Espionagem

‘Há muitas mais reportagens chegando’, diz jornalista que revelou esquema dos EUA

Glenn Greenwald conversou com parlamentares brasileiros e garantiu que possui mais de 20 mil documentos: 'Apenas uma pequena porção deles foi revelada'

José Cruz/ABr

‘Obama pune pessoas que revelam segredos mais do que qualquer governo na história dos EUA’

São Paulo – O jornalista norte-americano Glenn Greenwald disse hoje (6) aos membros das comissões de relações exteriores e defesa nacional da Câmara e do Senado, em Brasília, que “há muitas mais reportagens chegando” sobre o esquema de espionagem internacional mantido pelos Estados Unidos. Blogueiro do diário britânico The Guardian, Greenwald, que mora no Rio de Janeiro, é quem vem publicando, desde junho, as informações sigilosas da Agência de Segurança Nacional (NSA) vazadas pelo técnico de informática Edward Snowden.

“Os artigos que já publicamos são uma porção muito pequena das revelações que ainda devem ser publicadas”, disse o jornalista, que assegurou a deputados e senadores estar em posse de aproximadamente 20 mil documentos secretos – e que ainda não teve tempo de analisar todos eles. “Estamos trabalhando com muitas organizações no Brasil e no mundo todo para publicar mais documentos. É difícil falar sobre o que ainda não publiquei, mas com certeza vai ter muito mais revelações sobre a espionagem do governo dos Estados Unidos.”

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O depoimento de Greenwald trouxe poucas novidades. Uma delas é que, de acordo com o jornalista, o Brasil teria todas as condições de saber quais empresas de telecomunicação em atividade no país cooperaram – ou continuam cooperando – com a NSA. Um caminho, disse, é questionar as operadoras que têm acordos com as norte-americanas AT&T e Verizon. Greenwald observou ainda que esses acordos são públicos, e que o governo tem instrumentos para conduzir a investigação. Segundo as revelações de Snowden, os Estados Unidos só conseguiram montar seu esquema de espionagem internacional porque podem acessar diretamente o banco de dados das empresas de internet e telecom – o que é inconstitucional.

Outra informação levada por Greenwald ao Congresso brasileiro é a de que há nos Estados Unidos cerca de 70 mil pessoas envolvidas no trabalho de coleta e análise dos dados interceptados nas redes de internet e telefonia em todo o mundo. É esse contingente – aliado à evolução tecnológica do país, às legislações favoráveis e à colaboração de empresas, como explicou reportagem da RBA – que daria a Washington a imensa capacidade de acessar o conteúdo de mensagens e telefonemas de cidadãos de diversos países, e não apenas os metadados, que se referem a informações como horários e números de ligações ou endereços de e-mails.

“Os documentos que publicamos mostram que eles podem coletar o conteúdo do e-mail, uma lista de pesquisa do Google e o site que você está visitando. Até as ligações podem ser invadidas a qualquer minuto. É claro que, quando você está coletando 40 bilhões de ligações e e-mails a cada 30 dias, não pode monitorar tudo, você vai só coletar só os metadados e depois vai decidir quais ligações quer invadir”, pondera. “Esse tipo de espionagem sempre existiu entre os países. A diferença é que as novas tecnologias permitiram aos Estados Unidos fazer isso sem limites.”

Secretismo

Greenwald criticou a maneira como os Estados Unidos estão tratando as denúncias de espionagem e as reações negativas que pipocam pelos governos ao redor do mundo quando tomam conhecimento de que foram “grampeados” por Washington, como ocorreu no Brasil. Ao tomar saber da vigilância, as autoridades se escandalizaram, mas depois foram amainando seu discurso. Enquanto isso, o Departamento de Estado dos Estados Unidos tem se recusado a comentar publicamente os vazamentos, dizendo que vão tratar os “incidentes diplomáticos” pelos canais institucionais. “É um desrespeito com os brasileiros”, avalia o jornalista, “porque não é apenas o governo do país que sofre vigilância. Empresas e cidadãos também.”

De acordo com Greenwald, essa “tática” está amparada na crença de Washington de que conseguirá pressionar as autoridades brasileiras com força suficiente para que as reações negativas acabem se dissipando no tempo. “Os Estados Unidos acham que o governo brasileiro vai fingir que tem raiva em público mas, nos canais diplomáticos, não resistirá às pressões e deixará tudo como está”, opinou. Os parlamentares da comissão de relações internacionais lembraram que o embaixador norte-americano no país, Thomas Shannon, tem se recusado a comparecer ao Congresso para prestar esclarecimentos.

“Temos grandes expectativa que a presidenta Dilma Rousseff, que será hospedada na Casa Branca em outubro, durante visita oficial aos Estados Unidos, possa tratar desse assunto diretamente, como chefe de Estado, com o chefe de Estado norte-americano, Barack Obama, para que esclarecimentos possam ser dados à sociedade brasileira”, afirmou o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), presidente da comissão de relações exteriores do Senado, que dirigiu a oitiva com Glenn Greenwald.

No final da audiência, o jornalista afirmou que está em constante comunicação com Edward Snowden, que já saiu do aeroporto de Moscou e se encontra temporariamente exilado na Rússia. “Snowden está bem, está muito feliz quanto aos debates que estão sendo criados no mundo sobre privacidade na internet ou espionagem norte-americana”, contou. “É exatamente esse debate que ele queria provocar.” Greenwald lamentou, porém, que o técnico de informática tenha sido obrigado por Moscou a cessar suas denúncias. “Só pode ficar lá se parar de divulgar informação. E ele está parando, porque ele quer ficar lá.”

Com informações da Agência Câmara e Agência Brasil