'Camarotização'

Carnaval de rua é cancelado em diversas cidades, mas acende alerta sobre festas privadas

Rio de Janeiro, Salvador e Olinda proíbem desfiles públicos; blocos de São Paulo também se recusaram a festejar

Rovena Rosa/Agência Brasil
Rovena Rosa/Agência Brasil
"São Paulo tem hoje um carnaval mais curto que uma jornada de trabalho", é no carnaval onde a alegria e as cores ousam afrontar a lógica predatória

São Paulo – Diversas capitais e municípios do Brasil cancelaram a realização do carnaval de rua e os tradicionais desfiles de blocos. Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador e Olinda, cidades que têm algumas das principais mobilizações do Brasil nessa época do ano, não autorizaram eventos de rua, assim como aconteceu em 2021. O cancelamento é motivado pelo avanço da variante ômicron e a alta nos casos de gripe.

Na última quarta-feira (5), blocos de São Paulo divulgaram um manifesto público cancelando cerca de 250 desfiles no carnaval de rua da cidade e dizem que não aceitam participar de eventos fechados no Autódromo de Interlagos, na zona sul da capital paulista, como está sendo estudado pela prefeitura. No texto intitulado “Te Amo São Paulo, mas não vou fazer seu Carnaval…”, eles afirmam que “os blocos participantes dos Coletivos, em sua grande maioria, comunicam que não sairão às ruas neste Carnaval de 2022, mesmo que a festa seja autorizada” pela gestão municipal.

O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), também anunciou que os festejos nas ruas da capital fluminense não ocorrerão. “O Carnaval de rua, nos moldes até 2020, que já não havia acontecido em 2021, não poderá acontecer este ano. Tendo em vista os dados epidemiológicos que temos e que poderemos ter, vimos que seria muito difícil fazer o Carnaval de rua”, disse, em sua conta no Twitter.

Outras capitais, como Campo Grande, Cuiabá, Teresina, Belém, Fortaleza, Florianópolis, Curitiba, São Luís, Recife e Maceió também anunciaram não terão desfiles de bloco de carnaval. Em Belo Horizonte, a prefeitura ainda não anunciou o cancelamento de modo oficial, mas suspendeu patrocínios e investimentos em infraestrutura para a realização do festejo.

Festas privadas

Com o anúncio da proibição de festividades nas ruas das cidades, produtores de eventos planejam a realização de festas de carnaval em locais fechados, desafiando o avanço da covid-19 e da gripe. Reportagem publicada pelo jornal O Globo relata que há conversas para a elaboração de protocolos e manutenção de algumas festividades em eventos privados.

Enquanto a maioria das cidades não proibiu festas privadas, a prefeitura de Niterói publicou uma nota, ontem, informando que não haverá carnaval de rua na cidade, desfile de blocos ou carnaval de bairros, mas também não será autorizada a realização das festas de carnaval em clubes. “No momento, estão mantidos apenas os desfiles de escolas de samba na Rua da Conceição. Vale lembrar que, como acordado com a associação das escolas de samba de Niterói, os componentes terão que apresentar comprovante de vacinação e testagem”, diz o comunicado.

Nas redes sociais, diversas personalidades criticaram a manutenção das festas privadas por conta do alto risco. A professora de Direito Penal e Criminologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Luciana Boiteux disse ser acertado o cancelamento das festas de rua, porém, criticou a falta de medidas da prefeitura carioca sobre os festejos em locais fechados. “Tal medida mostra-se prudente nesse momento, mas nos resta questionar o que a Prefeitura vai fazer em relação ao carnaval das festas privadas, dos clubes na Zona Sul. É importante que as medidas, ainda que acertadas, não sejam usadas como parte do projeto de destruição da vida nas ruas da nossa cidade”, tuitou.

Já a vereadora do Recife Liana Cirne (PT) afirmou que a decisão da prefeitura de suspender o carnaval, sem cancelá-lo, atende aos interesses dos empresários do entretenimento, que já venderam seus ingressos, e deixa ao abandono o setor produtivo do carnaval de rua, que segue na imprevisibilidade. “Em 16 de novembro, usei a tribuna da Câmara para denunciar a discrepância já previsível entre carnaval de rua e o camarotizado. Disse que o auxílio emergencial para os trabalhadores da cultura já precisava ser discutido, já que a pandemia não dava nenhum sinal de recuo. O que não dá é garantir carnaval para ricos e proibir para pobres”, criticou.