Ausência

Delcídio frustra expectativas, adia volta ao Senado e negocia licença para evitar cassação

Senador recebeu políticos em casa nesta segunda-feira. Está sendo aconselhado a evitar mais desgastes para a imagem e arranhões na relação com o PT, de modo a centrar esforços na sua defesa

Geraldo Magela /Agência Senado

Hoje, Delcídio começou a receber em casa a visita de colegas do PT e outros partidos a ele ligados

Brasília – Apesar da grande expectativa em relação ao retorno do senador Delcídio do Amaral (PT-MS) ao Congresso, hoje (22), e à possibilidade de ele fazer um pronunciamento no plenário do Senado se defendendo, o parlamentar mudou de ideia. Passou o dia inteiro em casa e seu gabinete informou que não há confirmação, nem sequer, de que ele comparecerá à Casa amanhã. A primeira justificativa foi que Delcídio preferiu fazer seu pronunciamento num dia em que o plenário apresentasse mais quórum, uma vez que muitos parlamentares só costumam chegar a Brasília nas manhãs das terças-feiras. Mas são muitas as informações de bastidores de que Delcídio estaria sendo convencido a não comparecer mais ao Senado.

E, em vez disso, pedir direto uma licença parlamentar por período de 120 dias, à qual tem direito. Com a licença, ele não poderá receber mais o salário de senador e o cargo passará a ser ocupado pelo primeiro suplente, o empresário Pedro Chaves dos Santos Filho (PSC-MS). Mas em compensação, enquanto vigorar essa licença – ou nos próximos quatro meses a partir de quando for formalizada – o senador tentará negociar para postergar o rito de tramitação de processo que pede a sua cassação.

E com isso, continuará sendo beneficiado pelo foro privilegiado – que faz com que a ação penal contra ele tramite no Supremo Tribunal Federal (STF) e não na primeira instância, o que deixaria o caso nas mãos do juiz federal Sérgio Moro, coordenador das ações relacionadas à Lava Jato.

Informações de parlamentares ligados ao senador sul-mato-grossense são de que ele passou o final de semana recolhido, na companhia apenas da mãe, da esposa e das filhas, e teria se emocionado em várias ocasiões. Recebeu a visita de uns poucos assessores e amigos próximos e resolveu agir assim, para se recuperar emocionalmente do período em que ficou preso, durante 87 dias.

Só a partir de hoje que Delcídio começou a receber, em casa (até porque cumpre prisão domiciliar), a visita de colegas do PT e outros partidos a ele ligados, assim como líderes e representantes de comissões técnicas (uma vez que antes de ser detido, o parlamentar ocupava a liderança do governo no Senado).

CAE e discurso

Entre os principais pontos que estariam sendo discutidos com o senador está a sua substituição na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), considerada uma das mais importantes do Congresso. Segundo informações que vazaram pela imprensa no último final de semana, Delcídio teria deixado claro o interesse em permanecer na presidência da CAE. A questão fragiliza ainda mais a situação da base aliada no Senado. O PT acha temerário para a imagem da Casa ter uma comissão importante, cuja presidência foi negociada para ser ocupada por um parlamentar da sigla, ocupada por ele (Delcídio), que está envolvido em ação na Lava Jato.

Outras conversas na pauta com o senador são sobre a possibilidade do discurso que até o início desta manhã ele insistia em fazer. E ponderações sobre se esta fala não pode lhe causar ainda mais desgaste político, ou para o PT e o Senado como um todo.

E, por fim, estão sendo mantidos entendimentos, ainda, conforme contou um senador do PT, para que sejam negociados itens sobre a saída ou não de Delcídio do partido. Tudo estaria sendo tratado de uma forma que, ou ele seja mantido na sigla, ou saia sem uma expulsão explícita e nem muitos atritos.

Entre os senadores mais próximos a Delcídio, os comentários são de que o parlamentar não esconde a mágoa com a nota pública divulgada pelo presidente nacional do PT, Rui Falcão, na época da sua prisão, dizendo não ver motivos para que ele fosse defendido pela legenda por ter agido “de forma pessoal” e “em defesa de interesses próprios”.

O líder do PT na Casa, senador Humberto Costa (PE), evitou comentar o teor das conversas e os demais parlamentares têm se esquivado de falar sobre o tema, limitando-se a informar que o comando das tratativas com Delcídio está com Costa e com o líder do governo no Senado, José Pimentel (PT-CE).

