Democracia Corintiana

Quem tem de agir contra bloqueios golpistas são as polícias, diz fundador da Gaviões

Em entrevista, Chico Malfitani e Danilo Pássaro criticam a atuação das forças de segurança, mas comemoram resistência. “Mostramos que não vamos aceitar golpe em nosso país”

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"Só íamos pegar a nossa faixa, em defesa da democracia, e colocar em cima da faixa deles", descreve torcedor

São Paulo – Dois dias depois da desmobilizar bloqueios golpistas em rodovias de São Paulo, parte da principal torcida organizada do Corinthians, a Gaviões da Fiel, ganhou simpatia nacional depois furar os bloqueios promovidos por bolsonaristas inconformados com a derrota nas eleições. Dentro da torcida, o clima também é de “orgulho”. Mas a celebração só não é completa porque esses episódios comprovaram “uma bolsonarização das forças de segurança do Brasil”, como observa o jornalista e publicitário Chico Malfitani.

Fundador da Gaviões da Fiel, Chico Malfitani conversou com a jornaista Marilu Cabañas, do Jornal Brasil Atual. E destacou que a ação da torcida organizada só ocorreu porque nem a Polícia Rodoviária Federal (PRF), nem a Polícia Militar cumpriram seu papel, conforme determinou o Supremo Tribunal Federal.

Os bloqueios golpistas de estradas federais começaram na noite de domingo (30), após a divulgação do resultado eleitoral, e se espalharam por diversos estados do país. Desde segunda (31), contudo, a Justiça Federal e o Supremo Tribunal Federal (STF) já haviam ordenado o desbloqueio de todas as rodovias do país pela forças de segurança.

Mas o que se viu em muitos estados foi a conivência dos agentes com os manifestantes golpistas. Diante da omissão, já na terça (1º), integrantes da Galoucura, torcida organizada do Atlético Mineiro, furaram bloqueios golpistas no trecho do sul de Minas da Rodovia Fernão Dias. 

Pela democracia

No mesmo dia, à noite, torcedores corintianos também acabaram com um bloqueio na Marginal Tietê, na capital paulista, na altura da Ponte das Bandeiras. De acordo com o integrante da Gaviões Danilo Pássaro, a ideia inicial era furar a manifestação na rodovia Castello Branco. No entanto, um torcedor que estava infiltrado entre os bolsonaristas alertou que o grupo estava usando crianças de “escudo” para impedir que os bloqueios fossem desfeitos.

Os corintianos decidiram então recuar e ir para a marginal, “pensando na irresponsabilidade desses bolsonaristas tendo crianças ali”, explicou ao Jornal Brasil Atual. Já no local, a ideia desde o início era não chegar com violência, de acordo com Pássaro. E sim “mostrar que tem gente que não vai aceitar golpe em nosso país”, frisou. 

“Quando passamos, vimos que naquele momento eles estavam fechando apenas uma via, com a polícia ali meio que fazendo segurança desse ato antidemocrático. Só íamos pegar a nossa faixa, em defesa da democracia, e colocar em cima da faixa deles. Era isso que íamos fazer. E quando chegamos próximo, já começamos a gritar ‘democracia, democracia’, e eles viram a gente e saíram correndo, entraram nos carros. Teve quem deixasse a moto para trás. Nós pegamos a chave e entregamos para a polícia e ficamos ali fazendo a nossa manifestação pela democracia. Foi isso que aconteceu e foram as imagens que repercutiram pelas redes sociais”, descreveu o torcedor. 

Parte da torcida viajaria ao Rio de Janeiro para assistir ao jogo entre Flamengo e Corinthians no Maracanã. E acabou premiada pela vitória dos visitantes por 2 a 1, que assegurou a classificação direta para a fase de grupos da Libertadores de 2023.

Quinze bloqueios nesta sexta

A Gaviões da Fiel também desfez um bloqueio na altura do município de Jacareí, no interior paulista. Desde quarta, o número de manifestações golpistas começou a cair. Até ontem, eram mais de 800 bloqueios desmobilizados, segundo a PRF, e perto de 73 ativos. Já nesta sexta (4), a corporação informou o fim dos bloqueios totais em estradas federais e apenas 24 rodovias parcialmente obstruídas. A maioria delas em Rondônia (8), Mato Grosso (7), Pará (6), duas no Amazonas e uma em Mato Grosso do Sul.

Malfitani destaca que não houver sequer conflito. “Ninguém foi lá para ‘quebrar o pau’, mas para dizer, ‘vamos sair’. O que a polícia poderia ter feito, é um absurdo. Isso mostra que há uma bolsonarização das forças de segurança do Brasil.”

“Na verdade, o que o Bolsonaro pretendia fazer era o ‘Capitólio tupiniquim de Donald Trump’. Era um movimento articulado, com empresários financiando. Quando é o povo fazendo uma reivindicação justa por escola, moradia, não tem diálogo. A polícia vem e desce o cacete. Agora esses caras ficaram dois, três dias batendo papo, fazendo a proteção.”

Luta segue

O fundador da Gaviões da Fiel diz, contudo, sentir orgulho da atuação dos torcedores. De acordo com ele, o compromisso com a democracia está nos ideais da torcida que nasceu em meio à ditadura civil-militar, em 1969. Ele garante que o grupo “sempre esteve na luta”, mas acabou criminalizado pela mídia comercial e as forças de segurança, assim como a própria esquerda organizada. A atuação nesse caso, porém, confirma que “o povo organizado reivindica seus direitos, luta pelo que acha correto”. 

A expectativa agora, segundo Danilo Pássaro, é de fortalecimento da democracia com a eleição de Lula. Estudante de História e motorista de aplicativo, ele espera por dias melhores e critica o governo Bolsonaro após quase ter deixado de trabalhar, em janeiro, com o aplicativo do corridas. Pássaro relata que “estava pagando para trabalhar” diante do aumento nos preços dos combustíveis, das taxas do aplicativo e os gastos com o veículo. 

“Nos últimos quatro anos, o governo Bolsonaro conseguiu desempregar quem já estava desempregado, porque o trabalho por aplicativo foi uma saída para os trabalhadores que já não encontravam mais espaço na formalidade, não tinham mais o emprego formal. E por conta do preço da gasolina, quem estava desempregado, ficou desempregado duas vezes”, adverte o torcedor. 

Saiba mais na entrevista

Redação: Clara Assunção