Negócios obscuros

Crise política no Paraguai revela disputa pela comercialização da energia de Itaipu

Enquanto empresas disputam o lucro da venda da energia, populações paraguaia e brasileira pagam os custos da dívida da construção da hidrelétrica

Agência Brasil
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Em maio, os governos de Bolsonaro e Mario Abdo assinaram acordo que, revelado na última semana, quase abriu processo de impeachment do presidente paraguaio

São Paulo — A crise política que quase levou à abertura de processo de impeachment do presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez, trouxe à tona os interesses por trás do Tratado de Itaipu e a disputa pela energia gerada por uma das maiores hidrelétricas do mundo. Itaipu é um tema central na relação bilateral entre Brasil e Paraguai. Segundo Cecilia Vuyk, cientista política e integrante da campanha “Ñane M’bae pela Soberania Nacional”, que significa “Itaipu é nosso” na língua guarani, o acordo assinado entre os dois países em maio e desfeito nesta quinta-feira (1), revelou a disputa por parte de diferentes empresas pela comercialização da energia gerada por Itaipu. Reportagem do jornal ABC Color mostrou que uma das empresas, a Léros Comercializadora de Energia, teria ligações com a família Bolsonaro.

“O negócio da energia é sempre entre os mesmos grupos empresariais e de poder que se beneficiaram nestes 50 anos no Tratado de Itaipu, e que estão tentando se beneficiar agora, tentando se apropriar de uma energia que deve servir para o desenvolvimento do povo. É a disputa pela nossa energia, nossa riqueza e soberania”, afirma Cecilia, em entrevista à jornalista Marilu Cabañas, na Rádio Brasil Atual.

Para ela, o Tratado de Itaipu é prejudicial para os povos paraguaio e brasileiro. A cientista política explica que o pagamento da dívida originária na construção de Itaipu, em 1975, desde então cresceu 40 vezes do valor inicial. Um aumento causado, entre as principais razões, pelos interesses dos bancos, a inflação do Brasil no período anterior ao Plano Real, na década de 1990, e o subsídios às indústrias de São Paulo entre 1985 e 1990. Cecilia destaca que, atualmente, 60% da tarifa de Itaipu é composta por essa dívida.

“E essa dívida é paga pelo povo brasileiro no serviço de eletricidade. Isso quer dizer que essa dívida corrupta afeta diretamente a economia da população brasileira e paraguaia, mas principalmente a brasileira, que utiliza 85% da energia de Itaipu”, explica. Ela pondera que foi graças a divulgação do acordo entre o governo de Mario Abdo e Bolsonaro, que permanecia secreto, que os movimentos sociais do Paraguai saíram às ruas exigindo respostas.

“Foi justamente a pressão popular que conseguiu frear esse acordo e abrir novamente a negociação. Foi um primeiro passo da batalha da anulação do Tratado de Itaipu”, afirma. Em sua análise, a crise política no governo de Mario Abdo pode continuar, pois a disputa pela energia irá prosseguir.

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