Jornalistas chineses entram em greve contra censura

Membros e apoiadores do maior jornal da China pedem deposição do chefe de propaganda e representam teste para novo governo comunista

São Paulo – Quase 100 jornalistas de um dos maiores e mais liberais jornais da China, o Semanário do Sul (Nanfang Zhoumo), entraram em greve hoje (7) em protesto contra censura ao veículo e pressão de autoridades. A insatisfação teve início quando o editorial de Ano Novo, que pedia a garantia de direitos constitucionais, foi transformado por oficiais da propaganda chinesa em um elogio ao PCCh (Partido Comunista Chinês).

É a primeira vez em mais de duas décadas que o grupo editorial de um grande jornal iniciou uma greve contra a censura estatal. Em meio a dizeres como “Queremos liberdade de imprensa, constitucionalismo e democracia” e “Liberdade de expressão não é um crime”, centenas de leitores do jornal se reuniram hoje fora da sede da redação em Cantão, capital da província, no sudeste do país. 

Funcionários do jornal escreveram uma carta na semana passada pedindo que o chefe de propaganda da província e ex-jornalista econômico, Tuo Zhen, fosse deposto, inclusive por ser “ditatorial” em uma época de “abertura crescente”. Outra carta, escrita por proeminentes acadêmicos chineses, também defendia a queda de Zhen e pedia mais liberdade de imprensa.

“O grupo Nanfang [que edita o jornal] está relativamente disposto a falar a verdade sobre a  China, então precisamos defender sua coragem e apoiá-lo agora”, disse à agência Reuters Ao Jiayang, um dos manifestantes. O jovem acrescenta: “Esperamos que por meio disso possamos lutar pela liberdade de imprensa na China. O comparecimento de hoje reflete o fato de que cada vez mais pessoas na China tem consciência cívica”.

Outra onda de revolta surgiu por causa do blog do jornal, que publicou ontem (6), sob a assinatura de editores chefes, que os “rumores online eram falsos” e que o editorial não foi modificado por censura.

O Semanário do Sul é conhecido por levar a cabo duras investigações contra o governo e por testar os limites da liberdade de imprensa. O jornal já abordou temas sensíveis, como as condições nas fábricas da Foxconn e a propagação de aids em áreas rurais. Apesar disso, e como todos os meios de comunicação, o jornal é supervisionado pelos departamentos de propaganda, que muitas vezes mudam o conteúdo de acordo com a ideologia do partido. Por isso, outros grandes veículos chineses foram forçados a se submeter à linha governamental, isolando-o como opositor.

Já o jornal Tempos Globais, ligado ao órgão oficial Diário do Povo, afirmou em editorial na sexta-feira (4) que “não importa se eles estão contentes ou não, pois com a realidade social e política chinesa, é impossível ter o tipo de meios de comunicação livres como os sonhados. Os veículos não se converterão, de nenhuma maneira, em uma área política especial, e perderão sem nenhuma dúvida caso lutem contra o governo”. O editorial não consta da versão do veículo em inglês.

A polêmica em volta do caso é vista como teste para o PCCh, que trocou de cúpula em novembro passado e apontou como secretário geral Xi Jinping, defensor de um governo mais aberto e que tomará posse como presidente em março. O novo governo já apontou que pretende desmantelar os campos de reeducação, medida há muito exigida por grupos de direitos humanos.

Também está em foco a reação do novo chefe da província de Guangdong, Hu Chunchua, em ascensão na política chinesa e tido como futuro líder do país. A província que governa é a mais liberal e desenvolvida, principalmente por causa da proximidade com Hong Kong, e foi berço do processo de abertura a partir da década de 1970. 

 

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