Entre Vistas

‘América Latina voltará a ser exemplo para a esquerda’, diz líder do Podemos

Para o deputado espanhol Txema Guijarro, é preciso compreender as razões pelas quais diversos países do mundo estão escolhendo respostas radicais à direita

Luciano Velleda

“É preciso ter autocrítica para entender o que falhou nos últimos anos e então adotar respostas sensíveis”, diz Txema Guijarro

São Paulo — O deputado federal espanhol e secretário-geral do partido Podemos, Txema Guijarro, analisa com tom de tristeza a situação da esquerda brasileira e latinoamericana. “Vejo um Brasil convulsionado. Vejo com extrema preocupação. A América Latina havia sido uma vanguarda nas alternativas ao neoliberalismo e hoje está ameaçada por movimentos neofascistas. É desconcertante”, afirma. 

Apesar do diagnóstico pouco animador, ele ainda consegue ver a luz da esperança logo à frente ao recordar todos os momentos difíceis já enfrentados pelos povos latinoamericanos ao longo da sua história. “O desafio do momento será superado e a América Latina voltará a ser exemplo para a esquerda do mundo”, projetou Txema Guijarro, durante participação no programa Entre Vistas, que vai ao ar nesta terça-feira (11), a partir das 22h, pela TVT

Conduzida pelo jornalista Juca Kfouri, a conversa com o secretário-geral do Podemos passou por temas espinhosos da atualidade, como a onda neofascista que cobre a Europa e o Brasil, e a semelhança do discurso saudosista de espanhóis pelo ditador Francisco Franco e de brasileiros pelo regime civil-militar (1964-1985). 

“O mundo resolveu entrar à direita?”, questiona Juca Kfouri, logo na abertura do programa. Sem pegar o caminho da resposta fácil, Txema Guijarro diz ser preciso compreender as razões pelas quais diversos países do mundo estão escolhendo respostas radicais à direita como solução dos seus problemas; compreender para ter condições de oferecer outros caminhos, pavimentados pela fraternidade e solidariedade, e não pelo ódio. 

“É preciso ter autocrítica para entender o que falhou nos últimos anos. Uma análise inevitável e então adotar respostas sensíveis, para só assim ter ferramentas para enfrentar os riscos mais importantes das últimas décadas”, afirmou o deputado espanhol. 

Criado em 2014 na esteira de grandes mobilizações sociais que sacudiram a Espanha, Txema Guijarro explica que o Podemos é um partido com valores da esquerda, mas que vai além e se posiciona como uma frente democrática, com o objetivo de falar a linguagem “das pessoas comuns” e não apenas dos intelectuais, para apresentar medidas concretas ao que o povo necessita.

Para o secretário-geral do partido, o Podemos segue mantendo, quatro anos após sua fundação, as características de “movimento”, com uma estrutura flexível e incentivando a democracia participativa. “As velhas estruturas partidárias não nos servem. É preciso ser mais flexível, mais poroso”, explica. 

Como exemplo de prática nova, Txema Guijarro diz que para participar do Podemos a pessoa pode ser, ao mesmo tempo, filiada a outro partido. “Não temos medo de contradições, desde que o debate seja correto e democrático. O Podemos não é mais do que uma extensão do povo. Não é uma vanguarda intelectual que quer dar respostas, é uma organização que só avança através do debate. Só através de objetivos comuns é possível enfrentar a bestialidade do fascismo.” 

Feminismo e imigração 

Além do apresentador Juca Kfouri, o Entre Vistas de hoje (11) com o deputado espanhol Txema Guijarro tem ainda a participação de Amanda Mendes, estudante de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e Rosemary Segurado, cientista política e professora da Escola de Sociologia e Política de São Paulo. 

E é justamente Rosemary Segurado que pergunta, em determinado momento da entrevista, como o Podemos lida com a participação da mulher no partido. Com sinceridade, Txema Guijarro explica que o discurso feminista faz parte do nascimento do partido, mas apenas no último ano o Podemos assumiu o feminismo realmente como um valor da organização. 

“O feminismo hoje é parte do Podemos, se concentra como uma maneira de compreender a política. Sabemos que esse é o caminho correto, não só usar o discurso feminista, mas aplicar”, afirma, dando como exemplo a ocupação de mulheres nos cargos mais importantes do partido, assim como a participação igualitária em qualquer mesa de debate. “Esse tipo de mudança é desconcertante para nós homens, mas é o caminho que nos levará a uma sociedade mais igualitária”, admite. 

Durante quase uma hora de programa, a questão racial e a crise migratória na Europa é outro tema bastante discutido. No caso da Espanha, o secretário-geral do Podemos explica que sempre houve uma imigração vinda da América Latina e que, até certo ponto, era bem aceita e com cultura similar. A situação, todavia, tem mudado nos últimos anos com um grande fluxo de imigrantes de países africanos, o que tem causado problemas. 

“Antes era um racismo ‘ingênuo’, mas o racismo de agora é mais agressivo, é alimentado pelo ódio”, analisa Txema Guijarro. Para ele, países da Europa sofrem hoje as consequências de suas políticas expansionistas durante décadas na África. “O curioso é que as mesmas pessoas que antes fomentavam o livre mercado, a circulação de pessoas, agora são contra, o que é uma contradição grande.” 

O papel da juventude no Podemos, a crítica ao Partido Socialista, a questão da independência da Catalunha, o discurso saudosista do ditador Franco, a situação ambivalente das redes sociais e as fake news são outros temas discutidos no programa que vai ao ar nesta terça-feira (11), às 22h, na TVT.

Confira a íntegra do programa, a partir das 22h