Antirracismo

‘Empresas devem adotar ações afirmativas pela equidade racial. Sem elas, não há mudanças’

Advogado e diretor executivo do Ceert alerta para a importância de mudanças na cultura organizacional de empresas que alimentam práticas excludentes e mantêm privilégio branco. Poder público também precisa atuar na promoção de leis e políticas públicas

Arquivo EBC
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São Paulo – Em entrevista ao Jornal Brasil Atual nesta quinta-feira (18), o advogado e diretor executivo do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), Daniel Teixeira, destacou a importância das empresas e instituições no Brasil adotarem medidas de ações afirmativas visando a equidade social como condição de mudança para combater a desigualdade racial que exclui pessoas negras do mercado de trabalho. As taxas de desemprego e informalidade nessa população, historicamente superiores às taxas dos brancos, ficaram ainda mais nítidas com a pandemia de covid-19.

Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE mostram que, no primeiro trimestre de 2021, a taxa de desemprego por cor ou raça ficou abaixo da média nacional para os brancos, que atingiu 11,9%. Enquanto ficou acima para negros, com 18,6%, e pardos, 16,9%.

“Na verdade, quando os relatórios com os indicadores sociais saem, a gente está discutindo sintomas de um mesmo patógeno, que é o racismo. Um sistema de opressão que cria, recria e retroalimenta essas desigualdades ao longo do tempo quando a gente não tem medidas de ação afirmativa, de equidade racial, para fazer a correção necessária dessas desigualdades também nas instituições que são empregadoras”, aponta. “Com a pandemia, tivemos uma maior incidência tanto de letalidade, quanto de formas mais agravadas da doença (do coronavírus). E tivemos isso na população negra em função do racismo, que é estrutural. As desigualdades também ressaltam mais nesses momentos”, explica Teixeira. 

Prejuízos na ascensão

Sem mudanças estruturais, essas desigualdades ressaltadas por Daniel Teixeira também se reproduzem mesmo quando a pessoa negra está empregada, prejudicando também sua ascensão funcional. Na carreira do Direito, o Censo Jurídico de 2018 mostra, por exemplo, que a população negra representa menos de 1% do corpo jurídico de grandes escritórios. A pesquisa também aponta que até 11% dos funcionários brancos nas bancas são sócios. Mas não há uma quantidade significativa de sócios nem advogados sênior, pleno ou mesmo júnior em relação a funcionários negros. A maioria é mais representativa na função de estagiários (9%).

Nesta semana da Consciência Negra, Pesquisa Racial da Imprensa Brasileira, divulgada nesta quarta (17), também aponta para o racismo dentro das redações. Entre jornalistas pretos ou pardos, 98% afirmam que o desenvolvimento da carreira profissional é mais difícil do que para profissionais da imprensa brancos.

O diretor executivo do Ceert avalia que é preciso uma mudança na cultura empresarial. Principalmente diante da tendência de indicações de pessoas para cargos qualificados, que acaba multiplicando um único perfil de profissionais brancos. 

“É como o Einstein definiu o conceito de insanidade, você faz sempre a mesma coisa e tenta ter um resultado diferente. Isso não vai acontecer. É necessário ter medidas que modifiquem essa cultura organizacional e essas práticas que são excludentes e que alimentam empresas monocromáticas, de uma cor só, com apenas pessoas brancas, para que a gente tenha refletido nas empresas e escritórios a população brasileira. Isso que é o correto, mas para isso é preciso eliminar mecanismos de racismo institucional que estão funcionando ativamente e cotidianamente nas empresas”, adverte Teixeira. 

Políticas antirracistas

O advogado ressalta a importância de pessoas brancas quebrarem com a sua hegemonia nos postos de trabalho, adotando como uma postura antirracista a indicação de profissionais negros. Assim como ações que o poder público também deve adotar para a inclusão no mercado de trabalho. 

“Ainda falta muita efetividade seja do ponto de vista do poder público, com políticas públicas e leis, seja do ponto de vista empresarial, com iniciativas e programas próprios no sentido de responder essa demanda que a sociedade vem pautando cada vez mais. A população negra não aceita mais ficar de fora de um projeto de desenvolvimento socioeconômico. E as empresas têm um papel, obrigação e responsabilidade de reduzir as desigualdades sociais tal como previsto na Constituição Federal”, finaliza Daniel Teixeira. 

Confira a reportagem

Redação: Clara Assunção