Estudo revela que laranjais podem ser irrigados com esgoto doméstico tratado

A pesquisa inédita, realizada em Piracicaba, constatou também a presença de nutrientes essenciais para o desenvolvimento da planta na água reciclada. Além de beneficiar o meio ambiente, a técnica reduz gastos com fertilizantes

Resultados poderiam ser confirmados em laranjais de outras regiões (Foto: Ivan Vicencio/Sxc.hu)

Pela primeira vez no Brasil foi possível experimentar cientificamente o uso de esgoto tratado na irrigação de pés de laranja. O resultado não podia ser melhor: as plantas se desenvolveram normalmente e o solo não sofreu alterações.

“O bom desenvolvimento se deve principalmente a nutrientes como o nitrogênio, fósforo, potássio, cálcio, magnésio, zinco e boro, todos presentes no efluente doméstico e essenciais para as culturas agrícolas”, diz o tecnólogo e saneamento ambiental Marcos Schaaf Teixeira da Silva. Em seu mestrado na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP), de Piracicaba, ele realizou o estudo.  “Com isso, é possível reduzir gastos com fertilizantes que trazem esses minerais”.

O estudo, com duração de um ano, começou em setembro de 2007. Durante esse tempo, Silva monitorou cerca de 300 pés de laranja plantados em uma área experimental de 7.200 metros quadrados, pertencente à universidade. A lavoura foi irrigada com o esgoto proveniente da estação de tratamento de Piracicamirim, localizada perto da área experimental.

Para ser usado, o efluente passou primeiro por uma peneira rotativa e por uma caixa de areia aerada, para retirada de partículas sólidas grosseiras. Em seguida, por um reator que degrada cerca de 70% da matéria orgânica e, na sequência, por meio de bombas, levado aos reservatórios. O processo inclui a ação de raios ultravioletas, que eliminam organismos que podem causar doenças. “Depois de tratado, o esgoto torna-se uma água limpa, mas não potável”, explica o pesquisador.

Durante o experimento, ele e seus colegas observaram que o efluente usado na irrigação apresentou características desejáveis, como baixas concentrações de cálcio, magnésio, sódio, potássio, alumínio e baixa condutividade elétrica. “Essas baixas concentrações praticamente não alteram as propriedades químicas e físicas do solo”, diz Marcos, que ressalta que o sódio é um dos grandes vilões da agricultura. E como o efluente se mostrou ligeiramente alcalino, também pode ajudar a equilibrar a acidez do solo.

Para o pesquisador, os bons resultados poderiam ser confirmados em laranjais de outras regiões. Como ele explica, atualmente há muitos exemplos de utilização de esgoto tratado na agricultura – que responde por 70% de toda a água consumida no planeta. Há pomares irrigados dessa maneira em diversas regiões e climas, como nos Estados Unidos, Israel, Alemanha, México e em outras partes do mundo. “O uso do esgoto tratado como fonte de nutrientes e água para as lavouras eleva a eficiência na utilização da água no setor agrícola e reduz o déficit hídrico em certas regiões, permitindo que mesmo em regiões secas seja possível plantar e colher”.

Embora a pesquisa tenha se limitado a avaliar o efeito do efluente residencial, Silva acredita que o esgoto industrial tratado também poderia ser usado com resultado semelhante. Porém, o reuso de águas provenientes de processos industriais deve ser respaldado por um tratamento capaz de garantir padrões de qualidade que o permitam na agricultura, o que depende ainda de outros estudos.