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Rubem Alves não tinha medo de morrer. Tinha pena

Escritor e educador morre em Campinas, aos 80 anos. Intelectual de múltiplas atuações, deixou mais de 160 obras traduzidas em 12 países e uma lacuna no pensamento sobre a educação no país

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São Paulo – Internado desde o último dia 10 com pneumonia, no Hospital Centro Médico de Campinas, no interior paulista, morreu hoje (19), às 11h50, o escritor e educador Rubem Alves. A bibliografia de sua autoria  conta com mais de 160 títulos distribuídos em 12 países.

Em boletim divulgado mais cedo, os médicos que o assistiam informaram sobre uma piora do estado de saúde do escritor, com agravamento das funções renal, pulmonar e circulatória, que evoluíram para um quadro de falência múltipla orgânica. A nota foi assinada pelo cardiologista intensivista Roberto Munimis.

Rubem Alves nasceu em Dores da Boa Esperança, no sul de Minas Gerais, em 15 de setembro de 1933, e morava em Campinas, onde mantinha um instituto para promover a inserção social por meio da educação. O Instituto Rubem Alves também dá assistência a educadores.

Amante da vida

Além de escritor e pedagogo, Rubem Alves era poeta, filósofo, cronista, contador de histórias, ensaísta, teólogo, psicanalista, acadêmico e autor de livros para crianças. Era considerado um dos intelectuais mais respeitados do Brasil, tendo sido uma das principais referências no pensamento sobre educação.

Memória: “Educar com o coração” – entrevista de Rubem Alves à Revista dos Bancários de dezembro de 2003 “a escola tradicional é muito movida a tempos mecânicos, em descompasso com a naturalidade do ato de ensinar e de aprender”

    “Meu pai era rico, quebrou, ficou pobre. Tivemos de nos mudar. Dos tempos de pobreza só tenho memórias de felicidade. Conheci o sofrimento quando melhoramos de vida e nos mudamos para o Rio de Janeiro. Meu pai, com boas intenções, me matriculou num dos colégios mais famosos do Rio. Foi então que me descobri caipira. Meus colegas cariocas não perdoaram meu sotaque mineiro e me fizeram motivo de chacota. Grande solidão, sem amigos. Encontrei acolhimento na religião. Religião é um bom refúgio para os marginalizados”, relata, no site do instituto que leva seu nome.

    Em 1963, viaja para Nova York para fazer uma pós-graduação. É aí que o golpe de 31 de março de 1964 o surpreende, nas vésperas de conclusão do mestrado. Neste período viveu sob o medo intenso da Ditadura Militar. Acusado de ser subversivo, foi listado injustamente entre pastores procurados pelos militares. Era o preço de pensar de forma não ortodoxa. Viveu o cansaço da tensão.

    “Foi então que a United Presbyterian Church – EUA (Igreja Presbiteriana Unida dos Estados Unidos da América do Norte), em combinação com o presidente do seminário teológico de Princeton, me convidaram a fazer um doutoramento. Não me esqueço nunca do momento preciso quando o avião decolou. Respirei fundo e sorri, descontraído, na deliciosa euforia da liberdade. Ainda hoje, quando um avião decola, sinto de novo aquele momento.”

    Ainda segundo aquele site, “o exílio dura até 1968. Doutorado, volta ao Brasil para se despedir da Igreja Presbiteriana e experimentar o desemprego. Em 1969, uma faculdade do interior (a Faculdade de Filosofia de Rio Claro) o acolhe. Aí permaneceu até 1974, ano em que finalmente ingressa no Instituto de Filosofia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde fez a maior parte da sua carreira acadêmica até se aposentar nos primórdios da década de 1990.

    A epígrafe com que é encerrado o seu perfil naquela página da internet revela muito da intensidade com que Rubem Alves marcou sua presença e sua atuação pessoal, profissional e, de acordo com o que ele mesmo defendia, espiritual: “Eu não tenho medo de morrer… Só tenho pena. A vida é tão boa…”

    Com informações da Agência Brasil