Entre Vistas

Paulo Betti: ‘A gente é os personagens que faz’

Ator, autor e diretor lembra personagens históricos que levou aos palcos e às telas, e também da infância pobre no interior de São Paulo

Divulgação/TV Globo
Divulgação/TV Globo
"A vida inteira eu eu fui um anotador", disse o Paulo Betti

São Paulo – Em participação no Entre Vistas desta semana, programa da TVT comandado por Juca Kfouri, o ator, autor e diretor de teatro e cinema Paulo Betti entrelaçou relatos da sua vida com a sua trajetória na dramaturgia brasileira. Ele contou, por exemplo, as vivências que resultaram na sua última peça, Autobiografia Autorizada, que marca os 40 anos da sua carreira. No cinema, interpretou personagens marcantes da história do Brasil, como o capitão Carlos Lamarca, expoente da luta contra a ditadura. Outro personagem histórico que Betti levou às telas do cinema foi o Barão de Mauá, rico industrial dos tempos do Império.

“Os atores costumam dizer que não levam os personagens para casa. Eu ouso desmentir os meus colegas. A gente é aqueles personagens que a gente faz”, disse Paulo Betti. “Do ponto de vista do Pirandello – dramaturgo italiano –, você me olha e vê personagens que eu fiz. O Lamarca, o Barão de Mauá, ou o gay da novela das oito, enfim.”

Para entrar na pele do guerrilheiro Lamarca, Betti conta que emagreceu 15 quilos e tentava imitar até mesmo a caligrafia do capitão rebelde. Durante as gravações do filme, em Ibotirama, interior da Bahia, disse que chegou a ser confundido com o próprio personagem pela população local.

“Diziam que o Lamarca era eu, que tinha passado por lá o Lamarca”, lembra Paulo Betti. Então eu acho que muito da minha vida, vamos dizer assim, do ponto de vista das escolhas políticas, foram influenciadas por isso também. As pessoas que gostavam do Lamarca estavam próximas de mim.” Nesse sentido, ele lembra que Clara Charf, esposa do também guerrilheiro Carlos Mariguella, chegou a elogiá-lo. “Ela dizia: o meu marido gosta muito de você. Não, era do Lamarca. Porque ele nem chegou a me ver”.

De Sorocaba para o mundo

Paulo Betti é nascido em Rafard, no interior de São Paulo, terra onde também viveu a artista plástica modernista Tarsíla do Amaral. Seus avós eram imigrantes italianos analfabetos, que vieram para substituir os escravos africanos como mão de obra nas fazendas. Ainda durante a infância, se mudou com a família para Sorocaba, quando moravam numa casa que havia sido uma senzala.

“Era um quilombo, 90% da população ali eram negros. Tinha a nossa família de italianos, tinha uma família de japoneses, tinha uns caboclos. Mas a maioria era negros. Então saíram três escolas de samba desse lugarzinho”, recorda.

Outra marca da sua juventude em Sorocaba é a igreja do preto velho João de Camargo. Em 2005, contou a história do milagroso senhor no filme Cafundó, estrelado por Lázaro Ramos. “Eu só vi aquela imagem de Cristo, eu via Caboclo, imagem de caboclo junto com pomba-gira com os peitos para fora. Aquela igreja era misteriosa, isso deu o filme Cafundó“.

Em Autobiografia Autorizada, que já teve apresentações inclusive em Angola e Portugal, Betti conta essas e outras histórias. Como base para o roteiro, Betti conta que utilizou anotações que guardou ao longo da vida. “A vida inteira eu fui um anotador. Desde criança eu anotava as coisas, anotava, anotava. Eu fui ver eu tinha muitos cadernos, tudo anotado: as visitas ao meu pai no sanatório –  meu pai tinha problemas psiquiátricos –, a primeira vez que eu internei meu pai com com esquizofrenia, quando tinha 14 anos. Então estava tudo escrito. Porque foi a forma que eu encontrei de não ser sufocado pelas circunstâncias.”

Confira íntegra da participação de Paulo Betti do Entre Vistas