Cine PE

Divergência política faz autores deixarem festival de cinema

Sete produções foram retiradas após inclusão de filmes sobre o Plano Real e filósofo conservador. Historiador avalia que evento poderia ter sido usado para protestar contra o governo Temer

Divulgação

Cena do documentário O Jardim das Aflições, sobre o filósofo Olavo de Carvalho, um dos filmes que motivou o protesto de cineastas contra o Cine PE

São Paulo – Tradicional festival de cinema, neste ano em sua 21ª edição, o Cine PE, previsto para os dias 23 a 29 de maio, está suspenso. Sete diretores decidiram retirar seus trabalhos, afirmando que a programação do evento “favorece um discurso partidário alinhado à direita conservadora e grupos que compactuaram e financiaram o golpe ao Estado democrático de direito ocorrido no Brasil em 2016″, conforme afirmam em carta aberta. A atitude se deu pela inclusão do filme Real – O Plano por Trás da História, que trata do Plano Real, de 1994, e do documentário O Jardim das Aflições, sobre o filósofo Olavo de Carvalho.

Os autores da carta, divulgada no dia 10, afirmam só ter tido conhecimento da grade completa do festival pernambucano dois dias antes, discordando de alguns dos filmes. “Para nós, isso deixa claro o posicionamento desta edição, ao qual não queremos estar atrelados”, afirmam. “Reconhecemos a importância do Cine PE Festival Audiovisual, do qual muitos de nós já participaram em edições anteriores. Esperamos poder participar de edições futuras e mais conscientes, condizentes com sua grandeza histórica e relevância para a formação de público do cinema brasileiro.”

Assinam a mensagem os responsáveis pelos filmes A Menina Só (curta dirigido por Cíntia Domit Bittar, de Santa Catarina), Abissal (curta de Arthur Leite, do Ceará), Baunilha (Leo Tabosa, de Pernambuco), Iluminadas (Gabi Saegesser, de Pernambuco), Não me Prometa Nada (Eva Randolph, do Rio de Janeiro), O Silêncio da Noite é que tem sido Testemunha das Minhas Amarguras (o único longa, de Petrônio Lorena, de Pernambuco) e Vênus – Filó, a fadinha lésbica (de Sávio Leite, de Minas Gerais). 

A atitude provocou reações favoráveis e contrárias, como a do documentarista e historiador Cleonildo Cruz (autor de documentário sobre a Operação Condor), para quem a decisão foi antidemocrática. “A intolerância política-cultural chegou para ficar nesses tempos obscuros que estamos vivendo. Intolerância, sim. E por parte de quem não a deveria praticar.” Para ele, houve “um desserviço intelectual a todos e todas que estão no enfrentamento do governo Temer, que vem sistematicamente retirando os direitos da classe trabalhadora”. O protesto poderia ter sido feito no próprio espaço do festival, mas não contra quaisquer filmes – seria “um belo ato político contra o estado de exceção que estamos vivenciando, contra a criminalização dos movimentos sociais, contra a destruição da democracia no Brasil”.

O Cine PE deste ano tinha homenagens previstas para os atores Rodrigo Santoro e Cássia Kiss, além do diretor Luiz Joaquim.