Após nova crítica a Lewandowski, Barbosa é repreendido por colegas no STF

Relator afirma que ministro faz 'vista grossa', 'contorna' o autos do mensalão e chega a medir o tamanho do voto alheio para fazer um igual; Marco Aurélio Mello cobra respeito

Lewandowski se disse “estupefato” com a acusação de que “mede” o tamanho do voto alheio (Foto: Nelson Jr. STF)

Rio de Janeiro – Ao final de mais uma semana de trabalhos hoje (27) no Supremo Tribunal Federal (STF), o julgamento do mensalão entrou em uma fase de contraposição exacerbada entre os ministros relator do processo, Joaquim Barbosa, e revisor, Ricardo Lewandowski. O embate entre os dois ministros, que teve início ainda no primeiro dia de julgamento, chegou a um ponto crucial tanto no que se refere ao entendimento do processo – Barbosa fala em compra de parlamentares enquanto Lewandowski vê caixa dois – quanto à própria convivência no plenário, que viveu ao longo da semana novos momentos de bate-boca entre os magistrados, com direito a repreensão dos colegas à postura e aos termos empregados por Barbosa.

Ao votar sobre o item do julgamento que analisa o repasse de dinheiro oriundo do PT e das empresas de Marcos Valério aos partidos da base aliada – PP, PTB, PMDB e PL (atual PR) – Lewandowski afirmou não haver provas de que esse dinheiro tenha sido distribuído entre os deputados desses partidos. Ao analisar o caso do deputado federal Valdemar Costa Neto (PR-SP), o revisor afirmou sua convicção. “Os recursos iam para Valdemar e supostamente para os membros do partido. Digo supostamente porque, embora se diga que [o dinheiro] foi para os membros do PL, em nenhum momento há comprovação disso nos autos”, disse.

Anteriormente, ao proferir seu voto sobre o mesmo item do julgamento, Barbosa havia reafirmado a tese da compra de parlamentares exposta na peça de acusação apresentada pelo Ministério Público: “Por mais que as defesas neguem, há provas robustas, incluindo depoimentos de peças-chave nesse processo, de que houve a transferência de pelo menos R$ 55 milhões do esquema, viabilizados por Marcos Valério, aos parlamentares de PP, PL, PTB e PMDB.”

A divergência de pontos de vista entre relator e revisor é acompanhada por uma crescente animosidade entre os dois ministros. Barbosa, que desde o início do julgamento se queixa dos votos, segundo ele demasiado longos, de Lewandowski, não conteve a irritação na sessão de ontem (26) e chegou a afirmar que o revisor havia “medido o seu voto para ficar do mesmo tamanho do meu”, além de acusá-lo de fazer “vista grossa” e de “contornar” o processo. As palavras de Barbosa foram logo repreendidas pelo presidente do STF, ministro Carlos Ayres Britto, e pelos dois ministros mais antigos da casa: Celso de Mello e Marco Aurélio Mello.

Ao interromper Lewandowski quando o revisor falava sobre o tesoureiro do PTB, Emerson Palmieri, Barbosa foi ríspido. “Nós, como ministros do Supremo, não podemos fazer vista grossa a respeito do que consta nos autos. O revisor está contornando os fatos”, disse. Marco Aurélio saiu em defesa de Lewandowski: “Somos onze juízes, ministro. Ninguém faz vista grossa nesse plenário. Vossa Excelência tem de respeitar a manifestação dos colegas. O revisor não está contornando nada. Cuidado com as palavras. O senhor está num colegiado de alto nível. Vamos respeitar as pessoas e respeitar a instituição.”

Novo bate-boca

Após ser interrompido e criticado pela absolvição de Palmieri da acusação de lavagem de dinheiro, Lewandowski interpelou Barbosa: “Se Vossa Excelência não admite a controvérsia, deveria propor à comissão de redação do STF que abolisse então a figura do revisor. Vossa Excelência quer que eu coincida com todos os pontos de vista de Vossa Excelência? Não é possível isso”, disse o revisor. “Estou apenas lembrando a Vossa Excelência o que está nos autos”, retrucou Barbosa. O revisor respondeu com irritação: “Vossa Excelência não precisa me lembrar de nada. Eu li os autos”, disse.

Logo depois, Barbosa interrompeu novamente Lewandowski para dizer ao ministro-revisor que ele deveria distribuir com antecedência seu voto para facilitar o trabalho dos colegas. Foi a vez de Lewandowski retrucar: “Ao final da exposição do voto eu o farei, segundo a obrigação regimental que tenho. Vossa Excelência não dirá a mim o que tenho que fazer. Vossa Excelência já proferiu seu voto, eu proferirei meu voto”, disse. “Faça-o corretamente”, respondeu Barbosa. “Por favor, não me dê conselhos”, encerrou o revisor.

Votos

Na sessão de hoje, Lewandowski se declarou “estupefato” com a afirmação de que medira seu voto para ficar do mesmo tamanho do revisor. Barbosa, por sua vez, pediu a palavra no início da sessão para criticar o voto do revisor sobre o item lavagem de dinheiro. Barbosa qualificou a análise de Lewandowski como “irrelevante” e “equivocada”, mas, desta vez, o revisor preferiu não responder.

Em seguida, votaram sobre o item que analisa o repasse de dinheiro aos partidos da base aliada os ministros Rosa Weber, Luiz Fux e Carmen Lúcia. A ministra Rosa condenou pelo crime de corrupção passiva os réus Roberto Jefferson, Emerson Palmieri, Romeu Queiroz, Pedro Corrêa, Pedro Henry, João Cláudio Genu, José Borba, Valdemar Costa Neto, Bispo Rodrigues e Jacinto Lamas. Em relação ao crime de lavagem de dinheiro, Rosa absolveu Rodrigues, Genu e Borba e condenou os demais réus. Todos foram absolvidos pela ministra da imputação de formação de quadrilha e o réu Antônio Lamas foi absolvido de todas as imputações, seguindo a recomendação do Ministério Público.

Carmen Lúcia votou da mesma forma que Rosa Weber, mas absolveu apenas José Borba do crime de lavagem de dinheiro. Fux seguiu integralmente o voto do relator e pediu a condenação de todos os réus, com exceção de Antônio Lamas. O ministro José Antônio Dias Toffoli teve de interromper seu voto para comparecer à sessão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Nesse momento, vota o ministro Gilmar Mendes.