Mau começo confirmado

Manobra da base de Tarcísio viola até Estatuto do Idoso para barrar CPI do caso Paraisópolis

Base de Tarcísio de Freitas formou fila para entrega de pedidos três dias antes e evitou pedidos de investigação pelo PT e PCdoB

GovSP/Divulgação - PTnaAlesp
GovSP/Divulgação - PTnaAlesp
Funcionários de gabinetes parlamentares de apoio a Tarcísio de Freitas formam fila três dias antes da abertura "oficial" e garantem semestre sem desgastes para o governador

São Paulo – A estratégia de dar início à fila de entrega dos pedidos de CPI na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) com três dias de antecedência surtiu o efeito desejado pela base do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos), que garantiu nesta sexta-feira (24) a implementação das primeiras Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) da nova legislatura. A manobra, ao menos em tese, livra o governador de ser investigado em temas sensíveis pela bancada de oposição na Casa nos próximos meses. Também as gestões tucanas de Rodrigo Garcia e João Doria, apoiadores da candidatura do atual governador, não serão incomodadas.

Desde a manhã de terça-feira (21), assessores parlamentares dos partidos de apoio ao governo já formavam a fila para o registro dos pedidos de comissões. Os funcionários dos gabinetes passaram os dias se revezando, em turnos de até oito horas, e receberam até pizzas e refrigerantes durante as madrugadas.

A oposição acusa a presidência da Assembleia de privilegiar a bancada governista sobre como seriam protocolados os pedidos. Isso porque a fila começou a ser formada um dia antes do ato normativo informando sobre os protocolos físicos para as CPIs ser divulgado no Diário Oficial, na última quarta-feira (22).

“Nos dias 24 e 27 de março de 2023, excepcionalmente, a apresentação de proposições de autoria parlamentar e ofícios legislativos far-se-á exclusivamente em via impressa”, diz o ato assinado pelo presidente da Casa, André do Prado, do mesmo partido do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Desordem calculada

O motivo da disputa por um lugar na mesa de registros é que somente cinco colegiados podem funcionar simultaneamente na Alesp, e as comissões são abertas por ordem de chegada.

No início do ano, a direção da Assembleia paulista informou que toda a tramitação de CPIs seria digital, pelo sistema “Alesp sem Papel”. Porém, o sistema da Casa ainda não havia sido aberto na nova legislatura, supostamente para que os parlamentares recém-chegados pudessem conhecer melhor a ferramenta. A oposição aguardava a reabertura do sistema, o que não ocorreu, e sem que tivesse sido informada.

A Federação Brasil da Esperança, formada pelo PT e pelo PCdoB, além da Liderança da Minorias, entrou na Justiça para suspender a fila. Sem acordo para conseguir registrar qualquer pedido de investigação neste primeiro dia de registros, a oposição viu os governistas emplacarem todas as cinco comissões disponíveis para os próximos seis meses.

Veja a lista dos primeiros protocolos registrados na Alesp:

  • CPI da Enel, de autoria de Thiago Auricchio (PL) – pretende apurar problemas no serviço de energia elétrica na Grande São Paulo;
  • CPI do Pix, de Itamar Borges (MDB) – busca investigar golpes por meio da transferência via Pix e também esquemas de clonagem de cartão;
  • CPI da Transição de Gênero, de Gil Diniz (PL) – sobre procedimentos de transição de gênero em menores de idade no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP);
  • CPI dos Deslizamentos de Terra, de Fabiana Barroso (PL) – voltada para apurar políticas públicas para prevenir deslizamentos de terra em encostas e morros;
  • CPI da Epidemia de Crack, de Paulo Correia Júnior (PSD) – para investigar aumento de dependentes químicos na região da chamada Cracolândia, no centro da capital. Também quer apurar razões para a formação de “cracolândias” em outras cidades do estado,

As demais CPIs protocoladas hoje foram, pela ordem:

  • Lojas Americanas
  • Pedofilia
  • Santas Casas
  • Empresas de comunicação
  • Aumento dos moradores de rua
  • Vazamento dos dados cadastrais de consumidores
  • Descarte de lixo contaminante
  • Questões impactantes do meio ambiente
  • Pirâmides financeiras
  • Lixões

Suplicy na ponta

Um princípio de tumulto ocorreu pouco antes da abertura do guichê para a entrada dos pedidos de CPI na Alesp, após o deputado Eduardo Suplicy (PT), de 81 anos, usar o Estatuto do Idoso para pedir para ser o primeiro a apresentar requerimento por causa de sua idade. Deputados da base de Tarcísio, que estavam guardando lugar no corredor desde terça, acusaram a oposição de tentar “furar a fila”. Depois de algum empurra-empurra e protestos, o parlamentar da oposição não conseguiu seu objetivo.

A CPI que Suplicy queria instaurar tinha o objetivo de investigar tiroteio ocorrido durante passagem da campanha de Tarcísio pela favela de Paraisópolis, zona sul da capital paulista, no ano passado. O episódio resultou em um homem morto e está envolto em suspeitas de assassinato deliberado pela segurança do então candidato.

O requerimento recebeu 32 assinaturas, mas quando a bancada do PT enfim conseguiu protocolar o requerimento do veterano deputado, a Mesa já havia registrado pelo menos outros 30 pedidos de CPI. A bancada do PT promete acionar a Justiça para garantir a investigação.

Bancada do PT registra pedido de investigação de tiroteio durante campanha de Tarcísio de Freitas em Paraisópolis, no ano passado. Manobra governista é objeto de ação judicial