A primeira articulação feita pela base aliada esta manhã foi o adiamento da recondução da CAE, que estava marcada para esta terça-feira. Já estava definido entre os petistas que a presidência da comissão ficaria, daqui por diante, com a ex-ministra e senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), mediante eleição ainda a ser realizada, mas que já conta com o apoio dos demais integrantes do colegiado.

Mas os senadores esperam tratar do assunto de forma mais acentuada com Delcídio, para que ele seja convencido de que esta é a melhor solução para a CAE. Atualmente, a comissão está sendo presidida pelo senador Raimundo Lira (PMDB-PB), um dos vice-presidentes do colegiado, que assumiu substituindo o parlamentar no cargo.

A articulação se deu porque, como nesse período em que esteve preso, Delcídio não renunciou ao cargo de presidente da CAE, a liderança do PT encaminhou um ofício à Secretaria-Geral da Mesa do Senado, pedindo a substituição dele pelo senador Donizete (PT-TO). O procedimento era necessário para permitir que, dessa forma, automaticamente o cargo de presidente da CAE ficasse vago e uma nova eleição pudesse ser realizada.

Só que, com a revogação da prisão do senador na última sexta-feira, os petistas acharam melhor adiar todo esse trâmite. E como o ofício teria de ser lido no plenário até aquele dia para a eleição entrar na pauta de amanhã, representantes da base aliada trabalharam para evitar essa leitura, o que atrasa o processo.

‘50% do Senado’

Outro assunto em torno de Delcídio provocou debates acalorados no plenário do Senado. Diz respeito a declarações divulgadas pelos principais sites e jornais do país, nos últimos dias, de que o senador teria avisado a amigos que não adotaria uma postura revanchista com os que atuaram contra ele, mas ao mesmo tempo não admitiria ser cassado porque, se isso acontecesse, levaria 50% do Senado junto.

O primeiro a comentar as declarações foi o senador Telmário Mota (PDT-RR). Ele disse que, se as declarações forem verdadeiras, o parlamentar “tem obrigação” de ir até o plenário se explicar e dizer quem são esses 50% senadores passíveis de serem cassados.

A senadora Vanessa Graziotin (PCdoB-AM), cujo partido também faz parte da base do governo, disse que não é possível um parlamentar fazer tais afirmações sem se manifestar, e que a denúncia “atinge a todos os senadores”. “O Delcídio tem que vir até aqui e se explicar, se por acaso ele afirmou isso. E se não afirmou tem que convocar a imprensa e dizer que não foram suas palavras, porque as afirmações são muito graves”, afirmou.

A senadora Ana Amélia Lemos (PP-RS), defendendo o discurso de Vanessa, disse que a conduta dos senadores em relação ao caso – que votaram em eleição aberta, pelo acolhimento da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de prender o senador – não foi de revanchismo ou qualquer gesto pessoal contra ele, mas uma forma de preservar a instituição Congresso Nacional.

“Não houve uma ação contra o Delcídio na votação que decidiu pela manutenção da sua prisão, mas sim, respeito à decisão do STF. Não somos juízes, não somos julgadores. Não pode haver tolerância nem complacência aqui em relação a qualquer pessoa. As normas precisam ser cumpridas em respeito aos princípios constitucionais”, disse Ana Amélia. Cristovam Buarque (PPS-DF) afirmou, por sua vez, que se por acaso ficarem confirmadas as palavras de Delcídio, “o Senado não pode permanecer calado”.

Em sua defesa

Conforme pessoas próximas do senador, a maior preocupação dele neste momento é fazer sua defesa pessoalmente para evitar a cassação do mandato e a condenação pela denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR) de cometer crime de impedir e embaraçar a investigação penal. Em seu pronunciamento, caso venha a ser realizado, Delcídio deverá dizer que é inocente e que foi vítima de uma armadilha para ajudar na aprovação do pedido de delação premiada do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. Também tem dito que em nenhum momento procurou os ministros do STF para pedir interferência em relação à delação de Cerveró.

Delcídio foi preso em novembro passado após a comprovação de serem verídicas gravações de conversa entre ele, seu chefe de gabinete, Diogo Ferreira, e o filho de Cerveró, Bernardo. Estariam negociando um plano de fuga e um pagamento de mesada para que o ex-diretor saísse do país e, em troca, deixasse de aderir à delação premiada, para evitar incriminar políticos diversos.

Está marcada para quarta-feira (24) reunião do Conselho de Ética do Senado para discutir o processo que pede a cassação do senador.