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Comando da PM deveria emitir ordem de proteger, em vez de matar a população

Em entrevista à Rádio Brasil Atual, militante de direitos humanos comenta relatório do Tribunal de Justiça que mostra casos de tortura por policiais militares de São Paulo

Daniel Guimarães/A2img

Ivan Seixas: “Se você ve o jeito que a PM anda pela cidade, parece que é uma tropa de ocupação”

São Paulo – Relatório divulgado recentemente pelo Tribunal de Justiça de São Paulo  aponta que 571 pessoas foram mortas por ação da Polícia Militar de São Paulo, entre janeiro e agosto deste ano. Segundo os dados, ao menos 277 presos em flagrante sofreram tortura ou agressão por agentes de segurança, sendo 80% policiais militares.

Em entrevista à Rádio Brasil Atual, o militante de direitos humanos e ex-presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana Ivan Seixas fala sobre os dados da violência policial em São Paulo.

Seixas explica que o  governo federal tentou fazer convênios com outros estados, mas apenas Rio de Janeiro e Pernambuco concretizaram o acordo efetivamente. Em alguns, o convênio funciona parcialmente e em São Paulo, o governador Geraldo Alckmin preferiu não solicitar apoio federal, alegando que o estado ‘não precisa’.

A seguir os principais trechos da entrevista:

Como você avalia esses dados?

Essa apuração do TJ mostra que acontece algo que movimentos de direitos humanos falam há muitos anos. O mesmo acontece com o serviço de proteção aos defensores de direitos humanos, que são ameaçados, mas que eles negam.

O secretário estadual de Segurança Pública, Alexandre de Moraes, nega os registros de violência policial desde o início das audiências de custódia, em fevereiro. Quando o relatório do TJ foi divulgado, a secretaria disse que os casos relatados tratam de hipóteses sem prova. O governo Alckmin não acredita nessas audiências?

Essa declaração dele é gravíssima. Porque o governador coloca sob suspeita o Tribunal de Justiça que fez um trabalho sério, e chegou a essa constatação, ou seja, não é hipótese, é confirmado, mas ele nega admitir que existe. É só ver o noticiário. A PM joga um rapaz de cima do telhado, fuzila sem saber se é culpado.

Aconteceram três casos recentemente envolvendo policiais militares, o primeiro em Osasco envolvendo 19 pessoas, o segundo no Butantã, com dois mortos, e neste final de semana, mais quatro mortos em Carapicuíba. Por que você acha que esses casos estão ficando cada vez mais frequentes em São Paulo?

A Polícia Militar de São Paulo está controlando o governo, e isso é muito grave. Esses casos mostram tudo o que os movimentos de direitos humanos estão denunciando há muitos anos e nunca foi feito nada.

Quando estivemos com o ex-secretário de Segurança Fernando Grella, nós pedimos a ele que parassem com os casos de atirar e depois levar a pessoa ao hospital, que caracteriza como resistência seguida de morte. Ele concordou e as mortes provocadas pela PM caíram 40%.

Ao sair o Fernando Grella, as mortes voltam a subir. Em São Paulo, temos 571 mortes oficiais, mas quantas outras não oficiais? As mortes de Osasco lembram o caso dos Crimes de Maio (em 2006) –  policiais saem matando como grupos de extermínio.

Não existe possibilidade de se fazer uma política de segurança matando. Compare as mortes em guerras civis, os números são próximos. E quantos desses assassinados são bandidos? A maioria não tem nem passagem pela polícia. Não estamos defendendo bandido, estamos defendendo a legalidade. Quando morre um PM, morrem outras trinta pessoas. Os nazistas faziam isso com integrantes da chamada Resistência Francesa.

Não tem cabimento transformar o policial em assassino, temos que defendê-los dessa realidade. O jovem que entrar na profissão para defender a sociedade vira um matador.

Você acredita que esses casos foram o motivo para a derrubada do comandante da Rota (Rondas Ostensivas Tobias Aguiar), Alexandre Gaspar Gasparian?

Ficam tão inconvenientes essas coisas, que tem que tirar alguém, mas não adianta tirar um comandante e colocar outro, pois continua a mesma mentalidade. Troca a pessoa, mas continua o mesmo problema.

Existe algum caminho para que esse tipo de ação policial possa ser combatido?

Isso é de dentro pra fora. A Polícia Militar é treinada pelo Exército, uma herança da ditadura. As figuras mais raivosas da PM falam que combatem o inimigo. Qual inimigo? A população? Fala-se com um ódio como se fosse uma guerra, mas são policiais a serviço das pessoas para protegê-las, não ir contra elas.

Se você ver o jeito que a PM anda pela cidade, parece que é uma tropa de ocupação. Então, a cadeia de comando tem que dar a ordem de que não tem que matar, é para proteger e prender para ver se cometeu o crime, não atirar antes. O governador Geraldo Alckmin tem que tomar providências, dar as primeiras ordens.

 

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