Voz contra o massacre

Israel pune coletivamente palestinos, afirma Silvio Almeida ao cobrar atuação da ONU contra apartheid em Gaza

Ministro dos Direitos Humanos discursou na abertura de reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, nesta segunda, onde instou Israel a cumprir decisões da Corte de Haia para evitar genocídio na Palestina

Ruy Conde/Ascom/MDHC
Ruy Conde/Ascom/MDHC
O ministro defendeu a criação de um Estado Palestino livre e soberano como "condição imprescindível para a paz"

São Paulo – O ministro de Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida, repudiou na Organização das Nações Unidas (ONU), nesta segunda-feira (26), a “flagrante desproporcionalidade do uso da força” por parte do governo de Benjamin Netanyahu, a quem acusou de promover “punição coletiva” contra palestinos em Gaza. O discurso foi realizado na abertura de sessão do Conselho de Direitos Humanos, em Genebra, onde o ministro fez uma fala ponderada, condenando os ataques do Hamas e as ações de Israel, e instando as Nações Unidas a reagir para evitar um genocídio.

“Em mais de uma oportunidade, condenamos os ataques perpetrados pelo Hamas contra cidadãos israelenses e demandamos a libertação imediata e incondicional de todos os reféns. Também reitero nosso repúdio à flagrante desproporcionalidade do uso da força por parte do governo de Israel, uma espécie de ‘punição coletiva’, que já ceifou a vida de quase 30 mil palestinos – a maioria deles, mulheres e crianças –, forçadamente deslocou mais de 80% da população de Gaza, e deixou milhares de civis sem acesso a energia elétrica, água potável, alimentos e assistência humanitária básica”, denunciou Silvio.

Alinhado à posição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ministro defendeu a criação de um Estado Palestino livre e soberano como “condição imprescindível para a paz”. Silvio Almeida também lembrou da denúncia do Brasil na Corte Internacional de Justiça, em Haia. Na semana passada, a representação do governo brasileiro chamou atenção para os atos ilegais de Israel de “anexação” da Palestina.

Palestina livre

Segundo as Nações Unidas, apenas na Cisjordânia, um dos territórios palestinos descontinuados, há 300 colônias ilegais, onde vivem 700 mil israelenses. Além disso, a organização calcula que, desde 2010, cerca de 13 mil crianças palestinas já foram detidas, interrogadas, processadas e presas pelas forças de ocupação israelenses, entre outras violações de direitos humanos. Em sua fala, o ministro citou o neocolonialismo e o apartheid para destacar que as ocupações e violações do governo Netanyahu “não podem ser aceitas ou normalizadas pela comunidade internacional”.

“Consideramos ser dever deste Conselho prestigiar a autodeterminação dos povos, a busca da solução pacífica dos conflitos e se opor de forma veemente a toda forma de neocolonialismo e de Apartheid”, disse Almeida. “Ao celebrarmos a iniciativa da África do Sul de acionar a Corte Internacional de Justiça para proteger a população palestina, ao amparo da Convenção para a Repressão e Punição do Crime de Genocídio, instamos o Estado de Israel a cumprir integralmente as medidas emergenciais determinadas pelo tribunal no sentido de que cessem as graves violações ao direitos humanitário e impedir o cometimento das condutas tipificadas no Artigo 2º da Convenção”, completou o ministro.

De acordo com o artigo mencionado, matar membros de um grupo; causar sérios danos físicos ou mentais a membros do grupo; submeter intencionalmente o grupo a condições de vida que podem ocasionar a morte; impor medidas destinadas a impedir o nascimento de crianças no grupo e realizar a transferência forçada de crianças é considerado genocídio.

O ministro conclui, declarando que o Brasil deve se opor firmemente a toda forma de antissemitismo e islamofobia. Essa foi a primeira fala do Brasil sobre o tema após o discurso do presidente Lula, há uma semana, que foi contestado por Israel. Durante coletiva na 37ª Cúpula da União Africana, em Adis Abeba, na Etiópia, o líder brasileiro equiparou os assassinatos em série em Gaza ao Holocausto comandado por Adolf Hitler contra os judeus na Segunda Guerra Mundial. O primeiro-ministro de Israel declarou o presidente brasileiro como persona non grata. Mas Lula, no entanto, foi apoiado por autoridades e entidades.

O conflito

Também hoje o Exército israelense apresentou um plano de “evacuação” da população civil em zonas de conflito na Faixa de Gaza. O anúncio foi feito sob forte temor de um ataque terrestre israelense em Rafah, onde vivem cerca de 1,4 milhão de civis palestinos. A promessa de uma ofensiva letal vem ocorrendo apesar das pressões internacionais e das negociações em andamento para se alcançar uma nova trégua na guerra.

De acordo com informações do portal g1, o Catar sedia uma nova rodada de negociações para um cessar-fogo, com a presença de autoridades de Egito, Catar, Estados Unidos e Israel, além de representantes do movimento islamista palestino Hamas. Netanyahu já anunciou, no entanto, que o ataque só será adiado se for alcançado um cessar-fogo. Em paralelo, na Faixa de Gaza, a situação continua a piorar. De acordo com a ONU, 2,2 milhões de pessoas — grande maioria da população — enfrentam “fome extrema em massa”.

Internamente, o primeiro-ministro de Israel também vem enfrentando protestos por parte da população. No último sábado (24), milhares foram às ruas em Tel Aviv pressionar pela renúncia de Netanyahu e exigir um acordo para libertação dos reféns do Hamas em Gaza.

Brasil na ONU

No palco da ONU, Silvio Almeida também falou sobre o caminho de reconstrução de políticas públicas no Brasil, iniciado há um ano. O principal obstáculo, de acordo com o chefe da pasta, tem sido materializar os direitos humanos na vida das populações. Nesse sentido, ele defendeu uma convergência entre o debate econômico com a agenda de direitos humanos. “Sem transformações econômicas profundas que incluam a proteção do trabalhadores, a ampliação dos direitos sociais e a inclusão dos pobres no orçamento, os direitos humanos tornar-se-ão retórica vazia e o caminho para a ascensão do fascismo estará livre”, afirmou.

O ministro também chamou atenção para a agenda do país na presidência do G20, onde tem defendido reformas nos organismos internacionais. Ele criticou os países ricos pela “instrumentalização” do Conselho de Direitos Humanos como “subterfúgio moral” para que possam impor seu poder bélico e econômico. O que “apenas aprofundará a crise do multilateralismo e, o que considero mais preocupante, resultará no descrédito das instituições internacionais aos olhos de nossas populações”, advertiu.

Silvio Almeida instou a ONU a aprofundar seus trabalhos contra discursos de ódio e campanhas de desinformação. “Que, consistentemente, têm minado não apenas nossas democracias, mas a convivência pacífica no interior de nossas sociedades e entre nossos povos. Por isso, o Brasil entende ser seu dever, mas também deste Conselho, se opor firmemente a toda forma de racismo, sexismo, antissemitismo ou islamofobia”, discursou.

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Redação: Clara Assunção