Alerta

Exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas preocupa indígenas e especialistas

Eventual vazamento na região poria em risco mangues, recifes e campos alagados. Projeto opõe setores do governo federal. Na COP27, Lula defendeu transição energética

Foto: Ronaldo F.F./Greenpeace
Foto: Ronaldo F.F./Greenpeace

São Paulo – Povos indígenas, geólogos e ambientalistas estão muito preocupados com os impactos ambientais associados à exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas. Um projeto em andamento da Petrobras pretende perfurar um poço a 159 quilômetros da região de Oiapoque, no extremo norte da costa do Brasil.

Segundo o coordenador do Conselho de Caciques dos Povos Indígenas do Oiapoque, Edmilson dos Santos Oliveira, do povo Karipuna, o sentimento é de angústia e insegurança. Efeitos da atividade petrolífera, como vazamentos, poderão ser extremamente nocivos aos mangues e campos alagados onde estão três terras indígenas e dois parques nacionais considerados área de proteção ambiental.

“A projeção que foi feita pela Petrobras não mostra a mancha de óleo vinda para a terra indígena. Só mostra indo para o lado francês (área marítima pertencente à Guiana Francesa). E isso é inacreditável, porque a gente sabe que, a partir do momento que a maré dobrar, a maré encher, essa corrente vai vir em direção aos rios e vai entrar. Para nós, a preocupação é muito grande, porque nossos rios são cheios de várzeas, muitos açaizais de onde a gente tira o sustento, muitos lagos. Caso aconteça um acidente, a gente vai perder muita coisa”, disse a liderança indígena à plataforma Sumaúma. “Tudo isso é nossa vida. Sem o rio, a gente não existe.”

O cacique refere-se a um dos itens mais polêmicos do processo de licenciamento ambiental da Petrobras para esse poço em curso no Ibama. Não é prevista a chegada de mancha de óleo à costa do Oiapoque em caso de um eventual derramamento de óleo. Os estudos levam em consideração apenas a força da corrente Norte do Brasil, que tende a levar o óleo para o mar da Guiana Francesa, do Suriname e da Guiana e assim chegando às ilhas do Caribe, como Martinica, Trinidad e Tobago e Granada. Uma possibilidade com consequências igualmente graves.

Exploração de petróleo ameaça banco de corais

Está em risco também uma concentração de bancos de esponjas e corais de águas profundas localizada a 200 quilômetros dali. Descrito pela primeira vez em 2016, esse grande sistema de recifes ainda não tem suas dimensões calculadas pelos cientistas. Os prejuízos para a vida costeira seriam incalculáveis em caso de contaminação por vazamento de óleo. Segundo a organização WWF Brasil, a combinação do estuário amazônico com o grande sistema de recifes amazônicos resultam na grande quantidade de peixes na região.

Em março passado, 28 organizações ambientais e indígenas ingressaram com representação na Procuradorias da República no Pará e no Amapá. Elas pedem providências em relação a pontos do processo de licenciamento. No documento, mencionam um trabalho de pesquisadores do Instituto de Estudos Costeiros da Universidade Federal do Pará (UFPA) que aponta cinco fragilidades na modelagem de 2015.

“A Petrobras deveria usar as áreas que já estão abertas, e não ficar investindo em novas explorações em áreas ecologicamente frágeis”, disse à Sumaúma Suely Araújo, especialista em políticas públicas do Observatório do Clima, que considera uma tragédia qualquer vazamento de petróleo na foz do Amazonas.

Problemas no licenciamento ambiental

Ela lembrou a tentativa de licitação de poços de petróleo de Abrolhos, na Bahia, e no Atol das Rocas, perto de Fernando de Noronha, no governo Bolsonaro. “A foz do Amazonas é uma região não estudada, ninguém sabe na verdade o que tem ali de biodiversidade. É única no mundo com essas características, com a quantidade de sedimentos que vêm do rio. O que tem lá de verdade? Tem indícios, mas não sabemos”, disse a especialista.

Segundo a Petrobras, mesmo sob a nova gestão de Jean Paul Prates, indicado por Lula, está mantido o projeto de exploração naquela área. Isso porque a exploração de novas reservas é essencial para a manutenção dos negócios em petróleo e gás. Mesmo num panorama de transição energética, que naturalmente conduzirá à priorização de fontes de energia limpa.

Além disso, a empresa afirma que essas atividades de exploração e produção são realizadas sob protocolos rigorosos de responsabilidade social e ambiental. E em linha com o Planejamento Estratégico da companhia, submetidos ao controle externo dos órgãos fiscalizadores.

Lula defendeu na COP27 transição para energia sustentável

No entanto, o Ministério do Meio Ambiente e da Mudança do Clima, em nota conjunta com o Ibama, afirma que há problemas no licenciamento ambiental. Logo após a sua eleição, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou, na COP27, no Egito, que seu governo trabalhará pela transição para fontes de energia sustentáveis.

A busca por petróleo na região tem inspiração na Guiana, vizinho à Venezuela. Ali a petrolífera estadunidense ExxonMobil encontrou grandes jazidas a partir de 2015. No Suriname foram encontradas reservas, menores, enquanto na Guiana Francesa, perfurações nada encontraram. E na foz do Amazonas não foi encontrado petróleo em perfurações anteriores em águas mais rasas. Em 2011, a Petrobras abandonou um poço na região. Isso foi após uma sonda ter sido levada pela correnteza. quando tentava achar petróleo a 110 quilômetros do litoral de Oiapoque.