Fim da URSS

O fracasso do mundo pós-soviético

Com a implosão da experiência socialista, governos conservadores se viram livres para desmontar direitos trabalhistas conquistados durante o período de existência da URSS

Pixabay/Reprodução
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Monumento Operário e Mulher Kolkosiana feito pela escultora soviética Vera Mukhina em 1937

No dia 26 de dezembro de 1991 deixava de existir a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). O capitalismo fora vitorioso, ao menos provisoriamente, na batalha iniciada em 1917, quando os bolcheviques chegaram ao poder a bordo de uma revolução que mudaria o mundo.

O colapso soviético, nos últimos trinta anos, foi decisivo para a consolidação da fase neoliberal do sistema capitalista. O desaparecimento do campo político, econômico e militar que media força com o bloco liderado pelos Estados Unidos provocaria realinhamentos profundos na geopolítica mundial e na vida interna das sociedades.

A restauração da economia de mercado, nos primeiros momentos, afetou prioritariamente os povos do leste europeu, desmontando mecanismos de proteção social. Os novos Estados oligárquicos-burgueses foram tragados pela concentração de renda e riqueza, acompanhada pela precarização de direitos e o empobrecimento das classes trabalhadoras. Ainda que setores médios emergentes tenham se beneficiado de maior abertura econômica, essas nações voltaram a ser abocanhadas pelas principais potências imperialistas, sequiosas por ampliar mercados, exportar plantas industriais e ter acesso à mão-de-obra mais barata. 

A implosão da experiência socialista, carcomida por erros e contradições, inibiu a resistência contra o ressurgimento capitalista. Tornou-se avassaladora a hegemonia das ideias liberais, com promessas de democracia e prosperidade. Sequer a reconstrução da Rússia, sob o nacionalismo de Putin, alterou esse cenário, com evidentes sinais de degeneração, como os emitidos pela ascensão do neofascismo na Polônia, Hungria e Ucrânia.

Mas os reflexos do desaparecimento da URSS se estenderiam também ao Ocidente. Sem a ameaça de um sistema que, no pós-guerra, forçou o capitalismo à concessão de amplos benefícios aos trabalhadores dos países centrais, governos conservadores se viram de mãos livres para começar o desmonte dessas conquistas. A socialdemocracia europeia aceleraria sua adesão ao neoliberalismo, desprovida da condição de muro reformista para contenção do avanço soviético.

A esmagadora maioria dos partidos comunistas ou revolucionários foi demolida, desorganizando o movimento operário e sindical, já acossado por mudanças tecnológicas. Boa parte dessas organizações e lideranças capitulou à ideia de que a história chegara ao fim, com a perenidade do capitalismo, restringindo seu próprio papel à contenção de danos mais dolorosos.


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A onda de retrocesso atingiria com maior impacto as nações periféricas, condenadas a uma divisão internacional do trabalho na qual deveriam aceitar sua função de provedora agroextrativista. Sem a URSS, a lógica neocolonial adquiriu inédita desenvoltura.

Excluída a China da contabilidade, o mundo tem assistido a decadência de alguns dos principais índices sociais, inclusive nas nações desenvolvidas, como os Estados Unidos. Também se eleva o número de guerras e conflitos armados, além da degradação ambiental. 

O capitalismo, sem freios, empurra a humanidade para a barbárie. Oxalá sua crise estrutural abra nova janela histórica para que seja enterrado um sistema no qual a riqueza de 1% representa o patíbulo para todos os demais.  

(*) Este texto foi publicado originalmente no jornal Folha de S.Paulo em 25 de dezembro de 2021.

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