Fiocruz alerta

Brasil registra 85,5 mil novos casos de covid em 24 horas. Alta aponta para cenário ainda mais sombrio

Coronavírus leva de 10 a 15 dias para manifestar sua agressividade total e aumento progressivo dos casos deverá ser acompanhado das mortes a partir da próxima semana, alerta Fiocruz

Marcelo Seabra / Ag.Pará
Marcelo Seabra / Ag.Pará
Enquanto o cenário se agrava no país, a vacinação segue em passos lerdos. O governo Bolsonaro, que nunca escondeu seu desdém com o vírus, segue em sua sanha de atrapalhar o combate ao coronavírus

São Paulo – O Brasil registrou nesta sexta (14), um dos dias com número mais elevado de novos casos registrados de covid em um período de 24 horas. Foram 85.536 infectados notificados, totalizando 15.519.525 desde o início do surto, em março do ano passado. Também hoje, o país lamenta mais 2.211 mortes causadas pelo novo coronavírus, o que ele a 432.628 brasileiros vítimas da infecção. As informações são do relatório do dia do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass).

O número alto de casos registrados hoje confirma a tendência observada nas duas últimas semanas de maior descontrole da pandemia. Enquanto a média de mortes segue abaixo das 2 mil mortes diárias (1.931 a cada um dos últimos sete dias), sobe o número de contaminados. A média diária de novos casos, igualmente calculada em sete dias, está em ascensão desde o dia 26 de abril. Hoje é de 62.439. Considerando que a covid leva de 10 a 15 dias para se manifestar em toda a sua agressividade, a projeção é de que, já na próxima semana, o número de mortes começará novamente a aumentar.

A redução constante nas mortes, observada desde o dia 12 de abril, teve relação direta com as medidas de isolamento social adotadas por estados e municípios, com mais intensidade no mês de março. Entretanto, de forma precoce e falha, segundo cientistas, as medidas protetivas foram sendo abandonadas, conforme o número de óbitos foi diminuindo, ainda que apresentando números elevados.

Números da covid-19 no Brasil. Fonte: Conass

RBA utiliza informações fornecidas pelas secretarias estaduais, por meio do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass). Eventualmente, elas podem divergir do informado pelo consórcio da imprensa comercial. Isso em função do horário em que os dados são repassados pelos estados aos veículos. As divergências, para mais ou para menos, são sempre ajustadas após a atualização dos dados.


Cenário de caos

Embora parte dos cientistas se negue a falar em terceira onda, já que a média de mortes ainda é considerada altíssima, em torno das 2 mil diárias. No entanto, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) já vem alertando para o iminente – e trágico – aumento expressivo das mortes por covid em breve no Brasil. “Uma terceira onda pode representar uma crise sanitária ainda mais grave do que vimos”, aponta a entidade.

A confirmar a tendência de que a pandemia se tornará mais grave do que foi visto em março, é quase certo o colapso completo do sistema hospitalar brasileiro. Muitas cidades nem sequer conseguiram ainda superar a amplitude da crise daquele mês, já que sete capitais encontram-se com ocupação de UTIs acima de 90%: Porto Velho (92%), Teresina (96%), Natal (92%), Aracaju (99%), Rio de Janeiro (93%), Curitiba (92%) e Goiânia (92%).

Outro ponto de cuidado é o surgimento de novas mutações do vírus. Sabe-se que o vírus circulando sem controle é receita para novas cepas, como a desenvolvida em Manaus ainda no ano passado, ou na Índia neste ano. Diante disso, a Fiocruz, em boletim extraordinário sobre a covid-19, pede pelo retorno urgente de medidas de isolamento social.

“Uma nova explosão de casos de Covid-19 (terceira onda) a partir do patamar epidêmico atual, que permanece elevado, será catastrófico. São mais de 420 mil mortes. Grande parte da população brasileira já vivenciou a perda de um familiar, um amigo, um vizinho ou um colega de trabalho. Ainda não se tem dimensão da extensão e dos desafios que se colocam com as sequelas deixadas pela Covid-19 em pacientes graves e, mesmo com quadros moderados, das suas repercussões na qualidade de vida das pessoas e demandas que elas vão impor ao sistema de saúde em médio e longo prazos”, afirma a entidade.

Bolsonaro, aliado do vírus

Enquanto o cenário se agrava no país, a vacinação segue em passos lentos e o governo federal, em sua sanha de atrapalhar o combate à covid no Brasil. A produção da CoronaVac pelo Instituto Butantan está suspensa por falta de insumos, que vêm da China. Agora, a Fiocruz que participa na produção da vacina da AstraZeneca, anunciou a suspensão da elaboração de novas doses a partir da próxima semana. também pelo mesmo problema.

O atraso no envio dos insumos tem relação com os sucessivos ataques diplomáticos do presidente Bolsonaro àquele país. No dia 5 de maio, Bolsonaro chegou a dizer que o vírus seria parte de “uma guerra química” promovida propositalmente pela China. Além de não corresponder à verdade, um vírus seria parte de uma guerra biológica e não química.

Agora, o diretor-presidente do Instituto Butantan, Dimas Covas, responsável pela produção da CoronaVac, acusa o governo federal de prejudicar a vacinação dos brasileiros. “Embora a Embaixada da China no Brasil venha dizendo que não há esse tipo de problema, a nossa sensação, de quem está na ponta, é que existe dificuldade. Uma burocracia que está sendo mais lenta que o habitual e autorizações com volumes cada vez mais reduzidos. Isso obviamente tem impacto, essas declarações têm impacto e nós ficamos à mercê dessa situação”, disse o cientista, em coletiva nesta semana.

Dimas aponta que Bolsonaro tem trabalhado incessantemente contra a vacinação, com suas declarações irresponsáveis. Além de já ter negado por diferentes ocasiões, como ficou claro na CPI da Covid, a possibilidade de compra de imunizantes da Pfizer. “Pode faltar (vacina)? Pode faltar, e aí nós temos que debitar isso principalmente ao nosso governo federal, que tem remado contra”, completou Dimas.