Manobra da base de Tarcísio viola até Estatuto do Idoso para barrar CPI do caso Paraisópolis
Base de Tarcísio de Freitas formou fila para entrega de pedidos três dias antes e evitou pedidos de investigação pelo PT e PCdoB
Publicado 24/03/2023 - 15h39
São Paulo – A estratégia de dar início à fila de entrega dos pedidos de CPI na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) com três dias de antecedência surtiu o efeito desejado pela base do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos), que garantiu nesta sexta-feira (24) a implementação das primeiras Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) da nova legislatura. A manobra, ao menos em tese, livra o governador de ser investigado em temas sensíveis pela bancada de oposição na Casa nos próximos meses. Também as gestões tucanas de Rodrigo Garcia e João Doria, apoiadores da candidatura do atual governador, não serão incomodadas.
Desde a manhã de terça-feira (21), assessores parlamentares dos partidos de apoio ao governo já formavam a fila para o registro dos pedidos de comissões. Os funcionários dos gabinetes passaram os dias se revezando, em turnos de até oito horas, e receberam até pizzas e refrigerantes durante as madrugadas.
A oposição acusa a presidência da Assembleia de privilegiar a bancada governista sobre como seriam protocolados os pedidos. Isso porque a fila começou a ser formada um dia antes do ato normativo informando sobre os protocolos físicos para as CPIs ser divulgado no Diário Oficial, na última quarta-feira (22).
“Nos dias 24 e 27 de março de 2023, excepcionalmente, a apresentação de proposições de autoria parlamentar e ofícios legislativos far-se-á exclusivamente em via impressa”, diz o ato assinado pelo presidente da Casa, André do Prado, do mesmo partido do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Desordem calculada
O motivo da disputa por um lugar na mesa de registros é que somente cinco colegiados podem funcionar simultaneamente na Alesp, e as comissões são abertas por ordem de chegada.
No início do ano, a direção da Assembleia paulista informou que toda a tramitação de CPIs seria digital, pelo sistema “Alesp sem Papel”. Porém, o sistema da Casa ainda não havia sido aberto na nova legislatura, supostamente para que os parlamentares recém-chegados pudessem conhecer melhor a ferramenta. A oposição aguardava a reabertura do sistema, o que não ocorreu, e sem que tivesse sido informada.
A Federação Brasil da Esperança, formada pelo PT e pelo PCdoB, além da Liderança da Minorias, entrou na Justiça para suspender a fila. Sem acordo para conseguir registrar qualquer pedido de investigação neste primeiro dia de registros, a oposição viu os governistas emplacarem todas as cinco comissões disponíveis para os próximos seis meses.
Veja a lista dos primeiros protocolos registrados na Alesp:
- CPI da Enel, de autoria de Thiago Auricchio (PL) – pretende apurar problemas no serviço de energia elétrica na Grande São Paulo;
- CPI do Pix, de Itamar Borges (MDB) – busca investigar golpes por meio da transferência via Pix e também esquemas de clonagem de cartão;
- CPI da Transição de Gênero, de Gil Diniz (PL) – sobre procedimentos de transição de gênero em menores de idade no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP);
- CPI dos Deslizamentos de Terra, de Fabiana Barroso (PL) – voltada para apurar políticas públicas para prevenir deslizamentos de terra em encostas e morros;
- CPI da Epidemia de Crack, de Paulo Correia Júnior (PSD) – para investigar aumento de dependentes químicos na região da chamada Cracolândia, no centro da capital. Também quer apurar razões para a formação de “cracolândias” em outras cidades do estado,
As demais CPIs protocoladas hoje foram, pela ordem:
- Lojas Americanas
- Pedofilia
- Santas Casas
- Empresas de comunicação
- Aumento dos moradores de rua
- Vazamento dos dados cadastrais de consumidores
- Descarte de lixo contaminante
- Questões impactantes do meio ambiente
- Pirâmides financeiras
- Lixões
Suplicy na ponta
Um princípio de tumulto ocorreu pouco antes da abertura do guichê para a entrada dos pedidos de CPI na Alesp, após o deputado Eduardo Suplicy (PT), de 81 anos, usar o Estatuto do Idoso para pedir para ser o primeiro a apresentar requerimento por causa de sua idade. Deputados da base de Tarcísio, que estavam guardando lugar no corredor desde terça, acusaram a oposição de tentar “furar a fila”. Depois de algum empurra-empurra e protestos, o parlamentar da oposição não conseguiu seu objetivo.
A CPI que Suplicy queria instaurar tinha o objetivo de investigar tiroteio ocorrido durante passagem da campanha de Tarcísio pela favela de Paraisópolis, zona sul da capital paulista, no ano passado. O episódio resultou em um homem morto e está envolto em suspeitas de assassinato deliberado pela segurança do então candidato.
O requerimento recebeu 32 assinaturas, mas quando a bancada do PT enfim conseguiu protocolar o requerimento do veterano deputado, a Mesa já havia registrado pelo menos outros 30 pedidos de CPI. A bancada do PT promete acionar a Justiça para garantir a investigação.