Ceará

PM reprime manifestação antes de partida do Brasil em Fortaleza

Protesto com 50 mil antes de jogo da Seleção pela Copa das Confederações levará a desgaste do governador Cid Gomes, vaiado pelos manifestantes

Antonio Lacerda/EFE

Saúde, educação e o despreparo da PM foram as principais bandeiras dos manifestantes

Fortaleza – A manifestação realizada hoje (19) em Fortaleza, antes do jogo das seleções brasileira e mexicana, só não reproduziu um único ponto de discórdia daquilo que se vê Brasil agora: na capital do Ceará, o preço da passagem do transporte público não é, necessariamente, o carro chefe da revolta. A passagem de ônibus aqui é de R$ 2,20, isso por conta de aumento recente, no apagar das luzes do governo do PT, que ficou oito anos à frente da prefeitura. E desde sábado (15) funciona a principal promessa eleitoral do prefeito Roberto Cláudio (PSB), o “Bilhete Único”, que dá ao usuário duas horas para pegar quantos ônibus quiser pagando apenas uma tarifa.

Afora isso, a manifestação reproduziu aspectos que vêm sendo registrados em todo o país: saúde, educação e, sobretudo, o despreparo e o desrespeito da Polícia Militar no enfrentamento a manifestações, e a consequente reação desproporcional dos policiais diante de provocações de reduzidíssimo contingente de manifestantes. Contra paus e pedras arremessados por alguns poucos, a polícia respondeu com balas de borracha (uma excrescência que deveria ser banida) e gases de pimenta e lacrimogêneo que acabaram por atingir milhares de manifestantes, todos instalados no sentido “contra vento” (inclusive este que lhes escreve).

Começou às 10h a concentração das 50 mil pessoas a cerca de um quilometro do estádio do Castelão, onde ocorre o jogo. Às 11h seguramente havia pelo menos 10 mil pessoas no inicio da Avenida Alberto Craveiro, principal acesso ao local. Às 12h em ponto a massa avançou cerca de 500 metros na avenida, onde se instalara a primeira barreira policial.

Durante cerca de meia hora os manifestantes apelavam à não violência, inclusive com gritos de “Ou ou ou, a greve da polícia o povo apoiou”, referência à greve da PM entre dezembro de 2011 e janeiro de 2012. Ocorre que nas barreiras desta quarta estavam o Batalhão de Choque e a Cavalaria da PM cearense, setores que menos aderiram à paralisação. É certo que alguns manifestantes atiraram paus e pedras, mas foi um número inexpressivo diante do contingente de manifestantes os mais variados,o que se expressava em cartazes, roupas, faixas, gritos – desde “#vempraruacristão” num cartaz manual a adolescentes com caras pintadas e camisetas com Bob Esponja, adolescentes punks, militantes do MST e do movimento Crítica Radical (de Fortaleza, anti-institucional, embora não anarquista).

Visivelmente, a massa era composta em um grande contingente da chamada “classe média”, estudantes ou não, que não suporta mais a violência crescente em Fortaleza nos últimos dez anos (o Mapa da Violência de 2012 situa a cidade como a quinta do país onde mais se mata). Quando se defronta com uma polícia que deveria garantir a segurança pública com o mesmo vigor que combate à manifestações populares, é imprevisível o que está por vir.

Como imprevisível foi o desfecho do protesto, com a massa bloqueando a BR 116 no seu trecho urbano que é o principal acesso à cidade e um dos principais ao estádio. Como imprevisível será a reação do governador Cid Gomes (PSB), apupado por todos os presentes, em uníssono, como “Cid, ditador”, diante da truculência policial, essa sim a provocação infiltrada na manifestação. Se o governador  endossou ou não a desnecessária ação policial, terá de lidar com os deméritos do protesto, aprofundando ainda mais o descrédito à política estadual de segurança. Se até Neymar postou críticas à ação do governo no Twitter, imaginem as urnas em 2014. Imaginemos depois da Copa.