Necropolítica paulista

São Paulo tem 66% de cobertura vacinal da covid, bem abaixo da meta de 90%. Internações crescem

Governador Tarcísio de Freitas segue a cartilha negacionista de seu ex-chefe e coloca estado em risco, com aumento de casos e alta nas internações

Alan Santos/PR
Alan Santos/PR
Governador Tarcísio com Bolsonaro, seu padrinho políltico, que deve mais de R$ 1 milhão em multas

São Paulo – O estado de São Paulo está bem abaixo da meta de 90% estabelecida pelo Ministério da Saúde para a cobertura vacinal da covid-19. No estado mais rico da federação, a taxa de habitantes com o ciclo completo de imunização está em torno de 66%. O índice é preocupante. “Para certos grupos etários, como crianças com idades entre 5 e 11 anos, uma dose de reforço seria suficiente. No entanto, para pessoas com 40-59 anos, seriam necessárias 2 doses de reforço, uma monovalente e outra bivalente e assim por diante”, disse à RBA o epidemiologista Jesem Orellana, da Fiocruz Amazônia, que calculou a taxa vacinal paulista a partir de informações oficiais da própria Secretaria estadual de Saúde.

A taxa de cobertura insatisfatória explica o aumento de casos de covid-19 entre a população paulista. E também no número de internações, uma vez que as vacinas protegem contra as complicações que o novo coronavírus e suas variações causam ao organismo. Segundo a Info Tracker, plataforma desenvolvida pela Universidade de São Paulo (USP) e pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), o número de pacientes internados no estado com suspeita da doença, aumentou 27,6% em 14 dias. Em 19 de setembro eram 702, e em 3 de outubro, data da última atualização, já eram 896.

InfoGripe reitera tendência de crescimento de covid-19

Além desse banco de dados, Boletim InfoGripe da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), divulgado nesta quarta-feira (11), reitera a tendência de crescimento do número de novos casos semanais de síndromes respiratórias agudas graves (SRAG) associadas à covid-19 na região centro-sul, especialmente o território paulista. Tanto que o coordenador do InfoGripe, Marcelo Gomes, reforçou seu apelo à população para manter a vacinação da covid-19 em dia. “Mantemos a nossa convocação para a vacinação. É fundamental que a população esteja vacinada de acordo com as doses especificadas para cada faixa etária”, afirmou em nota.

O município de Itavepa, na região metropolitana de Sorocaba, no interior paulista, já sente na pele esse aumento. Tanto que ontem (10) a prefeitura divulgou comunicado de alerta sobre o aumento de 318% nos casos da doença somente neste mês. Em setembro foram 48, e até ontem foram registrados 201 casos.

Por isso, a Secretaria de Saúde local orientou o retorno do uso de máscaras e a higienização das mãos com álcool, água e sabão. Especialmente antes de tocar os olhos, nariz e boca. E também de se distanciar de pessoas com fatores de risco para complicações. Ou seja, proteger imunossuprimidos, idosos, gestantes e pessoas com diversas comorbidades.

Baixa cobertura vacinal e alta letalidade

Segundo o Censo 2022 do IBGE, São Paulo tem 44.420.459 habitantes, o que corresponde a 21% dos brasileiros. No entanto, o estado concentra quase 26% do número de mortes pela covid. Segundo dados atualizados do Ministério da Saúde, o novo coronavírus já matou 706.142 pessoas no Brasil, sendo 181.387 paulistas. Tanto é assim que o estado tem taxa de letalidade de 2,7%, bem maior que a do Brasil, que é 1,9%.

Fonte: Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo

Apesar do aumento de casos e de internação e dos apelos de técnicos pela vacinação, o governador bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos) se mantém coerente à sua campanha. Durante entrevistas quando disputava o governo, era evasivo quando perguntado sobre obrigação de vacinação. Mas em 15 de fevereiro expôs seu lado bolsonarista raiz ao sancionar o fim da exigência do comprovante de vacinação contra a covid-19 no estado.

Passados oito meses, mesmo com o recrudescimento da disseminação da doença e das internações no estado, Tarcísio se mantém avesso à prevenção. Enquanto o Ministério da Saúde destaca em seu site a tarja do Movimento Nacional pela Vacinação, na página oficial da pasta paulista a palavra “vacina” é coisa que não existe. Pelo menos, até a conclusão desta reportagem.

Satélite do bolsonarismo negacionista

“O governador Tarcísio é uma espécie de satélite do bolsonarismo negacionista. Portanto, o fato de não incentivar e de não somar na luta contra a desinformação de forma contundente é suficiente para o seu eleitor. No melhor dos casos, está se omitindo de um dever crucial do gestor estadual máximo. Esta postura é horrenda e irresponsável, especialmente no atual e preocupante cenário da vacinação com a dose de reforço”, avalia o epidemiologista Jesem Orellana.

O negacionismo perverso de Tarcísio, com sérios impactos à saúde pública, vai além da covid. Em 18 de setembro, ele vetou um projeto de lei que tinha como principal objetivo a prevenção do HPV no estado: a vacinação de crianças e adolescentes contra o vírus HPV nas escolas. A imunização previne o câncer de colo de útero. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), é o terceiro mais comum entre as mulheres e o quarto em mortalidade.