Gripe de ministro impõe trégua à batalha entre Câmara e STF

Com suspeita de pneumonia, Celso de Mello é internado em Brasília e adia decisão sobre cassação de deputados condenados no julgamento do mensalão

Diz o STF que Celso de Mello está em um hospital de Brasília (Foto: Carlos Humberto. STF)

Rio de Janeiro – Até aqui inatingível em sua marcha condenatória no julgamento do mensalão, o Supremo Tribunal Federal (STF) foi detido pelo vírus da gripe. Em uma repetição do que já ocorrera na véspera, o ministro Celso de Mello faltou à sessão de hoje (13) por motivo de doença, o que impediu que fosse decidido a quem caberá a palavra final sobre a cassação dos mandatos dos parlamentares condenados pelo tribunal. O placar da votação está em 4 a 4, e o voto de Mello, ministro mais antigo do STF, definirá a polêmica questão que já propicia um início de crise entre os poderes Legislativo e Judiciário.

Em meio aos crescentes rumores de que estaria evitando proferir seu voto como forma de dar mais tempo para que os dois poderes chegassem a um acordo, Mello optou pela internação em um hospital de Brasília que não teve o nome divulgado. A internação ocorreu ainda durante a noite de ontem, segundo nota oficial de esclarecimento divulgada no início da tarde de hoje pelo STF. Os médicos, diz a nota, não descartam a possibilidade de que o ministro, que tem 67 anos, esteja com pneumonia.

“O ministro Celso de Mello deu entrada ontem (12), às 21h, em hospital de Brasília em função de uma forte gripe. O diagnóstico inicial não afastou a hipótese de uma pneumonia. Por isso, os médicos decidiram pela sua permanência no hospital para a realização de novos exames. Caso seja liberado pelos médicos, o ministro Celso de Mello participará da sessão plenária da próxima segunda-feira (17). A sessão plenária do STF desta quinta-feira (13) está mantida para julgamentos de outros processos”, diz a íntegra da nota divulgada pelo tribunal.

As especulações sobre os reais motivos da ausência de Mello fermentaram em Brasília nas últimas 48 horas. Tudo porque o ministro, que se manifestara diversas vezes durante o voto dos colegas e já havia dando a entender que votaria atribuindo ao STF a palavra final sobre a cassação dos deputados, foi subitamente impedido de votar na sessão de 6 de dezembro, assim que o placar chegou a 4 a 4.

Naquele dia, o presidente do tribunal e relator do processo do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, alegou estar se sentindo mal – também por causa de uma gripe – e deu a sessão por encerrada. Desde então, a votação não foi definida e o fim do julgamento do mensalão, se Mello for mesmo diagnosticado com pneumonia, poderá ficar para o ano que vem, já que o recesso do Judiciário tem início em 20 de dezembro.

Efeito colateral?

Embora o STF não admita, especula-se que a doença de Celso de Mello seja efeito colateral da crescente tensão que envolveu lideranças do Legislativo e do Judiciário nos últimos dias. Após declarar por diversas vezes que a casa não abriria mão de decidir sobre a eventual cassação dos deputados condenados, o que, segundo ele, é uma prerrogativa prevista na Constituição Federal, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), recebeu na terça-feira (11) o apoio de todos os líderes dos partidos da base aliada e até mesmo do líder de um dos principais partidos de oposição, o DEM, Pauderney Avelino (AM).

Ontem, Maia e o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), agraciaram o ex-presidente do STF, Carlos Ayres Britto, e os ministros Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski com a medalha da Grã Cruz da Ordem do Mérito do Congresso Nacional, concedida “em reconhecimento aos serviços prestados à nação”. O presidente da Câmara ficou calado a maior parte do tempo, mas seu recado já havia sido dado na véspera: “Defendo que o parlamento brasileiro não se curve a uma decisão com esse impacto. Nesse caso, desobedecer ao STF significa obedecer à Constituição”, disse.

Paciência

Entre os ministros do Supremo, prevalece a discrição em relação ao estado de saúde de Celso de Mello. Após receber a medalha no Congresso, Lewandowski afirmou que, no que se refere à cassação dos parlamentares condenados no julgamento do mensalão, é preciso ter paciência: “Não há crise nenhuma, e cada poder está cumprindo o seu papel. Na hora precisa, tanto os agentes do STF quanto do Congresso têm um senso de institucionalidade muito maior do que as individualidades. A última palavra é sempre de equilíbrio e de harmonia, e esse episódio não fugirá à regra”, disse.

Lewandowski lembrou ainda que, mesmo que o STF decida pela cassação dos deputados, ainda caberão recursos. No mesmo dia, entretanto, outro ministro, Marco Aurélio Mello, ao comentar a ausência de Celso de Mello, deu mostras de que os ânimos entre Legislativo e Judiciário ainda estão exaltados: “Nenhuma pressão externa intimidará qualquer ministro do Supremo, muito menos o decano da corte”, disse Marco Aurélio, para quem “é impensável não se cumprir a decisão do Supremo”.