Crise republicana

Operação Métis é suspensa, mas conflito entre poderes está longe de acabar

Presidentes do Executivo, Legislativo e do Judiciário se encontram hoje pela primeira vez, depois de polêmica. Renan interpôs ações contra juízes, que também representaram contra o senador

EBC

Renan chamou juiz, publicamente, de ‘juizeco’. Cármen Lúcia pediu ‘mais respeito para com o Judiciário’

Brasília – Mesmo com a suspensão da Operação Métis, da Polícia Federal, ontem (27), pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o clima de animosidade entre o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), e representantes do Judiciário está longe de acabar e, em torno disso, a discussão sobre a competência dos três poderes da República. Uma definição sobre o quanto cabe a interferência externa em cada um destes poderes, retomada depois da polêmica sobre a investigação da PF feita no Senado oito dias atrás, continua sendo motivo de contradições e dúvidas entre parlamentares, magistrados, políticos diversos e operadores de Direito.

Embora o ministro do STF Teori Zavascki tenha emitido solicitação de receber todos os documentos da operação da primeira instância da Justiça Federal, pouco tempo antes já havia sido protocolada ação impetrada pelo Senado junto à Corte, pedindo para que seja avaliada a interferência do Judiciário sobre o Legislativo numa ação da PF. O fogo cerrado não para por aí.

Enquanto a assessoria jurídica do Senado interpôs a ação junto ao STF, também entrou com uma representação no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra o juiz federal Vallisney Souza Oliveira, que autorizou a entrada ostensiva de viaturas de policiais federais no Senado para prender servidores e apreender equipamentos, no último dia 21. Por outro lado, um grupo de juízes dos estados de Minas Gerais, Pernambuco, Goiás, São Paulo e Mato Grosso do Sul deu entrada formal de uma representação contra Renan no Senado, por quebra de decoro, pelo fato de ele ter chamado o juiz, publicamente, de “juizeco” e por ter, segundo eles, afrontado a magistratura federal.

Além disso, continuam intensas as articulações de bastidores para a formação da próxima composição do CNJ, que tem na disputa à indicação a conselheiros pela Câmara e pelo Senado, nomes de confiança de Renan. Caso venha a ser bem sucedido nesta articulação, o presidente do Senado terá aliados justamente dentro do colegiado do órgão de controle do Judiciário, com poder de voto para contestar decisões da presidenta do STF e do CNJ, ministra Cármen Lúcia – que, ao saber das críticas de Renan, pediu (embora sem citar nomes), “mais respeito para com o Judiciário”.

Diante de tanta confusão, não há certeza até agora, se o encontro que está programado para se realizar às 11h entre Michel Temer, Cármen Lúcia e Renan selará um acordo de paz, já que o encontro foi articulado como forma de os representantes dos três poderes se entenderem melhor – oficialmente, a agenda diz que os três vão discutir um plano de segurança pública para o país.

Decisão de Zavascki

Para completar a embrulhada, a decisão de Zavascki da tarde de ontem passou a impressão inicial de que o ministro tinha, implicitamente, apoiado os senadores. Na verdade, o ministro determinou a suspensão do inquérito policial para que toda a peça jurídica seja remetida ao STF, não em atendimento aos senadores, mas ao pedido de liminar feito pela defesa de um dos servidores preso na operação (e já liberado): Antônio Tavares dos Santos Neto.

Na liminar, os advogados de Santos Neto alegam que houve usurpação de competência por parte do juiz da 10ª Vara Federal, responsável por autorizar a operação. Ao passo que, no caso do pedido feito ontem por Renan ao STF, o documento cita, entre outros itens, o que chama de “várias violações institucionais à Casa nos últimos meses”, como os pedidos e decretação de prisões dos senadores e realizações de busca e apreensão em apartamentos funcionais.

O problema é que Zavascki ao mesmo tempo em que suspendeu a operação, destacou em seu texto que, embora o juiz da primeira instância não tenha se referido à participação dos senadores nos fatos investigados, ele entende que os documentos apresentados “indicam inafastável participação de parlamentares nos atos”, já que, explicou, a polícia do Senado está subordinada à mesa diretora da Casa e, por isso, é obrigada a obedecer a ordens e solicitações de senadores.

Com a forma como elaborou sua decisão, Zavascki deixou Renan em situação difícil: assim que soube que a Operação Métis estava suspensa, sem ter claro o conteúdo do texto integral da peça jurídica, declarou para jornalistas que “a decisão fala por si”.

Pouco tempo depois, o presidente do Senado divulgou uma nota oficial, na qual tentou consertar a embrulhada. Renan elogiou a posição do ministro de modo mais formal e destacou que “o funcionamento harmônico das instituições é a única garantia do Estado Democrático de Direito”. Mas, pelos desencontros dos últimos dias, a animosidade na resposta da ministra Cármen Lúcia a Renan e a própria posição do presidente do Senado, a expectativa é de que este ambiente de tensão continue.