Arte é política

Renato Braz na TVT: ‘Declarar a dor é tão importante quanto declarar o amor’

Cantor e compositor foi convidado de Juca Kfouri no “Entre Vistas” e falou sobre sua participação no ato em memória de Alexandre Vannuchi, assassinado pela ditadura há 50 anos

TVT/YouTube/Reprodução
TVT/YouTube/Reprodução
Renato Braz e Juca Kfouri estarão juntos, nesta sexta (17), em evento pela memória de Alexandre Vannucchi, morto há exatamente 50 anos pelo regime militar. "Cumprindo um dever cívico", diz o artista

São Paulo – Intérprete destacado da música popular brasileira, o cantor, violonista e percussionista Renato Braz foi o convidado desta quinta-feira (16) do programa Entre Vistas, de Juca Kfouri, na TVT. O artista, que fez carreira musicando as lutas pelos direitos humanos, se notabilizou como uma voz para coletivos, movimentos e entidades que reivindicam por memória, verdade, justiça e reparação às vítimas da ditadura civil-militar. 

Nesta sexta (17), por exemplo, ele se apresentará no ato em memória de Alexandre Vannucchi Leme, na Sala dos Estudantes da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco da Universidade de São Paulo (USP), a partir das 16h. O evento marca os 50 anos do assassinato do estudante de Geologia da USP, preso, torturado e morto por agentes do DOI-Codi em 1973, com apenas 22 anos. 

Segundo Renato, “traduzir raiva, dor e indignação é tão importante declarar como o amor”. “Porque é muito difícil falar sobre todos esses nossos (sentimentos)… É muito difícil perder um ente querido”, observou.

Arte e democracia

Renato Braz diz, no entanto, que em momentos como esse é que se sente “menos artista”. “Me sinto mais um cidadão cumprindo um dever cívico”, resume. O cantor era criança no período de maior repressão da ditadura, mas destaca “entender perfeitamente tudo o que aconteceu, mesmo porque muitos ficaram para contar a história dessas pessoas, como do próprio Vladimir Herzog”. Por isso, explica, ele se soma com sua arte nessa luta. 

“Me sinto feliz em poder participar, estar ali, junto dessas pessoas que tanto admiro, tenho amigos ali que quero para o resto da vida, como o Camilo e o Paulo Vannuchi. (…) Eu já venho trabalhando com isso há alguns anos. A Comissão (da Anistia) foi extinta no governo Bolsonaro, o que é uma vergonha, mas agora retomamos os trabalhos. E é isso, quero estar junto dessas pessoas que pensam nessa causa e porque isso deve ser sempre lembrado. Tivemos aí um momento muito difícil em que tudo isso foi colocado à prova, regredimos muito mais. Mas estaremos lá juntos”, destacou Renato Braz. 

Juca Kfouri, que apresentará a cerimônia nesta sexta, completou que, em atos como esse, o que se faz é uma “homenagem à vida desses brasileiros que foram embora tão cedo por um ideal e foram mortos de maneira tão covarde”. 

Na trincheira contra a fome

Lutar por memória, completa o jornalista, é mostrar que a luta por democracia “não foi em vão, que eles não perderam. (As vítimas) ficaram como semente e que nós os cultuamos até hoje. É claro que é uma cerimônia que sempre tem em si a tristeza da perda. Mas tem ao mesmo tempo a alegria de poder lembrá-los e permitir que eles não morram nunca. Acho que isso é o que explica estar sempre presente nessas ocasiões”, ressaltou Juca. 

Renato Braz também lembrou que, na Catedral da Sé, cantou na missa em memória de Herbert José de Sousa, conhecido como Betinho, em 1997. Ele era amigo do sociólogo, com quem fez diversas parcerias ao longo dos anos 1990 para divulgar a campanha contra a fome e a miséria, criada por Betinho na ONG Ação da Cidadania. Diante da volta da insegurança alimentar extrema, nos últimos quatro anos, o artista também mostrou sua indignação com esse retrocesso. 

“Eu não pensei que a gente pudesse voltar nesse tempo. É engraçado você percorrer um caminho tão longo e ver o Brasil voltar para o Mapa da Fome”, lamentou. “Quando você percebe que o Brasil está sem comer e que o básico não chega aos lugares mais longínquos, dá uma sensação bem ruim. E por isso que temos aí grandes brasileiros dedicados a essa causa, como foi o Betinho, que tive o prazer de conhecer e conviver”, recorda Renato Braz. 

Sobre música

O artista encerrou sua participação no programa falando também sobre música. Ele foi lembrado do Prêmio Visa de MPB, que o consagrou como “Melhor Cantor” em 2003 por seu disco Dom Quixote. Para Renato Braz, porém, premiações como essa são na verdade mais importantes pela oportunidade de reunir pessoas ligadas à música dos mais diversos lugares do Brasil. “Não importa quem vai ganhar, a gente nem sabe muito bem quem ganha ou perde. É a história de juntar as pessoas e fazer conexões, tudo junto no mesmo lugar”, conclui. 

Assista a entrevista completa de Renato Braz na TVT