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Candidatura coletiva do MTST busca pluralidade e alerta: ‘Sem CEP, não há reivindicação’

Pretas e sem-teto, as três pré-candidatas querem trabalhar São Paulo a partir da periferia

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Jussara, Débora e Tuca querem fortalecer a democracia e driblar o personalismo político, através da candidatura coletiva do MTST

São Paulo – O Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) terá uma candidatura coletiva nas eleições para Câmara Municipal de São Paulo. A chapa composta por Jussara Basso, Débora Lima e Tuca, três mulheres negras e periféricas – filiadas ao Psol –, tem o objetivo de levar pluralidade ao Legislativo, driblar o personalismo e mostrar a “verdadeira face” do movimento de luta.

Apesar de o candidato à prefeitura paulista pelo Psol, Guilherme Boulos, também coordenador nacional do MTST, ser branco, as pré-candidatas afirmam que o movimento por moradia é composto majoritariamente por mulheres negras. “Elas representam 70% da militância, somos a maioria e estamos mostrando nosso protagonismo dessa luta”, afirma Jussara.

A pluralidade defendida por elas também se dá na representação de regiões da cidade. Débora está à frente da ocupação Marielle Vive, na zona norte, Jussara na Vila Nova Palestina, na zona sul, e Tuca na ocupação Copa do Povo, na zona leste.

“Há vereadores bairristas e nós entendemos que a política deve ser olhada num todo. O fato de cada uma ser de diferentes regiões é para mostrar essa visão ampla para São Paulo. As periferias têm problemas gritantes, desde infraestrutura às áreas de lazer, mas com necessidades e urgências diferentes”, explica Débora.

Furando a bolha

Apesar de representar a periferia, a candidatura coletiva enfrenta a criminalização do MTST, por parte conservadora da população. Furar a bolha, de acordo com elas, não é uma tarefa fácil, mas realizam um “trabalho de formiguinha” para desconstruir o senso comum criado sobre a luta por moradia.

“É preciso entender que a maioria da população paulista vive em lugares insalubres. Para além de uma política habitacional, há uma ausência de um política fundiária, e as questões de saúde, educação e equipamentos públicos estão ligadas a isso. As pessoas sem CEP não são reconhecidas, então não dá para reivindicar equipamentos públicos e direitos básicos”, defende Jussara, que sairá como a cabeça de chapa.

Um dos objetivos das três representantes do movimento é fortalecer a democracia e driblar o personalismo político. Disputar as eleições municipais com a candidatura coletiva é uma possibilidade de mostrar como o MTST se organiza.

“A forma que o MTST se organiza sempre foi de maneira coletiva. Nós tomamos sempre decisões coletivas”, resume Débora. “As iniciativas coletivas são para criticar esse personalismo na política. São políticos de carreira ocupando as vagas legislativas, ao longo da vida, transmitindo a herança aos sucessores. Basta ver a família Bolsonaro. É uma iniciativa importante para democratizar mais o sistema político brasileiro”, acrescentou Jussara.

Ideias para São Paulo

A candidatura coletiva do MTST quer trabalhar o município a partir da periferia. Na avaliação das pré-candidatas, a população pobre, que mora à margem do centro da capital, precisa ser parte da construção de políticas públicas.

Jussara diz que é preciso entender o povo que mora nas favelas para além da mão de obra barata, que flui todos os dias da periferia para a região central. “A mão de obra dos moradores da periferia é que faz a riqueza do município mais rico do Brasil. Educação, saúde e a segurança da mulher precisam ser pensadas com mais qualidade. Construir a partir de debates com as famílias.”

Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais (Inep) mostram que a cidade tem ainda 22.732 crianças na fila oficial por uma vaga em creches. Atualmente, 63% das crianças de 0 a 3 anos estão matriculadas, a maioria em unidades públicas.

De acordo com Jussara Basso, o aumento de vagas em creches é essencial, pois garante às mulheres condições para trabalhar. “Quando é garantido o direito da mulher buscar o seu sustento, fica garantido também a possibilidade dessa mulher sair de um lar violento, para criar os seus filhos e ter a sua autonomia resguardada”, explica.

“Na creche a precariedade é muito grande, principalmente na região leste, em que as mães inscrevem a criança quando nasce e quando a vaga sai, a criança já está na escola. Tem a demanda por saúde também, faltam UBSs (Unidades Básicas de Saúde), mais médicos e têm poucos hospitais”, descreve Tuca.

Além disso, a pandemia de coronavírus levantou a possibilidade do debate eleitoral abordar a saúde pública. Débora Lima lembra que a pauta da privatização do Sistema Único de Saúde (SUS), por exemplo, foi substituída pelo fortalecimento dos equipamentos públicos.

“A população achava que privatizar era o caminho ideal. Agora, no momento de crise sanitária, conseguimos trazer mais elementos ao debate. A ausência do Estado na periferia colocou as pessoas em maior vulnerabilidade. Então, apesar de você não dialogar muito presencialmente, por conta da pandemia, você tem consegue dar corpo a diversos novos debates”, finaliza ela.