Confronto em São Conrado reacende discussão sobre segurança no RJ

Rio de Janeiro – O intenso tiroteio nas ruas seguido da invasão do Hotel Intercontinental por traficantes, ocorridos sábado (21) no bairro nobre de São Conrado, reacenderam de vez o […]

Rio de Janeiro – O intenso tiroteio nas ruas seguido da invasão do Hotel Intercontinental por traficantes, ocorridos sábado (21) no bairro nobre de São Conrado, reacenderam de vez o debate sobre as políticas de segurança pública no Rio de Janeiro. Considerada um dos pontos fortes do governo de Sérgio Cabral, a instalação das Unidades de Polícia Pacificadora em algumas favelas que eram dominadas pelo tráfico de drogas tem grande aceitação popular, mas a maneira com vêm sendo implementadas as UPPs, além da suposta preferência por determinados pontos da cidade, voltaram a ser alvo de críticas e contestação.

O sociólogo e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Ignacio Cano, especialista em segurança pública, lembra que a tese da “cidade partida” ainda permanece atual no Rio: “O que aconteceu em São Conrado _ bandos fortemente armados à luz do dia _ acontece com mais ou menos freqüência em outros pontos da cidade. Só que, quando acontece em um bairro como São Conrado, tem uma repercussão diferente. As pessoas que se espantam pelo fato de ter que conviver com tiroteios e, com razão, estão se preocupando, deveriam lembrar que isso acontece corriqueiramente em outros bairros e ninguém se espanta”, diz.

Cano ressalta os danos à imagem do Rio: “O que aconteceu foi um incidente que não muda o curso geral do que é a segurança pública na cidade, mas sublinha a vulnerabilidade que nós temos hoje em dia em termos de imagem internacional. Cada vez que você tem um evento dessa repercussão, surgem dúvidas no mundo inteiro se o Rio vai conseguir organizar as Olimpíadas, organizar a Copa”, avalia.

Membro do Ministério Público que se notabilizou pelo combate ao crime no Rio, o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL) bate firme no governo: “Sozinha, a UPP não pode sequer ser considerada uma política de segurança. Trata-se apenas de uma unidade de policiamento. A segurança precisa de outros elementos, como educação, saúde, emprego, etc.”, diz.

Freixo afirma que a implementação das UPPs obedece à lógica dos que querem lucrar com os eventos que ocorrerão na cidade: “As áreas escolhidas para as UPPs são áreas muito estratégicas dentro da concepção de cidade que está se movendo no Rio de Janeiro. Você tem um corredor na Zona Sul, o entorno do Maracanã e a Zona Portuária, além da Cidade de Deus que, em todo Jacarepaguá, é a única favela sem milícia. Então, a escolha das áreas das UPPs é estratégica para a cidade que se pretende organizar para a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016”.

Rio em paz

Durante entrevista concedida ao telejornal RJTV, da Rede Globo, Sérgio Cabral afirmou que o tiroteio em São Conrado não compromete as políticas de governo: “As UPPs são um ponto muito importante de nossa política de segurança pública, e o meu compromisso é levar as UPPs a todas as comunidades dominadas pelo poder paralelo”, disse o governador.

Cabral prometeu que, se reeleito, vai pacificar todos os pontos mais violentos do Rio de Janeiro: “A vitória só será consagrada quando nós tivermos paz na Rocinha, no Vidigal, no Complexo do Alemão, em Manguinhos, no Complexo da Maré. Vamos levar a paz a todas as comunidades do Grande Rio onde há poder paralelo”.

A promessa de Cabral é contestada por Marcelo Freixo: “O governador, quando diz que todo o Rio de Janeiro vai ser coberto pelas UPPs, não fala a verdade. Ele sabe que isso é completamente impossível, até pelo contingente de policiamento, e está apenas jogando com uma questão eleitoral. É claro que o policiamento comunitário é defensável. Esse princípio é importante, mas o policiamento comunitário no Rio de Janeiro só será perfeito se vier acompanhado de medidas sociais importantes. Isso, até agora, mesmo com as UPPs, o Estado não garantiu”, diz.

“UPP e mais nada”

Ignacio Cano diz acreditar que o ocorrido em São Conrado “não vai mudar grande coisa a política de segurança em geral”, mas faz uma observação: “O incidente sublinha o fato de que o que nós temos hoje no Rio é o modelo UPP e mais nada. O que não está dentro do modelo UPP não tem uma política alternativa, e a UPP atinge um percentual muito pequeno das comunidades. Os policiais que não fazem parte das UPPs continuam em uma situação diferente, assim como as comunidades que não têm UPP. Esse incidente nos fez sentir que é necessário uma outra política, complementar às UPPs”.

Freixo apontou um efeito colateral da política de UPPs, que é o deslocamento de traficantes: “Você tem provavelmente um problema sério acontecendo nas áreas próximas a essa cidade desejada. Ficam problemas, por exemplo, na Baixada Fluminense e em Niterói, porque há efetivamente esse deslocamento do crime e a tendência é isso se agravar. Por enquanto, temos uma ação de policiamento e de controle específico de algumas áreas num território específico e desejado para defender interesses que não são necessariamente da favela, como, por exemplo, os interesses da especulação imobiliária e dos grandes investimentos que irão chegar à cidade para 2014 e 2016”, diz.