Mais um caso

Polícia investiga morte de indígena no Maranhão; familiares suspeitam de envenenamento

Há Sarapó Kapor denunciava invasões e ameaças de madeireiros, mineradoras e garimpeiros. Relatos apontam que a liderança já havia sido vítima de ataques

Guarda de Autodefesa Ka’apor/Divulgação
Guarda de Autodefesa Ka’apor/Divulgação
Sarapó Kapor era dirigente da Guarda de Autodefesa dos Ka'apor (foto) na Terra Indígena Alto Turiaçu, na amazônia maranhense, e uma das principais lideranças indígenas do estado

São Paulo – A Polícia Civil do Maranhão investiga a morte de Sarapó Kapor, que veio a óbito no dia 13 de maio, no município de Centro Guilherme, no Maranhão, a cerca de 289 quilômetros de São Luís. Ele era dirigente da Guarda de Autodefesa dos Ka’apor na Terra Indígena Alto Turiaçu, na amazônia maranhense, e uma das principais lideranças indígenas do estado. 

A comunidade denuncia que, mesmo sem a realização de um exame cadavérico, a morte de Sarapó foi atribuída a um Acidente Vascular Cerebral (AVC). Enquanto pessoas que eram próximas ao líder indígenas suspeitam que ele tenha sido vítima de envenenamento. De acordo com familiares, no dia de sua morte, Sarapó teria passado mal após comer um peixe que havia recebido de presente de um morador do povoado. Ele veio a óbito horas depois de consumir o alimento. 

A suspeita de que a liderança tenha sido envenenada se deve à atuação do indígena. Há anos ele denunciava as invasões de madeireiros, mineradoras e garimpeiros ao território. O que levanta os indícios de que ele tenha sido envenenado por inimigos, segundo a família. Os relatos apontam que, antes de morrer, Sarapó havia sido ameaçado e chegou a ser vítima de um ataque a tiros. Somado a isso, estão relatos de que, após óbito, indivíduos suspeitos passaram a rondar a entrada da aldeia, onde o líder vivia, como forma de intimidação.

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Indígenas exigem exumação

A desconfiança motivou um pedido dos indígenas do povo Ka’apor pela exumação do corpo que, segundo eles, demorou para ser atendido pela Polícia Civil. Para o coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) no Maranhão, – uma das entidades que acompanha o caso –, Gilderlan Rodrigues, a demora no procedimento de exumação é “mais uma forma de omitir os assassinatos que ameaçam o povo Ka’apor”.

“A gente pode entende que há um processo de esconder os assassinatos que têm acontecido na região. Os indígenas denunciam que os assassinatos têm sido colocados como ‘mortes naturais’. Então se se confirma mais um assassinato, para as autoridades isso não vai soar muito bem. Por isso essa demora em fazer esse procedimento, ao nosso ver para esconder mais um assassinato contra o povo Ka’apor”, comenta Rodrigues.

Sarapó não foi o primeiro indígena do povo Ka’apor vítima de ataques. Em 2020, Kwaxipuru Ka’apor, de 32 anos, foi encontrado sem vida na mesma região. As lideranças acreditam que a morte tenha sido uma vingança de traficantes de drogas após uma plantação de maconha ter sido destruída durante uma ronda realizada pelos indígenas. Em 2010, Hubinet Ka’apor foi assassinado a pauladas por moradores do Centro de Guilherme. Segundo os indígenas, o caso foi mais um resultado do clima de tensão e conflito causado por madeireiros e plantadores de maconha. 

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Cobrança por justiça

Um ano depois, em 2011, outro indígena, Tazirã Ka’apor foi assassinado pelo caminhão madeireiro. Além da perda de um guerreiro do povo Ka’apor, a morte de Sarapó também representa a “continuidade dos ataques contra as lideranças e a impunidade dos criminosos”, comenta o coordenador do Cimi. 

“Sarapó era uma liderança muito importante para o povo, era aquele que organizava o povo para fazer a fiscalização no território e que também tinha muito respeito entre o povo. Ele estava na linha de frente e acompanhava as lutas dentro do território. A morte dele significa uma perda muito grande para a luta do povo e a continuidade dos assassinatos dessas lideranças por conta da impunidade que está instalada na região pelo fato de nenhum assassino de indígenas, até o momento, ter sido julgado. Então eles se sentem muito a vontade para cometer os crimes. É preciso que essa situação mude, que se esclareça (os crimes) e os responsáveis pelos assassinatos sejam punidos”, cobrou Rodrigues.

O processo de perícia do corpo de Sarapó Ka’apor ainda não terminou. Um primeiro laudo foi divulgado, mas não houve nenhuma conclusão. Um segundo exame é aguardado pelos indígenas e pela Polícia Civil que dará continuidade às investigações.

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