Mais justo

Proposta barrada pela Justiça reduz IPTU para mais de um quarto da população de São Paulo

Projeto de Fernando Haddad concentra reajuste acima de 15% em 1,8 milhão que vivem em regiões centrais e pela primeira vez diferencia construções de mesmo tamanho em bairros mais e menos valorizados

Rogério Cassimiro/Folhapress

O reajuste agora se dará não apenas por conta do imóvel, mas pela região em que está construído

São Paulo – Barrado pela Justiça, o reajuste do Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) beneficiaria com redução do tributo 3,4 milhões de pessoas na capital paulista. Com o projeto, aprovado na Câmara Municipal no último dia 29 e sancionado pelo prefeito Fernando Haddad (PT), 25 dos 96 distritos teriam redução entre 0,6% e 12,1% em 2014, a maior parte deles nas zonas leste e sul da cidade, onde a infraestrutura urbana é precária e os bairros apresentam os menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH).

Outros 3,6 milhões de moradores da capital teriam reajuste de no máximo 5,7%, abaixo da estimativa de inflação oficial, em torno de 6%. Como o projeto aprovado na Câmara previa que não haveria atualização monetária pela inflação, esta parcela não teria novos reajustes até a próxima revisão da Planta Genérica de Valores, que serve de parâmetro para o cálculo do IPTU.

Nos demais casos, 1,4 milhão de habitantes, em 14 distritos, teriam reajuste entre 5% e 10%. Outros 740 mil teriam IPTU entre 10% e 15% mais caro. E 1,8 milhões, que vivem na região central da cidade, teriam aumento acima de 15%.

Os distritos de Parque do Carmo (-12,10%), Cidade Líder (-11,50%), Anhanguera (-10,00%), Vila Jacuí (-9,70%) e São Miguel (-9,10%) apresentam os maiores valores de redução no imposto. Na outra ponta estão Alto de Pinheiros (19,80%), Vila Mariana (19,80%), Sé (19,80%), República (19,70%), Jardim Paulista (19,50%) e Moema (19,50%), distritos mais ricos e centrais da cidade, que terão os reajustes maiores.

O projeto também prevê a ampliação da isenção do imposto para imóveis com valores venais até R$ 160 mil. Atualmente este valor é de até R$ 90 mil. Além disso, imóveis entre R$ 160 mil e R$ 320 mil de valor venal teriam uma escala de descontos decrescentes. Esse valores são individuais sobre os imóveis, pois consideram o tipo de construção em que a pessoa vive — casa ou prédio, número de cômodos, área edificada. Logo, um imóvel pequeno em uma região valorizada pode ter um reajuste inferior à média local.

Outra inovação do projeto é a aplicação de valores diferenciados para construções semelhantes em cada uma das três zonas fiscais. Uma casa de quatro cômodos no bairro do Campo Belo, área nobre da cidade onde o metro quadrado custa R$ 8,5 mil, em média, não vai mais ter o mesmo valor para o cálculo do IPTU que uma casa de igual tamanho na Vila São José, a 20 quilômetro do centro da capital. Antes elas eram taxadas da mesma forma.

Os aposentados também receberam uma escala maior de isenções, com três faixas de descontos. Aposentados que recebem até três salários mínimos continuam isentos. Os que recebem entre três e quatro teriam descontos de 50%. E os que recebem de quatro a cinco mínimos teriam abatimentos de 30% no tributo devido.

Na quinta-feira (7), Haddad sancionou uma lei que isenta de IPTU os terrenos destinados ao Minha Casa, Minha Vida e ao Programa de Arrendamento Residencial, adquiridos pelo Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) e pelo Fundo de Desenvolvimento Social (FDS). Atualmente, há 1.502 unidades habitacionais concluídas na cidade e outras 11 mil em obras. Segundo o prefeito, a medida pretende incentivar a construção de habitações de interesse social para a população de baixa renda.

A Revisão da Planta Genérica atualiza os valores venais dos imóveis (VVI), bastante inferiores aos valores de mercado, com base na valorização imobiliária e em outros critérios de desenvolvimento ou degradação de uma região, em um determinado período. No caso atual, os valores estão reajustados com ano-base em 2009, quando a planta vigente foi sancionada pelo então prefeito Gilberto Kassab (PSD, 2006-2012). Na época, o reajuste do IPTU chegou a 80% em alguns casos, com tetos anuais de 30% para residenciais e 45% para comerciais.

De janeiro de 2009 a outubro deste ano, houve valorização de 169,5% no mercado imobiliário na cidade de São Paulo, segundo o índice da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) em parceria com a ZAP Imóveis. O reajuste médio na cidade chega a 10,7% para imóveis residenciais — com teto de até 20% de reajuste para 2014 e 10% nos anos seguintes — e 31% para comerciais — com teto de até 35% de reajuste para 2014 e 20% nos anos seguintes.

Em 2017 haverá nova revisão, que deve considerar os mesmo critérios, podendo haver redução para quem hoje teve aumento e vice-versa.

O IPTU não tem destinação específica — a arrecadação vai para o Tesouro Municipal, que pode ser utilizado no financiamento de obras, pagamento de dívidas ou remuneração de servidores —, portanto, a redução dele nos bairros periféricos não causaria, necessariamente, uma queda do investimento na região.

Batalha Judicial

A prefeitura entrou ontem (8) com recurso contra a liminar que suspendeu o reajuste do IPTU, concedida na última terça-feira (5). Na véspera a prefeitura teve negado um pedido de agravo, quando se solicita a reconsideração da decisão ao próprio juiz que a proferiu. A ação que pediu a suspensão foi impetrada pelo promotor de Habitação e Urbanismo do Ministério Público do Estado de São Paulo, Maurício Ribeiro Lopes, que entendeu que houve desrespeito à participação popular e ao regimento interno da Câmara, na votação do dia 29.

O prefeito da capital se deu conta de que há um monopólio de informação que prejudica o debateO promotor questionou a realização da votação na noite da terça-feira (29), quando havia o anúncio dela para o dia 30, inclusive com a realização de uma audiência pública na Comissão de Política Urbana da Câmara na manhã do mesmo dia. O projeto não estava na ordem do dia da sessão extraordinária em que foi votado. O Diário Oficial do Município do dia 30 foi publicado com o Projeto de Lei 711, de 2013 — o reajuste do IPTU, na pauta de votações de uma das sessões extraordinárias daquela tarde.

O texto chegou a ser sancionado pelo prefeito no mesmo dia (5) em que a liminar foi concedida, mas a Justiça entendeu que a ilegalidade ocorrida na votação afeta todo o processo, e suspendeu também a sanção.

Haddad afirmou que há uma campanha de desinformação e terrorismo sobre o IPTU. “O povo vai compreender na hora que chegar o carnê (do IPTU) o senso de justiça do projeto que foi aprovado pela Câmara, apesar da desinformação, do terrorismo que foi feito esse tempo todo. Mas a consistência do projeto se impõe, porque nós temos um rumo para a cidade”, disse.

Entidades do setor empresarial também ameaçam ir à Justiça contra o reajuste do IPTU, mas aguardam resultado da briga entre executivo e Ministério Público. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a Federação do Comércio (Fecomercio) e o Sebrae afirmam que o reajuste é abusivo e vai causar a saída de empresas da cidade. Associações de moradores de bairros nobres, como a AME Jardins, também ameaçam recorrer aos tribunais.