estão sendo, nem serão liberadas no país por decisão do STF. Legalizar é uma definição que cabe ao Poder Legislativo e não ao Poder Judiciário.”

Hoje foi a vez dos ministros indicados por Jair Bolsonaro, André Mendonça e Nunes Marques, apresentarem seus votos. Ambos se posicionaram contrários à descriminalização. Fiéis ao pensamento conservador que os levou ao Supremo, os ministros utilizaram argumentos considerados ultrapassados sobre a realidade das drogas, mesmo após o esclarecimento do presidente da Corte. Uniram-se, assim, ao voto de Zanin, indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2023.

Crime ou ilícito?

Barroso enfatizou que a questão em debate não se trata de legalização, mas de definir a natureza do porte de maconha: é um crime, punido com medidas penais, ou um ilícito, com sanções administrativas? Assim, ele ressaltou que o consumo de drogas no Brasil continuará sendo ilegal e que a legalização é uma questão legislativa, não judiciária.

Segundo Barroso, a essência do debate está em estabelecer um critério objetivo para auxiliar policiais e membros do sistema de Justiça a diferenciar o usuário do traficante com base na quantidade de droga encontrada. Isso porque o artigo 28 da Lei das Drogas (Lei 13.343/2006), na prática, já isenta o réu da imputação do ato como crime, e a tipifica como uma contravenção.

O problema é que, sem a definição da quantidade, muitas vezes o enquadramento fica a critério das forças policiais. Estas, costumeiramente, como explica Barroso, utilizam critérios discriminatórios. “Em um bairro rico, é usuário. Em um pobre, traficante”, disse o ministro.

Sinal de “liberação”

Ao iniciar seu voto, o ministro André Mendonça questionou a extensão da eventual descriminalização da maconha para uso próprio. Dessa forma, argumentou que a medida seria interpretada como sinal de “liberação” do consumo. Mendonça destacou os prejuízos na saúde física e mental de diversos grupos, como adolescentes, jovens e gestantes, além dos riscos associados ao uso da droga por motoristas.

Após apresentar dados sobre os impactos negativos da maconha, Mendonça afirmou que “fumar maconha é o primeiro passo para o precipício”, argumento que contrasta com a posição da ciência contemporânea sobre o tema. O ministro também não mencionou o álcool, substância comprovadamente mais nociva que a maconha.

Finalizando seu voto, Mendonça reiterou que a descriminalização é responsabilidade do Legislativo. A seguir, expressou preocupações sobre a aplicação de medidas administrativas em substituição às penais.

Nunes Marques seguiu a mesma linha retórica, mesmo após argumentação de Barroso pela regulamentação de lei penal em branco. Ele disse que “o Legislativo é o local adequado para o debate do tema, o qual é complexo, multifacetário, demandando reflexão”. Acrescentou que a discussão não foi solucionada pela sociedade brasileira, portanto, eventual abolitio criminis deve ser analisada pelo Congresso. O termo em latim (“abolição do crime”, em tradução livre) se refere a uma situação em que um ato, antes considerado de crime, deixa de ser visto como tal.