Alianças nacionais diminuem coesão de coligações ao Legislativo

Pesquisa mostra que nas eleições de 2002 e 2006, quando valeu a regra da verticalização, coalizões misturaram partidos de ideologias diferentes

São Paulo – O comportamento das coligações eleitorais especialmente para o Congresso Nacional é o alvo da pesquisa “Alianças Eleitorais: Casamento com Prazo de Validade”, da jornalista e escritora Aline Machado. Para ela, a regra da verticalização, em vigor em 2002 e 2006, obrigando os partidos a manterem alianças em todas as esferas em disputa no pleito, diminuiu a coesão ideológica. Isso porque foi feita uma opção pragmática para as disputas no lugar de afinidade programática ou de ideias.

A medida vigorou por decisão do Judiciário, mas foi driblada a partir do pleito de 2010 porque a legislação eleitoral foi alterada ainda em 2006 pelo Congresso Nacional. O cenário, porém, é de dificuldades de sobrevivência para partidos pequenos, que precisam ficar a reboque das legendas maiores.

Foi feito um levantamento quantitativo e qualitativo de todas as coligações eleitorais formadas para presidente, governador e deputado federal desde a primeira eleição após a ditadura até 2006. As conclusões do estudo compõem livro que será lançado nesta quarta-feira (7), em Brasília. Aline, PhD em ciência política, contou à Rede Brasil Atual detalhes da publicação e de sua pesquisa iniciada há 10 anos. O livro pode ser a primeira obra brasileira a investigar em profundidade a formação de coligações nas eleições a diferentes cargos. A ideologia – ou a falta dela – nas alianças entre os partidos é um dos temas principais do livro, que também traz uma análise a respeito da interligação existente entre as campanhas ao Legislativo e Executivo.

Aline relata ainda o verdadeiro significado dos partidos chamados de nanicos, e todo o interesse por trás de suas criações. “São partidos efêmeros, criados por políticos que têm ambições muito locais, e realmente não estão interessados por política,ou por reconhecimento nacional”, dispara a jornalista, que concluiu sua tese de mestrado na Florida International University (FIU), nos Estados Unidos.

Confira abaixo a íntegra da entrevista.

Como foi feita a pesquisa para o livro?
O livro é um levantamento quantitativo e qualitativo de todas as coligações eleitorais formadas para presidente, governador e deputado federal desde a primeira eleição após o retorno à democracia até a eleição de 2006. A minha pesquisa começou em 2001, quando iniciei a coleta de dados para o mestrado na Universidade de Brasília (UnB). Nesse tempo levantei dados junto ao Setor de Informação da Câmara dos Deputados e no Tribunal Superior Eleitoral.

O seu livro traz uma pesquisa quantitativa sobre ideologias no Brasil?
Sim, classifico todos os partidos de acordo com uma escala ideológica, que varia do um a dez, para dizer se um partido é mais à esquerda, de centro, ou direta. A partir dessa classificação, eu faço uma média de todos os partidos dentro de uma coligação e vejo como fica essa média em comparação a todas as outras coligações. Com isso, eu consigo dizer se uma coligação é mais ou menos consistente ideologicamente.

Qual o resultado pôde tirar desse levantamento?
Eu pude observar que durante a verticalização – decisão judicial ocorrida nas eleições de 2002 e 2006 que restringiu as possibilidades de coligação diferentes das presidenciais – as alianças deixaram de ser ideologicamente consistentes e ficaram menos consistentes se comparadas às alianças dos anos anteriores.

Por que razão?
Como os partidos tiveram menos legendas com as quais podiam se coligar, menos opções, e ainda assim eles precisavam das alianças para obter os votos, os partidos acabaram se coligando com partidos mais distantes de sua ideologia original.

Qual a relação entre as eleições para governador e para deputados federais? Por que estudá-las em conjunto?
De acordo com os modelos estatísticos, os partidos nanicos precisam lançar candidatos a governador sozinhos para promover o nome da legenda, ter alguns segundos no horário eleitoral, e assim dar alguma visibilidade aos seus candidatos a deputados federais, para se alcançar o coeficiente eleitoral e, consequentemente, algumas vagas.

Então fica impossível uma análise independente das candidaturas ao Executivo e Legislativo no estado?
Sim, não há como fazer essa análise independente. As negociações e acordos são interligados, os resultados são muito interconectados, existe sempre essa compensação. Um partido quando fecha uma coligação para o estado precisa ficar de olho, porque se ele ganha de um lado, ele pode perder de outro, esse é mais um dos achados que estão no livro.

O Brasil tem 29 partidos registrados na Justiça Eleitoral, mas quatro partidos detêm da metade das cadeiras da Câmara, por exemplo. Como explicar a existência de tantos partidos pequenos?
São partidos efêmeros, criados por políticos que têm ambições muito locais, e realmente não estão interessados por política, ou por reconhecimento nacional. Eles vislumbram uma política no curto prazo, é uma estratégia, uma conveniência eleitoral para ganhar uma eleição específica.

Nesse cenário, a sra. é favorável ou contrária ao fim das coligações proporcionais, um dos temas da reforma política?

Muitos partidos médios ou pequenos não conseguiriam as cadeiras que possuem se não houvessem as coligações, devido à fórmula D’hont – que consiste na ideia de que a cada cadeira que o partido grande consegue, ele ganha outra, portanto, favorecendo essas grandes legendas. Então, pela ótica da proporcionalidade, as coligações são benéficas para o sistema proporcional. Eu defendo a manutenção das coligações proporcionais por essa ótica.

O sistema de eleição é outra polêmica central em discussão no Legislativo. Como a sra. vê esse aspecto?
A reforma deveria ser feita no sentido de fechar a lista. Com a adoção da lista fechada, dentro da coligação, cada partido elegeria os candidatos referentes aos votos no próprio partido. Hoje, com a lista aberta, vários partidos se juntam, conseguem votos, atingem o coeficiente eleitoral, e dentro da coligação se elege aquele mais votado, independendo do partido que ele pertença. A lista fechada corrigiria isso.

A lista fechada não perpetuaria os chamados caciques nos mandatos?
Na minha visão, caciquismo sempre existiu e sempre vai existir. A lista fechada reforçaria a autoridade do partido. Para você ser um dos cabeças da lista, precisaria ter uma história no partido. Ela combateria a migração de votos dentro das coligações, além colocar fim aos partidos de aluguel.