Insuficiente

Lento, Inclusp é incapaz de reduzir desigualdade racial na USP, diz estudo

Segundo pesquisadores da Uerj, entre 2007 e 2015, só 11,29% dos alunos que ingressaram na USP eram pardos; 2,46% eram negros e 0,24%, indígenas

Anderson Barbosa/Fotoarena/Folhapress

Na USP, o percentual de pretos e pardos, que é maior no estado de São Paulo, é inferior ao de brancos e amarelos

São Paulo – O Programa de Inclusão Social da USP (Inclusp) é lento e incapaz de responder rapidamente às pressões por medidas que reduzam a desigualdade racial no ingresso à maior universidade pública brasileira. A conclusão é de um estudo do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

De acordo com os pesquisadores, a USP ainda é marcada por uma forte desigualdade racial em seu sistema de ingresso. No período analisado, apenas 11,29% dos alunos que ingressaram eram pardos, 2,46% eram negros e 0,24% eram indígenas.

Eles analisaram dados divulgados pela Fuvest a partir dos questionários socioeconômicos preenchidos pelos inscritos e matriculados desde 2007, quando o programa foi adotado, até o concurso no ano de 2015.

Escola pública

Desde 2007, o número de alunos matriculados que concluíram o ensino médio integralmente em escolas públicas representa apenas 27% do total de matriculados no período. Os alunos egressos de escola particular ainda são mais da metade (68%), o que demonstra que, apesar de ter adotado um programa de ação afirmativa cujo principal objetivo era incluir estudantes da rede pública, o vestibular da USP ainda beneficia uma maioria de alunos oriundos de escolas particulares.

Diferentemente de outras universidades (especialmente as federais), a USP não adota o critério de renda para selecionar os estudantes da rede pública de ensino que poderão ser beneficiados com o bônus do Inclusp. Sem tal critério, são beneficiados alunos com renda familiar superior a 15 salários mínimos. Isso contribuiu para que a presença de alunos de rendas média e alta continue sendo superior na universidade.

De acordo com os pesquisadores, a maior parte dos matriculados tem renda familiar entre três e cinco salários mínimos. E há alunos beneficiados pelo Inclusp com renda familiar superior a 15 salários mínimos. No vestibular para ingresso no ano de 2015, 74 alunos beneficiados declararam renda familiar entre 15 e 20 salários mínimos, enquanto 66 declararam possuir renda familiar superior a 20 salários mínimos.

Isso demonstra que o critério adotado pela USP permite que alunos de alta renda tenham um benefício a mais no vestibular tão-somente porque estudaram em escola pública. Para os pesquisadores, caso a USP adotasse o critério de renda juntamente com o critério da escola pública, o bônus poderia permitir maior ingresso de alunos carentes de escolas públicas. E se adotasse a modalidade de cotas, a inclusão racial e social seria muito mais eficaz e veloz.

Além disso, a USP poderia adotar critérios adicionais para a seleção de alunos oriundos de escola pública, como o critério de renda familiar, de modo a evitar que alunos cuja família possui alta renda sejam beneficiados tão somente por estudar em escolas públicas.

Desproporcional

A composição do corpo discente da USP é desproporcional à composição racial do estado de São Paulo, principalmente no que se refere aos alunos pretos, pardos e amarelos. De acordo com dados do IBGE, no Censo de 2010, 63,9% dos habitantes paulistas se declararam brancos, 29,1% pardos, 5,5% pretos, 1,4% amarelos e 0,1% indígenas. No caso da USP, os percentuais de pretos e pardos são inferiores e os percentuais de brancos e amarelos são superiores à média estadual.

Conforme o estudo, se a USP seguisse a composição racial média do país, o percentual de pretos e pardos estaria muito aquém do esperado, uma vez que a população brasileira é majoritariamente parda ou preta (55,2%).

Outra constatação é que no período em que o programa beneficiava apenas alunos egressos de escola pública, sem o bônus racial, os percentuais de pretos e pardos pouco oscilou e manteve-se na casa dos 2% e 10%, respectivamente.

A partir do vestibular para ingresso no ano de 2014, com a instituição do bônus adicional para alunos da rede pública de ensino autodeclarados pretos, pardos ou indígenas, o percentual de pretos e pardos tem um crescimento mais significativo, mas ainda insuficiente.

O número de alunos desse grupo é baixo também em Medicina, Engenharia Civil (São Carlos) e Publicidade e Propaganda – os três cursos mais concorridos. Em Medicina, apenas quatro alunos declarados pretos e 30 pardos se matricularam em 2015 (1,33% e 10% do total de alunos matriculados). No mesmo ano, o número de brancos matriculado correspondia a 78%. Em 2013, nenhum aluno matriculado no curso se declarou preto e só 7% se declararam pardos. Em compensação, 77% eram brancos e 15,5% eram amarelos. Havia apenas um aluno indígena.

Desde a sua criação, o Inclusp adotou como critério para concessão do bônus o ensino médio cursado integralmente em escola pública (municipal, estadual ou federal). Além disso, uma das metas do Plano Institucional aprovado em 4 de julho de 2013 é que, até 2018, metade dos alunos matriculados em cada curso e em cada turno tenham estudado integralmente em escolas públicas de ensino médio. Porém, até o vestibular de 2015, o número desses alunos representava apenas 27% do total de matriculados no período. Os egressos de escola particular ainda são mais da metade (68%).

No vestibular de 2015, apenas 19% dos alunos matriculados em Medicina cursaram integralmente o ensino médio em escolas públicas. Em Engenharia Civil, o percentual era de 25%, e em Publicidade e Propaganda, 38,77%. A análise dos dados desses cursos nos últimos dois vestibulares, desde a aprovação do Plano de Metas, indica que, em comparação com 2014, em 2015 houve queda no número de alunos egressos de escolas públicas matriculados em Medicina e Engenharia Civil. E que a maioria dos alunos ainda é oriunda de escola particular.