Europa: direita e esquerda, volver!

Em Portugal e na Alemanha, governos se mantêm, mas há crescimento de partidos

Grygor Gysi e Oskar Lafontaine, do partido A Esquerda (Die Linke) também são apontados como vitoriosos na Alemanha (Foto: Montagem Rede Brasil Atual)

No domingo 27 houve eleições nacionais, dentro do sistema parlamentarista, na Alemanha e em Portugal. Em Portugal não houve supresas: o Partido Socialista, liderado por José Sócrates, teve maior número de votos e cadeiras (36,56%), mas perdeu a maioria absoluta que teve no último período. O Partido Social-Democrata, de direita, ficou em segundo, com 29%. Mas o PS deverá poder formar um governo de coalizão com os demais partidos de esquerda, inclusive o Comunista, que perdeu cadeiras e votos, mas continua uma força política relevante no país.

Ainda que a “capital” da União Européia seja Bruxelas, na Bélgica, e o Parlamento Europeu se reúna normalmente em Estrasburgo, na França, o coração desse espaço geopolítico internacional é a Alemanha. Maior economia da macro-região, a Alemanha ocupa lugar-ponte priviliegiado entre os países do bloco ocidental e os do antigo bloco comunista, inclusive a Rússia. Assim, é também um termômetro sensível às mudanças políticas e ideológicas que percorrem a superfície ou os subterrâneos da “Velha” e… da “Nova” Europa.

Nessas eleições, o resultado é um convite à prospecção e à reflexão. Numa visada superficial, o resultado é o de que “a direita ganhou”. É verdade, de certo modo. Os conservadores CDU e CSU (União Democrata Cristã e União Social-Cristã da Baviera) ficaram com 239 (33,8%) cadeiras do novo parlamaneto, e Angela Markel continuará como chanceler (primeira-ministra). O FDP, de pensamento ultra-liberal, uma espécie de mistura de PFL com a direita do PSDB, cresceu de 9,8% para 14,56%, ficando com 93 cadeiras. Este resultado definiu que o novo governo será uma coalizão dos três, CDU/CSU – FDP) substituindo a “grande coalizão” do CDU com o Partido Social Democrata (SPD) que governou o país nos últimos quatro anos.

O FDP é apontado como o “grande vencedor” das eleições. Não só porque cresceu espetacularmente, mas porque CDU e CSU, forças peso-pesadas da política alemã e bávara, perderam cadeiras. Assim espera-se que o líder do FDP, Guido Westerwelle, ocupe a pasta de Relações Exteriores, uma posição forte no governo alemão, e que passe, em grande parte, a dar as tintas nas novas políticas econômicas. Estas, com algumas oscilações, penderão para a direita: menos investimento em educação pública, ensino superior pago onde ainda não seja, menos impostos com evidente favorecimento dos ricos, novas reduções na seguridade social, mais privatizações, enfim, tudo aquilo que a gente conheceu durante os governos do PSDB/PFL.

Quem assumiu uma posição de mais força nesse campo foi o novo partido “A Esquerda” (Die Linke), que ganhou 22 cadeiras, passando para 76 (11,89%). Seus líderes, Oskar Lafontaine (ex-SPD) e Gregor Gysi (da ex-Alemanha Oriental) também são apontados como “grandes vencedores” na eleição

Os social-democratas afundaram em suas contradições. Perderam 76 cadeiras no parlamento, passando para 146 (23,04%). Mais: perderam a condição de liderar “de facto” (olha a expressão da moda!) a oposição, que passam a integrar. Quem assumiu uma posição de mais força nesse campo foi o novo partido “A Esquerda” (Die Linke), que ganhou 22 cadeiras, passando para 76 (11,89%). Seus líderes, Oskar Lafontaine (ex-SPD) e Gregor Gysi (da ex-Alemanha Oriental) também são apontados como “grandes vencedores” na eleição, pois em pouco tempo tornaram o partido uma força visível no espectro das cores políticas. Além disso, enquanto o SPD só foi o primeiro votado na cidade-estado de Bremen, a Linke foi a mais votada nos estados de Brandemburgo e Saxe-Anhalt, ambos no leste alemão, além de passarem a ser a segunda força no estado de Macklemburgo.

A Linke foi reforçada tanto por suas posições firmes na defesa de políticas sociais mais amplas, como a da adoção de um salário mínimo maior e redução da idade de aposentadoria de 67 para 65 anos, quanto por sua oposição clara à presença do Exército Alemão no Afeganistão, ainda mais depois do desastre do 6 de setembro, quando, por ordem do comandante alemão na região de Kunduz a aviação norte-americana bombardeou um aglomerado de civis. Hesitantes nessa matéria, tendo apoiado anteso envio das tropas, o Partido Verde pagou o preço dessa contradição com os ideais pacifistas que sempre apregoou.

O Partido Verde também cresceu, ganhando 17 cadeiras, indo para 68 (10,7%). Mas agora está diante de um dilema. Como um partido “temático”, voltado para o meio-ambiente e temas conexos, o PV alemão atraiu uma parte do eleitorado de esquerda, uma parte de um eleitorado jovem que acha essa distinção irrelevante e uma parte do eleitorado liberal, que gosta de se definir como “ilustrado” e “moderno”. Agora os Verdes, como são chamados (die Grünen) terão de se definir. Não deverão integrar o novo governo CDU/CSU – FDP, porque isso destruiria a sua credibilidade; ao mesmo tempo, junto com o destroçado e minguado SPD e a reforçada Linke, terão de decidir se integram uma nova e hipotética frente de centro-esquerda na oposição.

Mas o mais curioso a observar é a situação da capital, Berlim. Em toda a antiga Berlim Ocidental, tradicional reduto do SPD e dos Verdes, a CDU ganhou. O Partido Verde ganhou no distrito de Friedrichshain/Kreuzberg/Prenzlauerberg Ost (Leste), que reúne regiões das duas antigas Berlim, e ainda no de Mitte, que era do Leste. Para estes distritos mudaram-se recentemente uma grande quantidade de estudantes universitários, tradicional reduto Verde. Em todo o restante da antiga Berlim Oriental a Linke venceu, ora por margem apertada, ora grande.

Quer dizer, aponta a análise: o antigo muro (ver reportagem no próximo número da Revista do Brasil) continua de pé. Resta saber com que significado, pois certamente o quadro político mudou.