Mesmo com admissão de falta de provas, STF condena Dirceu, Genoino e Delúbio

Ministra faz desagravo a José Genoino e condena Dirceu mesmo admitindo falta de evidência material; Lewandowski diz que réu será condenado pelo 'simples fato' de presidir a sigla, sem que haja prova dos crimes, e critica mídia tradicional

Os votos dos ministros Celso de Mello e Ayres Britto (ao centro) já não podem reverter a condenação de Genoino e Dirceu (Foto: Nelson Mourinho/STF)

Rio de Janeiro – O Supremo Tribunal Federal (STF) condenou hoje (9) o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, e os ex-dirigentes do PT José Genoino e Delúbio Soares pelo crime de corrupção ativa. No prosseguimento do julgamento da Ação Penal 470, mais conhecida como processo do mensalão, votaram os ministros José Antônio Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello. Ainda restam os votos dos ministros Celso de Mello e Carlos Ayres Britto, mas o placar até aqui já garante a condenação de Dirceu (seis a dois), Genoino (sete a um) e Delúbio (oito a zero).

Também já estão condenados por oito votos a zero pelo crime de corrupção ativa o empresário Marcos Valério e os réus ligados às suas empresas (Cristiano Paz, Ramon Hollerbach e Simone Vasconcelos). O ex-ministro dos Transportes, Anderson Adauto, foi absolvido por unanimidade e a ex-funcionária da empresa SMP&B, Geiza Dias, foi absolvida por sete votos a um. Outra pessoa ligada a Valério, o advogado Rogério Tolentino, foi condenado pelo placar de seis a dois.

José Genoino teve até aqui somente o voto do revisor do processo do mensalão, ministro Ricardo Lewandowski, por sua absolvição. José Dirceu foi absolvido também por Dias Toffoli, mas foi condenado pelos outros ministros que já votaram.

Ao votar, Cármen Lúcia fez um gesto de desagravo ao citar “a história pessoal” de Genoino: “O juiz, infelizmente, não julga histórias, porque as histórias às vezes são feitas de desvios que seriam impensáveis de serem praticados em outra circunstância. Não estamos julgando a história de pessoas que, em diversas ocasiões, tiveram vidas retas. A vida é como uma estrada, às vezes a gente anda mil quilômetros de maneira correta, mas, em um determinado momento, vai trocar a estação do rádio do carro e acaba causando um acidente e tendo que responder por isso. Não estou julgando as histórias, porque tenho conhecimento das histórias das pessoas que fazem o Brasil”, disse.

Sobre Delúbio, Marco Aurélio disse que, “se tivesse a desenvoltura intelectual e material a ele atribuída, provavelmente não seria apenas o tesoureiro do partido, mas, quem sabe, teria chegado a um cargo muito maior”. O ministro disse ainda que “apontar Delúbio como bode expiatório” é algo que “subestima a inteligência mediana”.

Divergência quanto a Dirceu

Seguindo na mesma linha do revisor do processo, ministro Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli afirmou que inexistem nos autos provas contra José Dirceu, a não ser a prova testemunhal do delator do mensalão, o ex-deputado Roberto Jefferson, classificado como “inimigo figadal” do ex-ministro, expressão também já utilizada pelo revisor.

Cármen Lúcia admitiu que “não há nenhum documento assinado por ele [Dirceu] que levasse à comprovação dos atos que lhe são imputados”, mas preferiu basear seu voto em outras evidências: “A partir das declarações de Delúbio Soares, e tida a sua fala, percebe-se que ele tinha respaldo. Houve as ligações de Marcos Valério e as reuniões. Seriam reuniões normais para um chefe da Casa Civil, porém foram feitas com os mesmos personagens e nas datas que coincidem com a distribuição de recursos e obtenções de vantagens”, disse.

Revisor isenta Genoino

Logo no início da sessão de hoje, Ricardo Lewandowski pediu a palavra para entregar alguns documentos aos colegas e rebater a afirmação, sustentada pelo relator Joaquim Barbosa e pelos ministros Rosa Weber e Luiz Fux nas últimas sessões, de que José Genoino teria sido avalista dos empréstimos que verteram recursos para o chamado valerioduto: “Não houve o aval conjunto de Valério e Genoino no mesmo documento. Não há assinatura conjunta no primeiro contrato”, disse.

O revisor entregou aos outros ministros cópias de um laudo, presente nos autos, atestando que os empréstimos do PT avalizados por Genoino não foram incluídos no valerioduto: “Portanto, isso não serviu para a lavagem de dinheiro e também não serviu como meio de irrigar campanhas ou para a eventual compra de votos”, disse, antes de afirmar que “Genoino está sendo denunciado e será eventualmente condenado pelo simples e objetivo fato de ter sido presidente do Partido dos Trabalhadores à época [dos fatos]”.

Lewandowski, pela primeira vez neste processo, fez queixas sobre a cobertura da mídia conservadora, que o tem colocado invariavelmente no papel de vilão por contrariar a postura condenatória adotada pela maioria do STF no julgamento do mensalão: “Estou sempre no espírito de colaborar com Vossas Excelências, jamais no espírito de contestar um colega. No final de semana prolongado, esse aspecto [a imprecisão quanto à participação de Genoino nos empréstimos] foi um pouco explorado, inclusive pela mídia, que disse que houve um erro factual de minha parte. Eu me sinto no dever de vir a público mostrar a minha versão dos fatos”, disse.

O julgamento do mensalão prosseguirá amanhã (10), com os votos dos ministros Celso de Mello e Carlos Ayres Britto.