caminhos diante do golpe

Para economistas, ajuste fiscal de Temer é outro capítulo de uma fraude

Segundo a professora Laura Carvalho, ajuste não tem se mostrado capaz de reduzir a dívida pública. Para a economista Leda Paulani, agenda neoliberal e ataque a direitos são raízes materiais do golpe

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Laura e Leda: descrença em um governo que se ressente de legitimidade e busca atacar os programas sociais

São Paulo – A retomada do crescimento econômico por meio do ajuste fiscal, ou corte de gastos públicos, articulado pelo governo interino de Michel Temer poderá agravar o cenário da crise. O ataque aos investimentos sociais do governo é uma cortina de fumaça sobre o verdadeiro problema do país, que é a alta taxa de juros. Esse foi o ponto de vista defendido pelos economistas que participaram hoje (25) de mesa de debates na Universidade de São Paulo (USP), como parte do ciclo de discussões “Caminhos da esquerda diante do golpe”.

A professora de Economia da USP Laura Carvalho disse que a revisão de meta do resultado primário do setor público aprovada pela Câmara, de R$ 170,5 bilhões, revela outra parte da fraude do impeachment. “O governo eleito previa R$ 96,7 bilhões, e essa notícia foi recebida como irresponsabilidade. ‘Agora, sim, sabemos o tamanho do rombo’, dizem os analistas”, afirmou a professora.

Segundo Laura, o roteiro do ajuste fiscal para agravar a economia é bastante conhecido, e foi cumprido pela presidenta Dilma Rousseff no ano passado. “Quando se identifica a crise, há uma pressão rápida pelo ajuste fiscal, pressão essa que foi atendida por Dilma, que cortou 40% do investimento público.”  Laura lembrou que, apesar do ajuste, a dívida pública aumentou em 2015, graças à política monetária de elevação da taxa de juros.

Para a professora, as medidas de Temer anunciadas agora, como o teto para gastos públicos pela inflação do ano anterior, as desvinculações constitucionais das verbas de saúde e educação e as privatizações “são medidas radicais e de longo prazo”. Ela também disse que o objetivo é a redução do papel do Estado na economia, como manda o receituário neoliberal que busca converter o Estado em uma máquina a favor da rentabilidade do setor financeiro. “Um governo que não tem legitimidade para esse tipo de reforma radical talvez devesse promover algum tipo de debate. Esse governo tem o Congresso, mas não tem as ruas.”

A também professora de Economia da USP Leda Paulani procurou mostrar o que chamou de “raízes materiais por trás do golpe” e identificou duas frentes que estão relacionadas a esse processo político. “A primeira coisa é a retomada da agenda neoliberal”, disse, destacando que essa agenda não foi abandonada pelos governos do PT. “No governo Lula, a agenda foi combinada com as políticas sociais e com uma política externa de esquerda”, afirmou.

A outra questão que está na raiz do golpe, segundo a professora, são os direitos que foram garantidos pela Constituição de 1988. Leda deu o exemplo da área da saúde: “O SUS (Sistema Único de Saúde) foi um marco civilizatório. Antes, a pessoa só era atendida se tivesse carteira de trabalho”. Ela disse também que a saúde e as leis trabalhistas, ainda que tenham defeitos, garantiram de algum modo o Estado de bem-estar social, que agora está sob desmonte.

Confira a programação de segunda-feira (30), último dia do seminário “Caminhos da esquerda diante do golpe”, no anfiteatro de História, da USP:

10h: Amélia Telles, Givanildo Manoel da Silva, Marcelo Freixo e Pastoral Carcerária; mediação: Fernando Rodrigues Frias.

14h30: Djamila Ribeiro, Douglas Belchior, Heloisa Buarque de Almeida, Jean Wyllys; mediação: Adriana Matos.

19h30: André Singer, Marilena Chauí, Paulo Arantes, Vladimir Safatle; mediação: Ricardo Musse.

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