PL tóxico

Governo Leite quer liberar entrada de agrotóxicos perigosos no RS

PL apresentado pelo governador Eduardo Leite (PSDB) altera lei em vigor no estado desde 1982, proibindo agrotóxicos perigosos à saúde e ao meio ambiente

Filipi Castilhos/RS
Filipi Castilhos/RS
Causadores de diversas doenças graves, os agrotóxicos gozam de benefícios fiscais que beiram a isenção total

São Paulo – Está para ser votado na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul projeto de lei que autoriza a entrada no estado de agrotóxicos perigosos, que tenham sido banidos em outros países. De autoria do governador Eduardo Leite (PSDB), o Projeto de Lei (PL) 260/2020, enviado ao Legislativo no final de novembro e que tramita em regime de urgência, altera a Lei 7.747 de 22 de dezembro de 1982, das mais avançadas no país na proteção à saúde e meio ambiente.

Pela lei atualmente em vigor, só serão admitidos, em território estadual, a distribuição e comercialização de produtos agrotóxicos e biocidas já registrados no órgão federal competente (Anvisa) e que, se resultantes de importação, tenham uso autorizado no país de origem.

Na prática, proíbe a utilização no Rio Grande do Sul de substâncias banidas em seus países de origem de importação. Um fabricante que tiver seus ingredientes ativos banidos no seu país de origem não poderá ter esses produtos vendidos aos agricultores gaúchos. A medida, que deveria ser seguida pelos outros estados brasileiros e não modificada, faria com que grandes empresas, como a Bayer e Basf, não viessem vender no Brasil o que não podem vender na Alemanha e, por extensão, União Europeia.

Quase mil agrotóxicos

Para driblar a medida protetiva, porém, Eduardo Leite propõe em seu PL 260 que só serão admitidas, em território estadual, a distribuição e comercialização de produtos agrotóxicos e biocidas, seus componentes e afins, já registrados no órgão federal competente e que sejam cadastrados, respectivamente, nos órgãos estaduais competentes. Basta os produtos serem registrados na Anvisa.

A Anvisa bolsonarista já liberou 945 agrotóxicos desde janeiro de 2019, quando o governo de Jair Bolsonaro tomou posse. Não é à toa. A deputada ruralista Tereza Cristina (DEM-MS), que ganhou o apelido de Musa do Veneno, chefia desde então Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Em 2018, ela tratorou e aprovou o Pacote do Veneno na comissão especial que presidia, apesar de toda a pressão nacional e internacional. O pacote, que praticamente revoga a atual lei dos agrotóxicos, não foi a plenário pelo temor de uma derrota. Mas o governo vem liberando todos os agrotóxicos. Outras medidas que alteravam regras para análise foram adotadas, mas derrubadas no SupremoTribunal Federal.

Alvo de ataques

Não é de hoje que a lei que protege o RS dos agrotóxicos perigosos é alvo de ataques. O partido Democratas (DEM), aliado dos ruralistas e do agronegócio, indústrias de veneno inclusive, questiona a constitucionalidade da legislação no Supremo Tribunal Federal (STF). A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 221, que tem apoio do setor, está em análise pelo relator Dias Toffoli.

O Conselho Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul encabeçou manifesto contra o PL de Eduardo Leite que tem a assinatura de 189 entidades, como conselhos estaduais, frente parlamentar, fóruns, associações, entidades de classe, agricultores familiares, universidades, pesquisadores, especialistas, ambientalistas e movimentos sociais.

“Por entendermos que a Lei Estadual nº 7.747/82, fruto de amplos e profundos estudos, pesquisas e debates com diversos setores sociais após grande desastre ambiental em decorrência de resíduos de agrotóxicos no rio Guaíba, é referência nacional, colocando o Rio Grande do Sul como pioneiro no controle, cadastro e procedimentos em relação aos agrotóxicos, a eventual aprovação do PL n. 260/2020 seria um enorme retrocesso ao estado, que já sofre com as consequências do uso excessivo de agrotóxicos, impactando diretamente na saúde, no meio ambiente e na qualidade e produção dos alimentos”, diz trecho do manifesto.

No Rio Grande do Sul, câncer mata mais do que doenças cardiovasculares.